O luxo sempre existiu e continuará a existir. Haverá diferenças entre trazer um frasco de perfume de sândalo para o palácio do faraó no Egito há três mil anos e gastar 4 mil euros num prato de nhoques de salmão num restaurante em Nova Iorque?
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No antigo Egito dos faraós, o luxo era associado aos ovos de avestruz, perfumes de açafrão, canela ou resina. Já na Grécia antiga, quem tinha vestes tingidas de roxo e consumia frequentemente peixe fresco era associado a ser multimilionário. Na Lisboa quinhentista, as especiarias vindas nos barcos dos descobrimentos equivaliam ao preço do ouro e na Nova Iorque dos anos 1920, quem usasse casacos de pele e pulseiras de pérolas e andasse em carros descapotáveis era visto como um excêntrico cheio de dinheiro.
É verdade. O luxo sempre existiu e continuará a existir. Qualquer dos produtos descritos acima custava uma fortuna na época e no seu contexto geográfico e só era acessível por um elite, como reis, bispos, aristocracia, grandes magnatas ou proprietários de poços de petróleo.
Na sociedade atual, há quem afirme que o luxo foi democratizado, mas os mais céticos são os primeiros a negar tal coisa. A escritora e jornalista Dana Thomas acredita que o verdadeiro luxo sempre será, por definição, "o património de uma minoria exclusiva e requintada". Se olharmos bem ao nosso redor, descobrimos que continua a ser assim.
O exemplo mais prático, e não estamos a falar dos mais ricos do Planeta, como Elon Musk ou Jeff Bezzos, é Cristiano Ronaldo. O jogador português, com um contrato das arábias de 200 milhões de euros por ano, continua a ter gostos que não estão ao alcance de qualquer um. Comprou recentemente um carro, um avião e uma nova mansão em Riade pela quantia astronómica de 81 milhões de euros.
O capitão da seleção nacional adquiriu um novo jato privado, um Gulfstream G650 para substituir o antigo, o modelo G200, que comprou em 2015. Só nessa aeronave despendeu 60 milhões de euros. Um verdadeiro avião com capacidade total para 19 passageiros e espaço para dez camas. O avião pode ainda voar cerca de 14 mil quilómetros sem abastecer. Outra das suas excentricidades são os carros de luxo. A sua última aquisição custou 8 milhões de euros por um exclusivo Bugatti Centodieci. Na sua ida para a Arábia Saudita, fez questão de se instalar à príncipe do deserto. A nova mansão, avaliada em 13 milhões de euros e perto do estádio, é um autêntico palácio, com oito quartos e uma piscina olímpica.
Quatro dias no Mónaco
Mas há vários exemplos práticos de um verdadeiro luxo, um gasto excecional ao nível de pouquíssimos bolsos, o equivalente ao custo aproximado para uma caravana beduína, há três mil anos, trazer um frasco de perfume de sândalo para o palácio do faraó em Luxor, no Egito.
Quanto dinheiro um multimilionário pode gastar num fim de semana no Mónaco, considerada uma das cidades mais caras do Planeta? Depende da época do ano. De 26 a 28 de maio vai decorrer mais um Grande Prémio de Fórmula 1, um evento que costuma ser de opulência e cosmopolitismo.
Quem quiser assistir ao vivo, daqueles que não olham a gastos, quatro dias podem ficar na maravilhosa quantia de 53 mil euros por pessoa. Inclui avião privado partindo, por exemplo, dos Estados Unidos, estadia no famoso hotel Hermitage, acesso aos locais mais exclusivos e VIP da corrida, incluindo iates, convívio com a monarquia monegasca, jantares e um desfile e festa com algumas das principais modelos da Europa, celebridades, e pilotos da F1 e suas esposas na famosa Amber Lounge. Mas se a ideia é assistir ao evento na marina do Mónaco com o seu iate, só "estacionar" o barco custa, em média, 25 mil euros por dia. Mas pode sair mais caro, depende do tamanho do iate...
Afinal onde estão e quem são os muito ricos?
Quem pode pagar um fim de semana como este? Apenas os bilionários ou os super-ricos se aproximam desta categoria, os chamados centimilionários, que têm ativos muito acima das centenas de milhões de euros, uma aristocracia de grandes gastadores cujo estilo de vida envolve um custo entre 50 e 80 milhões de euros por ano. Ou então um grupo maior de super-ricos que, de vez em quando, cometem uma extravagância, mas que no resto do ano levam um estilo de vida mais frugal.
Os novos faraós, guardiões da omnipotência económica, aqueles que possuem fortunas pessoais acima dos mil milhões de dólares são os únicos que se podem dar ao prazer de gastar sem saber, muitas vezes, porquê. Segundo o relatório Wealth-X da consultora Altrata, que caracteriza as riquezas extremas no Mundo, há 3 311 pessoas que, juntas, acumulam o equivalente a 13,9% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial, uma concentração de riqueza sem precedentes na história e que deixariam Karl Marx e Lenine corados e a dar voltas no túmulo.
O relatório também dá indicações muito precisas sobre a sua distribuição geográfica. Nos últimos anos, tudo mudou e já não se concentram exclusivamente nos Estados Unidos e na Europa Ocidental. É verdade que existem 138 em Nova Iorque, 85 em São Francisco, 59 em Los Angeles, 77 em Londres e 33 em Paris. Mas Hong-Kong já tem 114 e cidades como Moscovo (77), Pequim (63), Shenzhen (44), Dubai (38), São Paulo (33), Bombaim (40) e Singapura (50) começam a contar com comunidades muito grandes de novos faraós de opulência.
Como gastar dinheiro quando há muito, muito mesmo?
Em princípio, o estilo de vida e os hábitos de consumo desta liga dos obscenamente ricos deveriam ser o melhor parâmetro da opulência contemporânea. No entanto, não é bem assim. A redatora da Business Insider, Hillary Hoffower, diz que "as grandes fortunas podem ser ostensivas, mas as imensas fortunas raramente procuram o mais caro para demonstrar que o podem fazer".
Por exemplo, Elon Musk, o homem mais rico do Planeta, que tem o Twitter, a Tesla e lidera o negócio do turismo espacial, já disse em várias entrevistas que não tem casa e costuma dormir nos sofás dos amigos. Mais perto, Maria Fernanda Amorim, viúva de Américo Amorim, com uma fortuna avaliada em 4,4 mil milhões de euros, é uma das bilionárias do Mundo com um estilo de vida muito frugal. Quem convive com ela, sabe que a mulher mais rica de Portugal faz uma vida do quotidiano do mais normal, sem excentricidades e muito recatada. Apaixonada pela pintura, vive entre Grijó e o Porto. O seu último projeto foi fundar dois museus, um dedicado às artes e ofícios e outro aos vinhos da região do Douro, na Quinta Nova.
Há super-ricos anónimos que não têm um centésimo da fortuna de Elon Musk, mas ainda têm recursos para comprarem uma ilha, adquirir um jato particular com fuselagem de platina, alimentarem-se de trufas brancas de Piemonte ou de queijo Pule, de leite de burra, uma iguaria balcânica que custa mais de 2 mil euros o quilo. Frequentam os restaurantes mais caros do Mundo, seja o Ultraviolet em Xangai, o Masa ou o Per Se em Nova Iorque ou o Sublimotion em Ibiza. Este último, o restaurante de alta cozinha mediterrânica do chef Paco Roncero, tem uma ementa de 20 pratos, três estrelas Michelin, que custa atualmente mais de 1 500 euros por jantar por pessoa.
O limite é a galáxia
Mas qual é o limite? Em teoria, o produto mais caro no Mundo é a antimatéria, com um preço estimado em cerca de 65 mil milhões de euros por grama. Claro está que ninguém parece disposto a comprar tal substância, mas fazê-lo poderia ser uma magnífica operação especulativa, já que em 2008 estava a ser negociada a pouco mais de 23 mil milhões. Ou seja, o seu preço quase triplicou em 13 anos, à medida que se começa a tornar mais frequente conseguir criá-la em condições de laboratório pela colisão de partículas de hidrogénio ou pelo uso de desaceleradores antiprotões.
Que se saiba, não existem informações se anda alguém a comprar antimatéria, mas já carros, relógios, iates ou casas, a situação é bem diferente. Diariamente são transacionados automóveis que valem 30 milhões de euros, como o Rolls-Royce Boat Tail, relógios no valor de 50 milhões como o Graff Diamonds Hallucination, iates folheados a ouro no valor de 4,8 mil milhões como o Yacht History Supreme, um telemóvel fofinho Iphone Falcon Supernova 6 Pink Diamond por 48 milhões ou camas de 6,5 milhões de euros como a Baldachino Supreme, uma extravagância com o design do estúdio britânico Stuart Hughes, com acabamentos em freixo, cerejeira, diamantes, safiras e ouro de 24 quilates.
Se falamos de hotéis, também os há com preços obscenos para os comuns dos mortais. E devem ter clientes porque nenhum deles fechou. Até agora, ninguém pode competir com os 200 mil euros por noite que se paga para dormir no Deep Luxury, um hotel subaquático de cinco estrelas que navega pela ilha caribenha de Santa Lúcia. Mas ainda há o "modesto" The Palms em Las Vegas, que cobra 100 mil euros por noite pela Empathy Suite. Para passar uma noite na cobertura do New York Mark Hotel ou na suite real do President Wilson, em Genebra, há que gastar 70 mil euros por noite.
Como é evidente, par além de dormir bem, há que comer ainda melhor. Nada como ir ao restaurante Golden Gate, em Nova Iorque, e pagar 4 mil euros por um prato de nhoques de salmão, carne de porco ou de vaca. O preço é justificado pela adição da glândula do peixe-lanterna, um ingrediente raríssimo que dá uma cor azul aos nhoques.
Mas há outros locais onde gastar dinheiro, como um guarda-chuva de couro de crocodilo, que são vendidos a mais de 50 mil euros na BiIllionaire Couture, um loja londrina fundada pelo magnata da Fórmula 1 Flavio Briatore e pelo designer Angelo Galasso. Quem os compra? As estrelas de futebol, como David Beckham, ou os astros musicais, como Paul McCartney. Também há produtos como bicicletas de platina que se vendem a mais de 400 mil euros, aspiradores cobertos de cristais Swarovski por cerca de 20 mil, malas de ébano, couro e crina a cerca de 10 mil, chupetas de silicone incrustadas de diamantes por 17 mil, ou seja, todo um mundo de objetos extravagantes, de design arrojado e com um custo fora de órbita, que mostram que o luxo terá perdido o glamour, mas não baixou de preço.