<p>A luta contra o enriquecimento ilícito tem feito correr muita tinta. Os partidos não se entendem, mas Domingues Azevedo considera que o Governo esteve bem ao taxar esses rendimentos. </p>
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Aforma de combater o enriquecimento ilícito não consegue gerar a unanimidade entre as forças políticas. Para Domingues Azevedo, presidente da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, a proposta aprovada anteontem pelo Governo, que prevê a suspensão do sigilo bancário e que taxa em 60% os rendimentos resultantes desse enriquecimento, parece ser "uma boa medida em termos funcionais".
Pune-se fiscalmente o prevaricador. Será razoável?
Em Portugal, no que diz respeito ao incumprimento, sempre se privilegiou o aspecto economicista. Ou seja, nunca houve grande preocupação em penalizar, mas sim em obrigar a pagar. Penso que, atendendo a que os processos de manifestação de riqueza estão muito mais expressos na declaração de rendimentos e que acabou o sigilo bancário, esses factos chegam rapidamente ao conhecimento da Administração Fiscal. Para um verdadeiro combate ao enriquecimento ilícito penso que esse mecanismo irá ser muito eficaz.
E em termos criminais?
Uma coisa não exclui a outra. Mas, se dependesse só do âmbito criminal, antes de haver sentenças transitadas em julgado as pessoas ainda enriquecem mais. Por isso, em termos práticos, concordo com a medida do Governo.
Critica-se o facto de o presumível prevaricador ter pouca possibilidade de se defender. Concorda?
Mas será que é de dar possibilidade de defesa a uma pessoa que tem um vencimento de 10 ou 15 mil euros e apresenta, no final do ano, um património acrescido de centenas de milhares de euros? Como vai justificar esse enriquecimento? Onde foi buscar o dinheiro?
A Administração Pública tem meios para detectar, atempadamente, esse enriquecimento?
Portugal foi pioneiro na utilização de meios informáticos para esse fim. Actualmente, há um conjunto de informação na Administração Pública, via Administração Fiscal, que permite que o controlo se faça à distância e se detectem logo estas situações. Se as pessoas começassem a comprar jóias ou quadros o controlo seria, obviamente, mais difícil. Mas sabemos que a maioria desses bens não é muito aliciante para neles se investir. Quem tem muito dinheiro quer comprar casa com piscina, carros, acções, tudo facilmente detectável através do cruzamento de dados.
Voltando aos tribunais. Haverá crime sem outro castigo que não seja o de pagar impostos?
Esta é uma boa medida, o que não exclui o seu tratamento acessório em sede criminal. Mas sabemos que a Justiça, independentemente dos seus muitos méritos, é excessivamente burocrática. Depois, temos a história dos recursos atrás de recursos, e outros expedientes. Hoje, há uma série de dilações no tempo que não abonam a credibilização da Justiça.
Daí que este seja o caminho mais rápido?
Esta é a via que proporciona mais elementos objectivos, fáceis de controlar e de apreender pela máquina fiscal. E é bem mais persuasivo. Se alguém praticar um crime e souber que o caso se vai arrastar durante anos pelos tribunais, a apetência para manter a actividade delituosa é muito maior. Ao passo que, com este sistema, a pessoa tem a noção de que se prevaricar hoje, a Administração Fiscal vai sabê-lo na hora e a punição será muito rápida. E isso, sim, pode dissuadir.
