<p>Os alertas de ataques terroristas na Europa aumentaram drasticamente nas últimas semanas. França, Alemanha e Reino Unido são os principais alvos presumidos. Exactamente por esta ordem (decrescente) de perigo. Até agora, os avisos não passaram de terror infundado. Até quando?</p>
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Segundo o canal de notícias da Fox, cadeia televisiva norte-americana, a Torre Eiffel, em Paris, e a estação central de transportes de Berlim estão entre os alvos mais apetecíveis do terror. O critério: local apinhado gente diariamente. Objectivo: matar civis. Os desprotegidos. Os que escolhem os Governos democráticos e acreditam que estão seguros.
Depois de declarar que a ameaça terrorista em França não só é "real", como é "iminente", o ministro francês do Interior, Brice Hortefeux, activou o alerta vermelho de perigo terrorista em todo o país. Já o homólogo alemão, Thomas de Maizière, optou por garantir que "não há motivos para alarmismo". Cautela redobrada é o conselho do Governo britânico para os cidadãos que viajem para aqueles dois países. A mesma medida assumiu a Administração Obama, no que se refere a viagens rumo à Europa. E até o Japão reforçou protocolos de segurança em aeroportos e estações de metropolitano.
Enquanto isso, no Afeganistão (mesmo junto à fronteira paquistanesa), cerca de 20 camiões-cisterna que se destinavam a transportar combustível para as forças da NATO foram destruídos. Foi o quarto ataque do género numa semana reivindicado pelo movimento Tehreek-y-Taliban Pakistan, grupo de guerrilha afegão com ligações à al-Qaeda.
O terrorismo voltou a dominar o Mundo. Garantem-nos que haverá um ataque na Europa. Quando? Não se sabe. Vai-se vivendo de ameaça em ameaça.
Como é que queremos viver?
Na mente de um terrorista, "a agitação e propaganda logradas pelo medo são já uma vitória", afirma o investigador Armando Marques Guedes. Ameaçar é gerar medo. Um tipo especial de receio que vai desestabilizar a ordem instalada e substituí-la pela insegurança. "A ideia deles [os terroristas] não é atacar os tidos como culpados [os governantes], mas sim o sustentáculo, as opiniões públicas. Querem criar a sensação constante de abismo, abalar as liberdades democráticas, tornar os políticos parecidos com eles".
O alerta de um ataque terrorista não pretende apenas informar a população, devido ao seu direito à verdade e à segurança. Por detrás de um alerta desta natureza há, segundo Armando Marques Guedes, autor de Ligações perigosas - conectividade, coordenação e aprendizagem em redes terroristas (Almedina, 2007), dois tipos de motivação, de acordo com o tipo de regime em que têm lugar. Nos EUA, na Alemanha, na França, no Reino Unido ou na Suécia, temos assistido a "alertas terroristas tradicionais". São característicos "dos países que procuram a transparência democrática e que são tão mais democráticos quanto mais transparentes forem". Nestes casos, a motivação tem a ver com factor accountability, explica o investigador. Trata-se da necessidade que os regimes democráticos têm de prestar contas às populações. Mas um alerta terrorista num país em ditadura tem um fim diferente - "intimidar a população, comprar a sua liberdade".
Curiosamente, tanto um regime político como outro "dependem da opinião pública". Como explica o docente da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, na democracia é preciso garantir segurança às pessoas, ganhar a sua confiança, visando com isso vencer eleições. Na ditadura, ao invés, é vital "comprar a liberdade do povo em troca de garantia de segurança". Em ambos os contextos, lançar o alerta é vantajoso.
Há, então, uma linha ténue entre liberdade e segurança. O investigador no Centro de Investigação e Formação para Cultura e Paz da Fundação Mário Soares, Felipe Pathé Duarte, defende que "o que caracteriza um Estado de Direito é a capacidade de equilíbrio entre as duas. Porém, num Estado democrático, há o risco de aproveitamento político da banalização da ameaça, através da propagação de uma cultura do medo".
Invadir para proteger?
Na perspectiva de José Manuel Anes, criminalista e presidente do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo, haverá uma maior tolerância das pessoas relativamente a medidas de vigilância mais invasivas da privacidade de cada um. Em nome da segurança comum. Mas o responsável está convencido de que "não haverá medidas muito intrusivas: haverá mais vigilância policial e mais permuta de informações entre os serviços secretos europeus (ainda que, neste contexto, Portugal seja o único país onde os serviços secretos não podem fazer escutas) - ressalva.
Aliás, a História demonstra que "as ameaças de violência terrorista na Europa são comuns, pelo menos, desde o início do século XX", lembra Felipe Pathé Duarte. O facto leva o docente a concluir que "o medo não pode, nem vai condicionar a vida dos cidadãos europeus, sob pena da vitória jihadista. O mestre em Ciência Política e Relações Internacionais vai mais longe: "Se pensarmos bem e formos a dados estatísticos, não querendo relativizar a gravidade da situação, afectará mais a vida dos europeus a criminalidade e a insegurança rodoviária do que propriamente a ameaça jihadista".
O que vai acontecer a seguir?
"É possível que haja um atentado na Europa", admite o presidente do Observatório. O responsável reserva, neste contexto, dúvidas sobre a eficácia de uma eventual associação entre as forças militares e as forças não militares portuguesas. O professor Armando Marques Guedes considera, por sua vez, que há três factores que podem vir a desencadear uma acção terrorista. "Primeiro, a data anunciada pela Administração Obama para a retirada das tropas internacionais do Afeganistão, que pode custar um preço muito alto. Depois - e apenas como pretexto - as negociações israelo-palestinianas. Por fim, os desenvolvimentos do programa nuclear iraniano".
Já o autor de No crepúsculo da razão - considerações sobre o terrorismo pós-guerra fria (Prefácio, 2007), Felipe Pathé Duarte, prefere sublinhar a importância de "medidas sociais anti-exclusão" numa estratégia de prevenção do radicalismo. "Resta-nos a prevenção através do policiamento, da monitorização e de medidas contra-ideológicas, como a formação de imãs que preguem nas prisões - o local da radicalização - e a proibição de sites radicais". Além disso, o investigador salienta que "a chamada intelligence comunitária" deverá "obrigar a uma estreia ligação entre a comunidade muçulmana e Polícia local".
Neste momento, as polícias antiterroristas sabem onde funcionam muitas das células terroristas implantadas na Europa. E sabem, salienta Armando Marques Guedes, "que há uma mobilização de vários grupos terroristas ligados à al-Qaeda. O objectivo é um ajuste de contas geral".