<p>Após o habitual "Hasta la victoria, siempre", um gole de água, cinco passos em frente, pé esquerdo escorregadio, braços esticados em estilo mariposa e Fidel Castro lá mergulhava em direcção a uma multidão que, seis anos depois, mostrou saber receber aquele que a comunidade internacional já dava como mais do que retirado da cena política internacional. </p>
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Se "el General" verde-oliva, em Outubro de 2004, caia aos pés da gigantesca estátua de Che Guevara, em Santa Clara, Cuba, dando mostras de que com ele desmoronava-se também meio século de revolução, aos 84 anos [comemorados anteontem] está agora mais imparável do que nunca. De entrevistas televisivas e reuniões à apresentação de "Por todos os caminhos de La Sierra: A vitória estratégica", obra de 900 páginas onde Fidel e companheiros ainda vivos contam a história da 'Revolución', o líder cubano colecciona agora várias aparições, todas calculadas ao milímetro.
Aliás, disso é exemplo até o próprio caminhar cauteloso até ao palanque de onde discursou 15 minutos, há cerca de uma semana. Porém, quando publicamente não se refere à política nacional e as suas preocupações são agora a política internacional, acenando uma vontade de lutar contra a guerra nuclear que diz estar iminente - esquecendo-se que ele próprio colocou o Mundo à beira de uma com a "Crise dos Mísseis" -, a verdade é que nos bastidores sabe-se que Fidel quase todos os dias é visto em encontros por Havana, principalmente com grupos de intelectuais.
Significa isto que regressa para recentrar a ideologia? Pelo menos, ao declarar-se recuperado da doença intestinal que, em 2006, o obrigou a uma reclusão e a ceder a cadeira ao irmão Raul Castro, Fidel não esconde a evidência da resposta. É que, nos últimos dois anos, enquanto se mostrava abatido e magro, envergando um fato-de-treino da selecção olímpica de Cuba, recebendo personalidades pós-modernistas como Maradona, Raúl Castro conseguiu romper com preceitos até então inquestionáveis.
Vejamos: realizou eleições gerais, permitiu a venda de computadores pessoais ou televisões [objectos com um significado que vai além da mera posse], realizou um congresso do Partido Comunista - depois de uma década sem se realizar - e, conseguiu o atenuar das sanções internacionais, tanto de países europeus como dos Estados Unidos da América, entre outras pequenas reformas. Sublinhe-se ainda a libertação de dissidentes políticos, que rumaram a Espanha.
Contas feitas, graças ao cenário descrito, Fidel divide agora o protagonismo com o irmão mais novo - já tem 79 anos. Sinal disso mesmo é que os cartazes espalhados por Havana, na última sexta-feira, têm escrito "Vida longa para Fidel e Raul". Do lado familiar, sem falar no desgosto que lhe têm provocado os filhos desertores e contestários, basta lembrar que a irmã Juanita Castro (77 anos) foi agente do CIA, 'brindando' Fidel e Raúl com uma obra para estes muito pouco abonatória, e a sexóloga Mariela Castro Espín, filha de Raúl, parece determinada em romper com o comunismo.
Ou seja, "el General" ao reocupar o lugar de deputado e chefia do Partido Comunista volta a reavivar o lema da ilha do Mar do Caribe: "patria o muerte". E esta é pelo menos uma das denúncias dos 52 dissidentes que, agora, poderão contestar o regime cubano, mas longe das Caraíbas, devido ao acordo com Madrid.
Só que abertas que estão determinadas brechas no dogmatismo e com realidades como a profunda crise económica, que nem o turismo de massas consegue inverter, Fidel tem evitado abordar matérias sensíveis à população. Mas não deixa de ser tranquilizador para os conservadores que têm esboroado as bases de apoio a Raúl. A própria orgânica estatal e a Comunicação Social têm reagido com dificuldade na forma de tratamento do líder. Este é de novo tratado como "Comandante-em-chefe", o que ensombra a presidência de Raúl. Fidel parece desvalorizar, mantendo uma postura de guerrilheiro que regressa ao labirinto democrático em que se tornou Cuba.