Chama-se Beatriz Lopes, tem 22 anos e faz vários quilómetros diariamente entre Sernancelhe e Moimenta da Beira. O salário mínimo esgota-se rapidamente e as dificuldades só não são maiores porque ainda vive com os pais.
Corpo do artigo
Apesar das recentes medidas do Governo, como o auto-voucher (desconto de 10 cêntimos por litro até 50 litros por mês), os combustíveis não pararam de aumentar. O gasóleo simples estava a custar, no dia 1 de novembro, 1,542 euros por litro, mais 28% do que há um ano. O preço da gasolina estava então nos 1,733 euros por litro, mais quase 25% do que há 52 semanas. O JN foi procurar um exemplo do país real, onde a rede de transportes é deficitária, obrigando a maioria dos trabalhadores a utilizar veículo próprio.
As contas de Beatriz Lopes são fáceis de fazer. A concluir um mestrado e a ganhar o salário mínimo (665 euros), chega quase sempre ao final do mês com os bolsos vazios. Como ela há milhares de jovens na mesma situação. O crescente aumento do preço dos combustíveis só veio complicar ainda mais a sua situação.
Natural de Sernancelhe, uma vila no norte do distrito de Viseu, Beatriz vive com os pais e trabalha no concelho vizinho de Moimenta da Beira, como técnica administrativo-financeira numa pedreira, que é explorada pela sua família. Faz todos os dias 40 quilómetros, 20 para cada lado.
"Com o aumento do preço dos combustíveis a minha vida está mais complicada. No interior não há tanta diversidade de transportes públicos, os autocarros só passam uma vez por dia, então tenho que andar sempre com o carro", explica.
Até aqui gastava 35 euros em gasóleo todas as semanas. A escalada dos combustíveis fez aumentar a sua despesa semanal em dez euros. "Estes constantes aumentos preocupam-me", confessa. A jovem fala mesmo num cenário "insustentável".
Aos 200 euros de gasóleo, soma outros custos no mesmo valor com a alimentação. A isto acrescenta outras compras, em roupa, por exemplo, e gastos num café, como faz qualquer jovem da sua idade. Resultado: chega ao final do mês quase sem dinheiro. "É uma situação aflitiva e revoltante. Se não estivesse em casa dos meus pais, se pagasse renda, luz e assim, ficava num défice de 200 e tal euros", vinca. "Isto é insuportável. Eu gostava de criar uma vida com o meu namorado, ser mãe cedo, mas não consigo", lamenta. Na rede social Linkedin, de cariz mais profissional comparativamente a outras plataformas, a sua publicação sobre o tema, com tabelas de despesas mensais, gerou centenas de visualizações e comentários.
Pai gasta o dobro em gasóleo na pedreira
Beatriz Lopes admite que o pai, o seu patrão, também lhe "podia pagar mais", mas como está à frente do departamento administrativo-financeiro da empresa sabe que ele não o pode fazer. "Ele tem uma pedreira, que consume muito gasóleo e eletricidade. Há seis meses gastava, por mês, 26 mil euros de gasóleo e agora gasta o dobro", adianta, salientando que "com estes custos de contexto é muito difícil pagar mais" aos empregados.
À semelhança do que já fizeram muitas amigas, a jovem não descarta a hipótese de mudar de país, mas só depois de acabar o mestrado. Beatriz garante que as colegas "estão a gostar" da experiência internacional e do que o novo país lhes ofereceu. "Elas já conseguiram atingir coisas que eu ainda não consegui. Conseguiram comprar um carro com o dinheiro delas, a viver sozinhas e ou com o namorado e eu aqui não", conclui.