Presidente do Comité das Regiões diz ao JN que “ainda há tempo para evitar uma grande e desagradável fatura”.
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Os dois anos de negociações para o próximo quadro financeiro plurianual da União Europeia (UE) conheceram, na semana passada, um intenso braço de ferro entre os países que defendem que os fundos de coesão devem ser centralizados nos governos nacionais e aqueles que são contra esta ideia. Os eurodeputados socialistas e liberais usaram o tema como moeda de troca para não fazer cair a Comissão Europeia e tudo deverá manter-se. Mas só quarta-feira, dia da apresentação, é que se saberá.
Há meses que os alarmes soaram quando um rascunho do próximo orçamento plurianual para o período de 2028 a 2034 mostrava uma pequena revolução na forma como os fundos de coesão iam ser geridos. Atualmente estão a cargo dos governos regionais e, no caso português, das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional. A intenção era centralizá-los nos governos nacionais, o que logo gerou receios de benefícios para as regiões mais ricas em detrimento das pobres.
A política de coesão é uma espécie de pedra angular da integração na UE, pois destina mais verbas às regiões pobres no sentido de as desenvolver e aproximá-las dos territórios mais ricos. No início do mês, 14 chefes de Governo enviaram uma carta a Ursula von der Leyen para a demover de avançar com a reformulação dos fundos de coesão.
Na carta que também foi assinada por Luís Montenegro, os 14 líderes europeus defenderam que a atribuição de verbas deve sempre “refletir os diferentes níveis de desenvolvimento das regiões”.
Moção conveniente
No entanto, foi outro acontecimento que pesou mais no previsível recuo de von der Leyen: a moção de desconfiança que foi votada no Parlamento Europeu na semana passada e que podia fazer cair a Comissão Europeia. Em troca do voto contra, os eurodeputados liberais e os socialistas exigiram à Comissão que recuasse na intenção de centralizar os fundos.
“Ainda há tempo para evitar uma grande e desagradável fatura que está a ser preparada nos bastidores, com os governos nacionais a obterem controlo total e liberdade de ação sobre os fundos de coesão e a presidente von der Leyen a ganhar controlo total sobre uma parte maior do orçamento através do novo fundo de competitividade”, diz, ao JN, a presidente do Comité das Regiões Europeu (CoR), Kata Tüttö.
Refira-se que a Comissão Europeia tem de começar a pagar um montante mínimo anual de 25 mil milhões de euros dos empréstimos externos que financiaram os planos de recuperação e resiliência de resposta à crise da covid-19. Além disso, a Comissão quer fortalecer a indústria de Defesa da Europa.
José Manuel Ribeiro, presidente da Câmara de Valongo e da delegação portuguesa no CoR, recorda que a política de coesão “foi criada para compensar as imensas disparidades na UE”. Reconhece a necessidade de investimento em defesa e competitividade, mas que não seja à custa das regiões mais pobres: “Mantemos uma defesa de uma política que apoie as regiões e que envolva o poder local e regional no desenho e na avaliação destas políticas, além da implementação”.
Mudanças castigam políticas de Viktor Orbán
Os planos da Comissão Europeia só serão conhecidos na quarta-feira, mas tudo indica que Ursula von der Leyen se prepara para apertar o cerco a Viktor Orbán, primeiro-ministro da Hungria.
O objetivo da Comissão Europeia é, segundo o ‘Politico’, aumentar o montante do orçamento que está vinculado à adoção de políticas democráticas que se coadunem com os padrões europeus e prejudicar os que se afastem destas diretrizes.
Deste modo, as violações às liberdades dos cidadãos implementadas nos últimos anos pela Hungria, sobretudo contra a imprensa e tribunais, serão mais difíceis de contornar.
Recorde-se que Orbán já tem suspensas verbas de 18 mil milhões de euros devido ao desvio das suas políticas dos objetivos da UE. Porém, o governo húngaro podia canalizar verbas de outros fundos para projetos suspensos, o que não deverá ser permitido no próximo quadro.
A Hungria tem eleições legislativas em 2026 e Orbán está atrás nas sondagens. As mudanças na UE estão a ser vistas como forma de explorar a sua fragilidade interna.