Auditoria decretada após investigação a Serrão sugere devolução de 30 milhões de euros

O empresário Manuel Serrão
Carlos Carneiro / Global Imagens
Um auditoria a serviços públicos com responsabilidades de atribuição de fundos europeus, decretada pelo Ministério da Coesão territorial após as buscas ao empresário Manuel Serrão, concluiu pela anulação de 30 milhões de euros em despesas já certificadas, de um total de 72,4 milhões declarados.
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Uma "ação de controlo extensiva e aprofundada às operações" abrangidas pela designada “Operação Maestro", que levou a buscas ao empresário Manuel Serrão, "identificou situações de apropriação indevida de fundos europeus" e falhas "na prevenção, deteção e correção de erros", lê-se num comunicado do Ministério da Coesão Territorial. A auditoria foi desencadeada pela Agência para o Desenvolvimento e Coesão (AD&C), na qualidade de Autoridade de Certificação do Portugal 2020, realizou, em articulação com a Inspeção-Geral das Finanças,
O documento resultante desta operação foi enviado ao Ministério Público e também ao Ministro da Economia para eventual instauração de procedimentos disciplinares no interior da AICEP, Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal. "O Governo tem uma posição de tolerância zero para a fraude. Impõe-se recuperar o dinheiro indevidamente recebido e sancionar os infratores. É absolutamente fundamental preservar a confiança nas entidades responsáveis”, disse o ministro da Coesão territorial, Manuel Castro Almeida. “Os Fundos Europeus são de extrema importância para o desenvolvimento e crescimento económico do país e não pode haver quaisquer dúvidas sobre a correta gestão da sua atribuição e aplicação”, lê-se no mesmo comunicado enviado às redações.
Manuel Serrão foi constituído arguido por suspeitas de criar empresas fictícias, em nome de terceiros, usados como testas de ferro, para obter subsídios europeus. O Ministério Público considera Serrão "o principal mentor" do alegado esquema e que levou a Polícia Judiciária a realizar, em 19 de março, 78 buscas, numa investigação em que também são suspeitos o jornalista Júlio Magalhães, António Sousa Cardoso, que liderou a Associação de Jovens Empresários, e António Branco e Silva.
"A ação de controlo identificou insuficiências ao nível da aplicação dos procedimentos de gestão nas fases de análise e seleção de candidaturas, verificações de gestão e supervisão das funções delegadas, concluindo que a mesma não foi eficaz na prevenção, deteção e correção de erros” lê-se no documento. Entre as falhas identificadas, incluem-se um exemplo de faturação a si próprio, em que uma despesa de um fornecedor era do próprio promotor e fornecimentos feitos por entidades relacionadas, direta ou indiretamente, com os beneficiários/promotor, em que o o promotor tinha participação acionista direta ou indireta nesses mesmos fornecedores.
Um dos casos mais mediáticos da Operação Maestro foi a revelação de que o empresário Manuel Serrão vivia num hotel do Porto. Segundo a auditoria, foram encontradas “despesas insuficientemente justificadas”, realizadas numa unidade hoteleira na cidade do Porto “cujo suporte é feito através de uma lista enviada pela entidade beneficiária, não sendo possível verificar, através das faturas, a identidade dos hóspedes ou o número de pessoas e de noites associadas à estadia”, diz o documento. Outra das falhas identificadas decorre da análise a um “email de uma funcionária da AICEP, relatando aos superiores hierárquicos situações irregulares nos projetos de um beneficiário (designadamente transferências bancárias irregulares entre partes relacionadas), sem que os seus superiores hierárquicos tenham dado seguimento a esse reporte, antes pelo contrário, desvalorizando-o."
O relatório conclui que “as desconformidades identificadas obrigam à anulação de despesas já
certificadas no montante de 30 milhões de euros (valor fundo), tarefa que fica a cargo da AD&C,
enquanto autoridade de certificação”. As Autoridades de Gestão –COMPETE 2030, Norte 2030 e PR Lisboa 2030 - devem “desencadear todos os procedimentos adequados, conducentes à recuperação das despesas indevidamente objeto de apoio”, lê-se, ainda, na nota enviada às redações .
“Situações como as identificadas através desta ação de controlo são gravemente lesivas do Estado”, argumenta Castro Almeida. “São também profundamente negativas para a imagem do país, não só a nível nacional, mas também junto das instâncias europeias. Irregularidades destas não deviam existir, mas se existem têm de ser prontamente identificadas e imediatamente corrigidas”, acrescenta a nota enviada pela assessoria do ministro da Coesão Territorial.
No âmbito da ação desencadeada após a “Operação Maestro”, a auditoria analisou 16 processos de candidatura, 89 pedidos de pagamento e 17.335 linhas de despesa, “cujo montante declarado para efeitos de cofinanciamento pelos beneficiários/promotor ascende a 72,4 milhões de euros”. Foram ainda avaliadas duas mil comunicações entre organismos intermédios/autoridades de gestão e
beneficiários/promotor, para pedidos de esclarecimento, envio de elementos, entre outros, acrescenta o comunicado.

