O nome Aegina diz pouco aos portugueses, mas muito aos gregos. E agora ainda mais. É a ilha onde Tsipras e Varoufakis, primeiro-ministro e ministro das Finanças gregos, carregam baterias aos fins de semana. No sábado, não estavam por lá. A pressão política prendeu-os em Atenas. É que, hoje, os gregos decidem não só o futuro do país, mas também o do atual Governo.
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O povo foi chamado a dizer se aceita ou rejeita as condições impostas pelos credores. A Europa apela ao "sim", Tsipras deseja um rotundo "não". Mas para a maioria dos gregos a pergunta surge fora de tempo e é difícil de entender. Seja ele qual for, o resultado do referendo de hoje terá consequências imprevisíveis.
Na descontraída ilha de Aegina não se sente o nervosismo de Atenas. As águas azuladas do Mediterrâneo convidam a falar de tudo menos de política. Mas o nome de Varoufakis é recorrente. Afinal, ilhas gregas há muitas, mas aquela é a preferida dos mais importantes membros do atual Governo. A mulher do ministro das Finanças tem casa em Aegina, que fica a pouco mais de meia hora de barco de Atenas. Já Tsipras costuma alojar-se em casa de amigos, conta George, um dos 32 taxistas de Aegina.
Sozia Marti, 40 anos, já serviu várias vezes Varoufakis. É uma das proprietárias de um restaurante familiar situado em Perdika, uma encosta debruçada sobre o mar turquesa pintalgado por iates e veleiros que ali lançam âncora para o almoço. Sozia ri-se quando lhe perguntamos qual o prato favorito de Varoufakis. Não sabe dizer, "agora, tem aparecido menos vezes".
Apesar de simpatizar com ele, Sozia não concorda com a opinião política daquele seu cliente especial que ontem, em entrevista ao jornal espanhol "El Mundo", afirmava que, se o "sim" ganhar, "a democracia estará em perigo" e que o acordo com os credores será desastroso. Varoufakis disse ainda que a Grécia está a ser vítima de "terrorismo" e prometeu que, se o "não" vencer, viajará amanhã mesmo até Bruxelas para "alcançar um acordo melhor".
Sozia discorda. Tem três filhos pequenos e está "muito preocupada" com o que sair das urnas. "Se sairmos da Zona Euro, entraremos num barco sem capitão. Não vamos conseguir encontrar um novo rumo", acredita a dona do restaurante aberto desde 1936. "Era dos meus avós, não há de ser comigo que vai fechar". E torna a sorrir.
Nektarios Togias, vendedor de peixe no mercado do porto de Aegina, tem a certeza de que fecha a banca se as ilhas deixarem de beneficiar de um regime fiscal especial. Esta tem sido uma das batalhas de Tsipras nas negociações com os credores. Recorde-se que, na passada quarta-feira, o primeiro-ministro grego chegou a admitir aceitar as condições da Europa com "pequenas alterações". Uma delas era precisamente manter o desconto de 30% nas várias taxas de IVA das ilhas gregas para colmatar o efeito da insularidade.
"Se os impostos voltarem a subir, tenho de desistir. Quem vive cá já compra pouco peixe e os restaurantes compram cada vez menos, porque também têm menos clientes", explica Nektarios. O peixe e a produção de pistácios são o ganha-pão da ilha, onde vivem permanentemente cerca de 12 mil pessoas, fora os turistas gregos e estrangeiros. A terra e o clima de Aegina são perfeitos para a produção daquele aperitivo salgado. Quem lá vive garante que os pistácios de Aegina são "os melhores de toda a Grécia e do Mundo". Não há forma de comprová-lo, mas os turistas acreditam e compram.
A árvore dos pistácios
Na loja do casal Nourtzis, os sacos de pistácios estão à porta a chamar os clientes. Nektaria e Panagiolis são proprietários de alguns hectares de terreno e de muitas centenas de árvores que dão pistácios. Há uns anos, o trabalho não interessou aos filhos, mas a crise fê-los voltar a casa e ao fruto seco verde. "Isto vai dando para sobreviver, mas com dificuldades", atalha Nektaria. O estado a que o país chegou preocupa-a e o eventual aumento dos impostos nas ilhas tira-lhe noites de sono.
"Nós, aqui, temos de importar tudo, até a água potável tem de vir de barco". Também o lixo produzido na ilha viaja de barco até Atenas, todos os dias. Tudo isso já tem muitos custos e os gregos de Aegina não querem vê-los crescer.
Com os líderes europeus a apelar ao voto no "sim" e o Governo de Tsipras a pedir o "não", os gregos estão divididos. George - "um dos poucos helénicos que se podem orgulhar de ter dois empregos", produtor de pistácios e vendedor de peixe no mercado - já não acredita em ninguém. Está cansado de ver o país que adora ser "roubado", seja pelos governantes, seja pelas instituições europeias. "Caminhamos para uma morte lenta. Se não entrarmos agora na bancarrota, vai ser dentro de muito pouco tempo", prevê, enquanto afasta as moscas do peixe.
À espera do barco que o vai levar de novo a Atenas, Lykos, 45 anos, tem opinião diferente. Acredita que nem tudo está perdido, se a Grécia hoje votar "sim". É engenheiro informático e divide o tempo entre a capital e Aegina, onde passa todos os fins de semana. Trabalha para uma multinacional e, talvez por isso, tenha uma visão mais global do problema. "Penso que as pessoas da ilha não têm a noção da situação em que estamos e não entendem o que está em jogo. Se sairmos da Europa, vai ser tudo muitíssimo mais difícil. Vivemos num mundo global e não podemos estar isolados do resto da comunidade europeia".