O economista Augusto Mateus diz que a concretizarem-se as medidas de austeridade anunciadas e se o Governo não corrigir a sua estratégia, daqui a um ano Portugal estará com os mesmos problemas que tem hoje. "É preciso que as pessoas sintam que a terra não lhes está a fugir debaixo dos pés que é o que toda a gente sente", defende.
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"O que está anunciado [para o Orçamento de 2013] significa que, grosso modo, daqui a um ano teremos o mesmo problema que temos agora e que dará aos portugueses uma desesperança total", lamenta o economista Augusto Mateus em entrevista à Lusa.
"Estaremos a perceber que apesar de aumentarmos muito as taxas dos impostos, os impostos arrecadados não vão crescer aquilo que se pensava e ao não crescerem aquilo que se pensava vão precipitar em baixa aquilo que é um não cumprimento das metas de défice traçadas", antecipa o professor universitário.
O Governo anunciou "um enorme" aumento de impostos, nas palavras do ministro das Finanças, com especial incidência no IRS, com uma redução de escalões de oito para cinco e a criação de uma sobretaxa de 4%.
Foram ainda anunciadas mexidas de agravamento no IRC e nos impostos sobre o consumo. Em 2013 haverá ainda um agravamento do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), por via da reavaliação aos imóveis que está a ser feita desde o final de 2011.
É neste cenário que Augusto Mateus diz que Portugal ainda não atingiu um ponto de rutura, mas também admite que os próximos seis meses são determinantes. "Este é o momento da inteligência, é o momento em que se percebe que esta estratégia é incompleta e desse ponto de vista está destinada ao fracasso", alerta Augusto Mateus.
E portanto, adianta o antigo ministro da Economia do Governo socialista liderado por António Guterres, este "é o momento de tornar a estratégia completa" revendo "o grau de inteligência da austeridade, sobretudo na redução do impacto negativo sobre as variáveis chave e a variável chave é o investimento privado". Mas também é o momento para o Governo levar a cabo "políticas de competitividade e de promoção do investimento".
Se nada for feito nesse sentido, Augusto Mateus alerta que "entraríamos num ponto de rutura no sentido de que seria irreversível que a economia portuguesa se ajustasse mais abaixo do que pode ajustar. Em que os sacrifícios e a destruição de valor fossem mais longe do que deveria ou poderia ir".
"Ainda não estamos aí, mas lá chegaremos se nos próximos seis meses, sensivelmente no fim do primeiro trimestre de 2013, não tivermos sido capazes de corrigir esta estratégia. Seguramente aí estaremos no início de uma espiral depressiva e de um crescimento ainda mais significativo do desemprego e de uma situação muito difícil para as empresas e para a sociedade portuguesa no seu conjunto".
Questionado se podemos chegar à necessidade de reestruturar a dívida, o economista responde: "Restruturações de dívidas, coisas mais radicais, serão inevitáveis se isto descarrilar, mas para agora basta corrigir o que está errado, do lado da inteligência na austeridade, e completar do lado de uma estratégia económica verdadeira onde a austeridade e a estratégia financeira possam entrar e ter o seu lugar".
Por último, Augusto Mateus deixa um apelo: "É preciso que as pessoas sintam que a terra não lhes está a fugir debaixo dos pés que é o que toda a gente sente".
O professor universitário diz que o pior que poderia acontecer, neste momento, era Portugal somar à crise económica uma crise política, mas também não esconde que a democracia tem sempre soluções.
Portanto, "é preciso que o Governo, seja ele qual for, seja este com as correções internas ou externas que possa sofrer, seja qualquer outro (...), que alguém com responsabilidade ajude os portugueses a perceber que tem os pés em terreno firme. Isto é, caiu, está numa situação mais difícil do que estava, mas pisa terra firme, o que as pessoas sentem é que não pisam terra firme, não sabem o que é o futuro, não sabem o que é o presente e, portanto, isso é essencial".