A Kid To Kid, uma cadeia de lojas de roupa e artigos em segunda mão para crianças, permite a reutilização de 1,2 milhões de artigos por ano. A Cash Express vai abrir dois novos estabelecimentos em 2020. O mercado de usados FleaMarket do Porto recebe entre cinco a oito mil visitantes por edição. São exemplos de como os negócios em segunda mão têm crescido em Portugal e de como aumenta o número de pessoas que optam por reutilizar objetos, evitando o consumo de mais recursos e poupando a carteira.
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Quando, em 2003, Paulo Frias Costa fez chegar a Portugal o conceito da Kid to Kid, havia "muita desconfiança" e ninguém acreditava que a ideia vingaria. Dezasseis anos depois, as 22 lojas (a maioria em franchising) e os seis milhões de euros de faturação anual provam que, afinal, é possível voltar a fazer circular os artigos que estão em bom estado mas deixaram de ser úteis a quem os adquiriu. A empresa permite a reutilização de 1,2 milhões de artigos por ano, desde roupa e calçado a brinquedos e artigos de puericultura, criando 120 postos de trabalho.
Outro exemplo é a Cash Express que tem lojas em Portimão e Tavira e, em 2020, vai abrir outras em Albufeira e Faro. O objetivo, explica o gestor Christophe José, é atingir o objetivo de "30 lojas de Norte a Sul". Os clientes procuram consolas e jogos, telemóveis, material informático e eletrónico e instrumentos musicais. "Além da motivação económica, existe uma grande motivação ecológica: reciclar produtos funcionais que já não utilizam."
Na internet e na rua
O OLX, portal online de compra e venda, tem 3,13 milhões de anúncios ativos e o número de anunciantes registou um crescimento de 3% no último ano. De acordo com o portal, as principais motivações dos utilizadores são "desempatar espaço com coisas que já não são usadas, fazer dinheiro com as coisas que já não usam e profissionais ou pequenas empresas que usam o OLX como montra digital para aumentar a visibilidade do negócio". Emprega quatro dezenas de pessoas.
Também os mercados estão a ganhar adeptos. O FleaMarket Porto chegou ao país há uma década. As primeiras edições no "Maus Hábitos" não tiveram mais de 20 a 30 vendedores, mas depois o projeto saltou para o espaço público e cresceu a olhos vistos. Hoje são cerca de 200 vendedores a cada edição e, por ali, passam "entre cinco a oito mil visitantes", um público "muito diverso", de várias idades e estratos sociais, portugueses e estrangeiros, conta Ana Neto.
"Ao não deitar as coisas para o lixo e a reutilizar, estamos a aumentar o seu período de vida e não se polui tanto", explica a responsável, para quem o projeto ajudou a "retirar tabus e desconfianças" sobre artigos que já tiveram outros usos.
Na feira de Vandoma, que acontece aos sábados de manhã na avenida 25 de Abril, no Porto, a câmara tem registado um aumento do número de vendedores ocasionais e de pedidos para lugares permanentes, existindo atualmente cerca de 170 feirantes e 224 ocasionais a marcar presença para vender roupas, louças, mobiliário, discos, livros, aparelhos eletrónicos e muitos outros objetos usados.
Passar de mãos para poupar o ambiente e a carteira
Aveiro - É habitual Sara Araújo, estudante de 17 anos, cruzar-se com Albertina Queirós, comercial de 54 anos, nos corredores da The Best, uma loja de vestuário e acessórios em segunda mão, em Aveiro, em busca de boas oportunidades que poupam a carteira e o ambiente. Ali, em três pisos, há vestidos de noiva e roupa de marca, calçado, artigos vintage, bijuteria, perfumes e óculos de sol, que Fernanda Costa, a proprietária, selecionou criteriosamente e apresenta de forma cuidada.
Há dois anos Sara ganhou consciência do impacto ambiental da indústria da moda e das más condições de muitos trabalhadores em fabricas têxtil. "É imoral", diz. Começou a procurar artigos em segunda mão e descobriu que era muito mais barato. "Duas coisas boas combinadas" que a fizeram abandonar as compras de objetos novos.
Albertina traz vestido um casaco que comprou na The Best. "Foi baratinho e está como novo", diz, satisfeita, revelando que há dias que se torna fornecedora e não apenas cliente. "Trago coisas minhas para tentar vender, coisas que compro por impulso nos saldos ou que, afinal, não gosto muito ou não ficam bem", explica. Está ao lado de Artur Oliveira, desempregado de 30 anos, outro cliente regular, que elogia a "variedade e qualidade dos artigos".
O negócio nasceu há sete anos, num espaço pequeno, localizado noutro lado da cidade. Mas "tem crescido imenso", permitindo a Fernanda realizar o desejo de mudar para Avenida Lourenço Peixinho.
A empresária decidiu-se a abrir a loja depois de se ter "apaixonado pelo conceito", quando trabalhava numa loja de artigos para criança em segunda mão. Adaptou-o a adultos e decidiu primar pela qualidade. "Só temos coisas em muito bom estado, 95% são usadas, mas alguns artigos são novos, com etiqueta e tudo, provenientes de particulares ou restos de coleção."
Os clientes são "de várias zonas do país, de diversas idades e estratos sociais. Até turistas estrangeiros que pesquisaram sobre lojas em segunda mão e passam cá quando estão na cidade". Há uma "mudança de mentalidades", diz, e, cada vez mais, há quem faça da segunda mão a primeira opção.