Clube de Cabeceiras de Basto vai receber 500 mil euros pelos direitos de formação. Dinheiro será investido num novo sistema de iluminação.
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Ao desembolsar 32 milhões de euros pela compra do passe de Vitinha ao Braga, o Marselha estava longe de imaginar que essa decisão iria fazer sair a taluda a um pequeno clube do concelho de Cabeceiras de Basto. O Águias de Alvite, fundado em 1992, sempre se pautou pela modéstia nas participações que foi tendo nos campeonatos da A. F. Braga e a única excentricidade conhecida foi a colocação de relva natural no seu parque de jogos há mais de 20 anos, uma novidade à época nos campos do distrital. Fruto de uma parceria com as Escolas de Futebol Geração Benfica, os últimos anos têm sido dedicados à formação de jovens futebolistas e a equipa sénior está desativada.
Agora, fruto do mecanismo de solidariedade nas transferências de jogadores, o humilde clube da freguesia de Alvite vai receber uma quantia, que andará entre os 400 e os 500 mil euros. Dinheiro nunca antes visto por estas paragens. "O que vier será fantástico porque nunca entrou tanto dinheiro na conta do clube", disse, ao JN, Jorge Gonçalves, presidente da coletividade há cerca de dez anos. Os responsáveis do clube ainda não sabem ao certo quanto e quando irão receber os direitos de formação, mas já contactaram um advogado para não serem apanhados desprevenidos.
De uma coisa Jorge Gonçalves tem a certeza. "O dinheiro será investido no clube e teremos de pensar muito bem no que faz falta", destacou, apontando à cabeça das prioridades a colocação de um novo sistema de iluminação.
"O sintético ainda está bom, mas a prioridade terá de ser uma nova iluminação. A nossa iluminação é lateral e os miúdos têm dificuldade em ver. Se houver possibilidade iremos investir na construção de um campo de futebol de sete, porque temos cerca de 120 miúdos na formação e este campo começa a ser pequeno. Uns retoques nos balneários e outras coisas a nível de infraestruturas", adiantou, mas esclarecendo que não vai entrar em loucuras no futebol sénior. "O dinheiro vai ser investido em "novos Vitinhas"", sintetizou o líder do clube, apostado em criar condições de excelência para que o Águias de Alvite possa ser um viveiro de jogadores e, no futuro, possam surgir outros casos de sucesso como o do atual jogador do Marselha.
"Este é o nosso caminho. Já temos dois jogadores no Seixal, outro no Vitória de Guimarães e outro no Olival, além do Vitinha", confidenciou ao JN o presidente do Águias de Alvite. Para trás parece ter ficado a aposta no futebol sénior. "Voltamos a suspender a equipa de seniores porque estávamos com falta de gente. Tínhamos apenas sete jogadores e já no ano passado jogavam juniores e juvenis e decidimos parar. Os jogadores da nossa formação, quando passam a seniores e têm mais qualidade, procuram outros clubes e na região não é fácil recrutar jogadores", concluiu.
Aos 11 anos já treinava com os seniores
Escrito por um argumentista de histórias de sucesso não teria resultado tão bem. O percurso de Vítor Oliveira, Vitinha, é, aos 22 anos, um enredo de encantar. Nascido em 2000 na Vila de Cavez, terra minhota que só o Tâmega separa de Trás-os-Montes, cresceu como muitos meninos da região, a brincar na rua com os amigos, a dar pontapés na bola, e com a cabeça cheia de sonhos.
No caso de Vitinha o plural não está bem aplicado porque tinha apenas um sonho: ser jogador profissional de futebol.
Na vila natal as oportunidades escasseavam e chegou, aos 11 anos, a treinar com a equipa sénior do Cavez até que algo diferente surgiu. "Fui falar com os pais, trouxeram-no ao primeiro treino e vi que tinha qualidades acima dos outros. Logo no treino seguinte o pai disse-me que gostava muito, mas não o podia trazer porque era a 20 quilómetros de casa e não tinham carta de condução. Fiquei embaraçado e sem saber o que fazer. No dia seguinte fui buscar o Vítor a Cavez e prontifiquei-me a ir buscá-lo e levá-lo.
Assim foi durante cinco épocas e meia", recorda Dino Dourado, coordenador das Escolas do Benfica em Alvite. Vitinha já não enganava e mostrava muito daquilo que hoje é. "Ele faz com dois toques o que muitos fazem com quatro mas, desses quatro, dois não eram precisos. Ele faz o que é preciso no futebol. Tem muita inteligência e uma leitura de jogo acima da média. Com poucos toques é muito eficiente e muito coletivo", sintetiza o técnico, orgulhoso de ter contribuído para a ascensão desta "referência de Cabeceiras e agora de Portugal". E está perto de se estrear pelo Marselha.
Pais convencidos durante um piquenique
Os pais de Vitinha não foram um entrave aos sonhos do filho. Passou despercebido ao Vitória de Guimarães e ao Benfica, mas o Braga valorizou-lhe as qualidades. João Avelino Leite, cabeceirense, colabora com a observação do clube arsenalista e deu nota de Vitinha, ao indicá-lo ao campo da Ponte, junto ao Estádio 1.o de Maio, para prestar provas num treino.
"Nesse treino fez três golos e, no final, os coordenadores - Francisco Tomás [atualmente observador no Man. United] e o Alberto Mendes - disseram-me que o Vítor tinha de ficar e pediram-me para falar com os pais. Tinha 17 anos", recorda, ao JN. Uma observação conversada com os responsáveis do Alvite e, posto isto, só faltava convencer os pais. "Falei com os pais, o sr. José e a dona Fátima, e o Vítor queria muito ir para Braga. O Alberto Mendes, que é hoje o coordenador do scouting do Braga, veio a Cavez e o encontro foi na praia fluvial. Os pais do Vítor iam fazer um piquenique, traziam uma arca com cerveja, vinho, rissóis e panados, entre outras coisas boas, estivemos ali a comer e a beber. O Alberto apresentou aos pais o projeto e eles anuíram logo, porque o Vítor queria ser jogador profissional", contou, sublinhando que a Cidade Desportiva do Braga foi fundamental para a família aceitar o convite.