À semelhança do ano passado, a redução do IRS será sentida ainda este ano, através das taxas de retenção na fonte. Com mais dinheiro no bolso, as famílias terão de adiantar menos imposto ao Estado todos os meses, o que deverá traduzir-se em reembolsos mais curtos em 2026. "É o ideal", defende a Ordem dos Contabilistas.
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A proposta de redução entre 0,4 e 0,6% das taxas de IRS, formalizada pelo Governo na quarta-feira, vai permitir às famílias levarem mais dinheiro para casa, mas o alívio fiscal poderá resultar em reembolsos mais pequenos no próximo ano. Tal é justificado com o reajuste que será feito nas tabelas de retenção na fonte, ou seja, no imposto que os contribuintes adiantam todos os meses ao Estado através de uma redução no seu rendimento, que o Governo pretende "aproximar o mais possível" do total de imposto a pagar anualmente. Ao JN, a bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC) alerta para a necessidade de os portugueses gerirem a expectativa em relação aos reembolsos do IRS. "O reembolso não é um valor que o Estado dá. É o encontro das contas finais entre aquilo que adiantámos e a tributação afinal. É preciso acabar com o mito de que por não ter reembolso ou ainda ter de pagar no final, achar-se que os impostos estão a subir", esclarece Paula Franco.
A expectativa do Governo é que o Parlamento aprove o mais rápido possível a baixa de impostos, de modo a poder concretizar o alívio fiscal, em setembro e outubro. A bastonária da OCC adverte que, ainda sem as novas tabelas de retenção na fonte, não é possível calcular os efeitos que a redução poderá ter nos reembolsos, mas salienta que o caminho que o Governo está a seguir é "o ideal". "A aproximação [entre o valor retido e aquele que é devido no final] faz com que o reembolso seja menor ou até se tenha de pagar imposto porque o Estado deixa de ter o dinheiro do seu lado. Passa a estar no bolso do contribuinte, mês a mês", sublinha a responsável, frisando que nenhum contribuinte sai prejudicado.
A Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor (Deco) considera que a redução das taxas de IRS "fará diferença no orçamento mensal", mas destaca que, com menos imposto retido todos os meses, "é importante que os consumidores façam um maior planeamento do orçamento ao longo do ano". O organismo recorda que, aquando da entrega da declaração de IRS deste ano, muitos portugueses foram surpreendidos com reembolsos mais pequenos e até pagamentos ao Estado, algo que deverá voltar a acontecer em 2026, já que o modelo é semelhante.
Classe média sai beneficiada
Apesar de os reembolsos em 2026 poderem ser mais pequenos, a descida de impostos vai concretizar-se. Em linha com o Governo, Paula Franco concorda que a medida é "justa e correta" - segundo uma simulação do Ministério das Finanças, um casal com dois filhos que ganhe, em conjunto, 3000 euros mensais, vai poupar 165 euros por ano - por abranger os rendimentos até ao 8.º escalão do IRS. "É claro que o imposto é progressivo e, portanto, todos os rendimentos acabam por beneficiar, mas nas próprias taxas aplicadas a estes escalões, é efetivamente correto e justo, porque é a pura classe média portuguesa que paga muitos impostos e que não tem rendimentos assim tão altos", defende, indicando que o rendimento mais baixo do 8.º escalão corresponde a cerca de 3200 euros brutos por mês.
A bastonária da OCC recorda que, com a intervenção da troika, em 2011, "houve um agravamento enorme da tributação do imposto sobre o rendimento e ainda não existiu, até agora, uma descida equiparada", apontando que esta medida vai permitir "criar riqueza, aumentar a poupança e introduzir mais consumo". "É muito positivo haver estas descidas graduais, que permitam e garantam a sustentabilidade das contas públicas, obviamente, mas é justo porque houve um agravamento muito grande, essencialmente na classe média".
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Famílias abrangidas
A descida de impostos deverá beneficiar cerca de 3,4 milhões de famílias. Segundo a Autoridade Tributária, mais de 2,5 milhões de agregados foram dispensados do pagamento de IRS, em 2023.
Carga fiscal no PIB
De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, a carga fiscal continua acima do período pré-troika. No ano passado, a soma dos impostos e das contribuições correspondeu a 35,7% do PIB. Em 2010, o ano antes da assistência financeira, a proporção fixou-se nos 30,4%.