Zona Euro já estará em recessão, mas Lagarde prevê inflação acima de 2% até 2025, o que lhe dá argumentos para agravar taxas e custos do crédito.
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As famílias, as empresas e os estados mais endividados vão ter anos bastante complicados até 2025 ou mesmo 2026, de acordo com várias indicações deixadas ontem pelo Banco Central Europeu (BCE) e pela sua presidente, Christine Lagarde, que apontam para uma inflação acima da meta dos 2% em 2025, mas com a economia a regressar a um crescimento próximo de 2% em 2024 e 2025.
Vários analistas especializados na leitura do oráculo do BCE afirmam que se a inflação prevista para a Zona Euro persiste acima da meta de 2%, mas se estas mesmas projeções indicam também que a economia aguenta com um crescimento próximo de 2%, então parecem estar reunidos os argumentos para suportar muitas e fortes subidas de taxas de juro ao longo dos próximos três anos ou mais.
E não tem de ser só por via das taxas. O preço dos empréstimos e do crédito público também pode continuar a aumentar por via do agravamento dos custos do financiamento cobrados a bancos, governos e empresas através dos vários programas de cedência de liquidez e de compra de ativos (como obrigações do tesouro).
Ontem, o BCE subiu, como já se esperava, as taxas de juro de referência em meio ponto percentual, colocando a taxa central de refinanciamento em 2,5%, o valor mais alto desde início de 2009.
Mas Lagarde surpreendeu, sendo muito mais agressiva, prometendo um longo e árduo caminho até que a inflação regresse dos atuais 10% para os desejados 2%.
"Ainda temos caminho a percorrer", "temos de ir mais longe", "estamos numa longa corrida", disse Lagarde na conferência de imprensa, ontem, em Frankfurt. Assim, o agravamento dos custos do financiamento aos agentes económicos da Zona Euro terá de continuar de forma "significativa" e "a um ritmo constante".
Mais subidas em fevereiro
Ou seja, os cidadãos da Zona Euro podem esperar vários aumentos de 0,5 pontos, por exemplo. A presidente da autoridade disse mesmo que na próxima reunião do BCE, a 2 de fevereiro, está garantido um novo aumento de 0,5 pontos percentuais na taxa de referência, para 3%. E que na reunião seguinte, haverá "possivelmente" nova subida de 0,5 e na seguinte "possivelmente" outra igual. E por aí a fora.
A par das taxas, o BCE também vai tornar o dinheiro mais caro mexendo nas condições dos programas de ativos. A partir de março o BCE vai começar a desfazer-se definitivamente de obrigações do tesouro e outros títulos que tem na sua posse a um ritmo de 15 mil milhões de euros por mês durante quatro meses, o que pressionará os juros ainda mais em alta nesse período.
"A grande mudança foi na comunicação, com mais mensagens mais agressivas sobre a evolução futura das taxas de juro", diz o gabinete de estudos do BPI. "As previsões macroeconómicas do BCE sugerem que serão necessários três anos ou mais para se atingir o objetivo de 2% de inflação".
"Há três termos-chave que orientam a mudança do BCE: aumentar as taxas "significativamente", a um ritmo "sustentado", e "mantê-las" a níveis restritivos durante um largo período de tempo", acrescentam.
HABITAÇÃO
Prestações podem aumentar centenas de euros
O Banco Central Europeu (BCE) colocou a sua principal taxa diretora nos 2,5%, o nível mais elevado desde finais de 2008. A subida foi de apenas meio ponto percentual, mas o seu impacto não deixará de se fazer sentir ao longo de 2023 nas taxas Euribor, aquelas que influenciam mais diretamente quem contraiu empréstimos para a compra de casa. A Euribor a 12 meses está agora em torno dos 2,8%, mas se der um pulo para os 4% em 2023, os contratos de crédito à habitação, celebrados em 2005 (ver tabela), poderão sofrer um aumento na mensalidade de 116 euros relativamente ao valor pago um ano antes. Esta simulação do Idealista foi feita para um crédito de 150 mil euros a 25 anos, com spread de 1,5%. Para a mesma situação, se o contrato tiver sido feito em 2021, o agravamento da prestação será de 329 mensais relativamente à despesa que era realizada um ano antes.
Os clientes bancários que têm créditos de taxa variável verão, portanto, a prestação da casa subir mal os juros sejam revistos com uma periodicidade trimestral, semestral ou anualmente, conforme a taxa Euribor contratada seja a 3, a 6, ou a 12 meses.
"São pagos mais juros no início do empréstimo, logo os créditos habitação mais recentes vão sofrer aumentos mais acentuados", explica Miguel Cabrita, responsável pelo Idealista/crédito habitação em Portugal.