Produtos que marcaram gerações reapareceram como ícones e, depois da decadência, reergueram-se em força.
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Várias foram as gerações que cresceram com sapatilhas Sanjo nos pés e, pela década de 1980, com o icónico saco de desporto da Mike Davis ao ombro. Escreveram, desenharam e coloriram com o resistente material da Molin, ouviram cassetes gravadas na Edisco e, em casa, tinham sabonetes da Ach Brito e a assinatura da Valadares nas louças sanitárias. Fundadas no Norte, são marcas míticas que souberam reerguer-se após o declínio.
Todos pareciam nomes imortais, como as réguas inquebráveis ou as esferográficas e os marcadores - chegaram a ser 100 cores - lançados pela empresa que Mário Lino fundou em 1948, em Gaia. Mas foram definhando (alguns saíram do mercado, como a Sanjo e a Molin, finada em 2001).
Entretanto, umas marcas ressuscitaram e outras resistiram à morte certa e renasceram, resgatadas pela paixão de empresários que acreditaram nas potencialidades de velhos nomes que, além da forte implementação de que gozaram no mercado, conquistaram o afeto do grande público e deixaram saudade. A nostalgia do passado, com o inevitável recuo a épocas em que os produtos sobreviviam para lá de uma temporada, deu-lhes a mão. É que, mais do que terem feito parte da vida dos portugueses durante décadas - em alguns casos, gerações -, muitas marcas e empresas nacionais ficaram gravadas no imaginário, mesmo depois de desaparecerem.
Investimento grande
É precisamente por isso que Victor Pais continua a manter viva a Molin, apesar de ter agora um "investimento muito grande" parado por conta do processo movido por uma empresa espanhola, o qual poderá levá-lo a perder a marca que comprou em novembro de 2019, depois de ter adquirido os moldes e a maquinaria da fábrica de Mário Lino. "Algumas pessoas incentivaram-me a lutar pela Molin. Disseram-me que era uma grande marca reconhecida no Mundo, e tenho aguentado, para ver se a marca continua", desabafa o empresário, que detém ainda a Maber, de material de desenho.
"As pessoas lembram-se e associam a marca ao passado: escreveram e estudaram com a Molin. Há aquele saudosismo, e o país perde alguma coisa se eu perder a marca", afirma Victor Pais, desolado por não poder dar resposta a "vários pedidos de material de vários países". Por cá, as míticas réguas já estão em lojas.
"Periodicamente, o revivalismo por marcas que já não estão no mercado mas cujo valor permanece intacto é frequente. Vivemos um período em que a tentativa de recuperação parece ser alvo de interesse, porque se a marca tem algum valor intrínseco é um ativo intangível muito relevante, até porque chegar a esse valor demora muito tempo", reflete o presidente da Associação Empresarial de Portugal (AEP).
Racionalidade
Luís Miguel Ribeiro lembra que "o processo de recuperação de uma empresa em dificuldades obedece a critérios de racionalidade económica, não havendo soluções milagrosas". Sublinha, contudo, que "a perseverança do empresário e dos trabalhadores é um dos fatores críticos para levar a bom porto um processo de recuperação" e que "a transparência e envolvimento de todos na situação da empresa é uma estratégia que deve ser ponderada".
E a prova de que a união e a congregação de esforços dá frutos é a Cerâmica Valadares, cuja sobrevivência, após o encerramento em 2012, se deve em boa parte à dedicação dos funcionários, que abdicaram de metade de um crédito de 10 milhões de euros e ajudaram a levar a empresa para a frente. Este ano, a fábrica de Gaia celebra o centenário.
Marcas que marcam
Empresas marcantes no Norte conseguiram reinventar-se e voltaram, fortes, ao mercado
Sanjo voltou
Depois de uma sucessão de infortúnios, a velha Sanjo voltou em força ao mercado, pelas mãos de uma empresa de Braga, com novas sapatilhas. A marca criada na década de 1940, em S. João da Madeira, foi à falência em 1996. Houve, entretanto, algumas tentativas de recuperá-la, mas não foram bem sucedidas.
Sabonete centenário
Criada no Porto, em 1918, pelos irmãos Brito, a Ach Brito é uma empresa de sabonetes e perfumaria. Nos anos 2000, quase foi ditado o seu encerramento, mas conseguiu recuperar. Exporta para mais de 50 países.