Mudança de fornecedor acelerou bastante, mas sem impacto. Motivos? Taxas, impostos e, segundo a Deco, o domínio "quase monopolista" da EDP.
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A fatura da luz para as famílias disparou 39,6% entre 2009 e 2019, de acordo com a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG). Naquela década, a mesma fonte refere um agravamento de 35,9% no gasóleo e de 20,8% na gasolina.
Tal como sucede no mercado dos combustíveis líquidos, o peso crescente das taxas e impostos explica grande parte da fatura. Segundo a Deco, o domínio "quase monopolista" da EDP no segmento doméstico também não propicia mais competição pelo preço.
"A Deco sempre defendeu que a liberalização do mercado não devia ser feita à custa do bolso dos consumidores. No entanto, foi um pouco isso que se passou", refere Pedro Silva, economista e especialista da Deco para assuntos energéticos.
O mal parece ter estado na origem. "O processo de liberalização do mercado doméstico deriva de uma opção no arranque. Noutros países, houve uma distribuição inicial dos clientes pelos diferentes operadores que estavam no mercado. Isso não aconteceu em Portugal", refere Nuno Ribeiro da Silva, ex-secretário de Estado da Energia e atual presidente-executivo da Endesa, uma empresa com peso no segmento industrial, mas que luta "pedra a pedra", como diz Nuno Ribeiro da Silva, para conquistar as famílias.
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O mercado liberalizado (ML) da eletricidade só se abriu a todos os segmentos de consumidores em setembro de 2006. A sua evolução foi lenta, mas representa hoje 95% dos consumos e, só no ano passado, mais de meio milhão de pessoas ou entidades mudaram de fornecedor, sempre na procura de melhores condições. No entanto, as poupanças são ténues porque os preços médios têm subido.
Ranking de preços
Mesmo usando paridades de poder de compra (PPC), indicador que relativiza os preços em função dos rendimentos médios do país, houve um aumento, por exemplo, de 36% entre o segundo semestre de 2009 e igual período de 2019.
Segundo o Eurostat, Portugal era o quinto mais caro no final do ano passado, mas de acordo com o consórcio formado pela Energie-Control Áustria, pelo MEKH (Hungria) e pelo instituto finlandês VaasaETT, o nosso país é o quarto mais caro, quer em euros quer em PPC.
"É expectável que as empresas compitam entre si. Ora, constata-se que houve uma grande transferência da EDP Serviço Universal para a EDP Comercial, que domina 80% do mercado, sendo quase monopolista", refere Pedro Silva. "Quando se comparam as ofertas, o potencial de poupança é muito baixo. Vale a pena deixar de pagar 40 euros mensais no mercado regulado para pagar quase o mesmo na EDP Comercial?", acrescenta o especialista da Deco.
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"As pessoas têm a ideia que se saem da EDP vão ter mais dificuldade em serviços de assistência, até porque existe a EDP Distribuição, que faz as leituras. Detetámos situações em que é alimentada a ideia, em postos de venda e lojas do cidadão, em que é sugerido a quem sai do Serviço Universal a manutenção na EDP", refere Nuno Ribeiro da Silva, lembrando que a confusão era tal que a empresa foi obrigada a rebatizar a EDP Serviço Universal de SU.
A EDP preferiu não responder a qualquer das questões colocadas pelo JN no âmbito deste artigo.
Data ainda incerta para ligeira descida do IVA
O Governo pediu e até já conseguiu autorização a Bruxelas para criar escalões de consumo de eletricidade baseados na estrutura de potência contratada existente no mercado elétrico. Os agregados familiares com menos consumo energético passarão a ter uma taxa de IVA inferior à que pagam atualmente, variando entre um mínimo de 6% e um máximo de 23%, consoante então os kWh consumidos.
Tanto o BE como o Chega bem tentaram acelerar o processo e colocar em vigor a medida - com algumas especificidades próprias contidas nas suas propostas - já com o Orçamento Suplementar. No entanto, o PS chumbou as propostas.
Segundo a Deco, tendo em conta um perfil médio, a poupança pode ser à volta de 100 euros num ano numa fatura de eletricidade e gás, sendo que 40 euros seriam relativos à eletricidade.
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"Eles [Governo] podiam mexer no IVA. É raríssimo o país europeu onde o IVA é a taxa máxima. Fora isso, há muitas taxas e taxinhas. Impostos extraordinários, taxa municipal para passar os cabos, entre outras parcelas. O Governo e os municípios veem na energia uma vaca leiteira", comenta Nuno Ribeiro da Silva, CEO da Endesa.