Produtores de cabrito e borrego satisfeitos com as vendas, assim como os de doçaria, que contam todos com a ajuda da venda online.
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Com um ano de experiência de como passar a Páscoa sem juntar a família, aprendemos, com esta pandemia, que pode haver formas simples de contornar a saudade e até proporcionar alegria: pelo estômago. O que faltará em celebrações religiosas, sobrará tempo para podermos apreciar em casa uma mesa farta. Se não for dado a passar tempo na cozinha, tem sempre sempre o takeaway.
Nesta Páscoa, quem estão felizes são os produtores das principais iguarias desta época. Desde o cabrito e o borrego, às fábricas e pastelarias que se dedicam à confeção de doces, como o pão de ló, as amêndoas cobertas e chocolates.
Foi com um suspiro de alívio que a maioria dos produtores de cabritos e de borregos viram, este ano, chegar encomendas muito parecidas à época pré-pandémica. Os criadores de raças autóctones, por exemplo, revelam boas expectativas nas vendas para esta Páscoa, quer de forma direta ou online.
tudo vendido
António Manuel, criador de cabra bravia em Cabanes, Vila Pouca de Aguiar, diz que tem "já tudo vendido". São cerca de 200 cabritos e cordeiros de raça bravia que foram diretos para talhos.
No ano passado, ainda no início do país confinado, foram sentidas, segundo frisou, mais dificuldades e "ficaram animais para trás". "Este ano corre tudo bem. Não é igual, mas já tenho tudo vendido", apontou. Na sua exploração possui 350 cabras de raça bravia e 80 vacas maronesas. Ainda que haja quebras em comparação com a época pré-pandémica.
Também os pães de ló estão a voar das cozinhas das mais afamadas casas que o fabricam, não só para as grande superfícies mas para muitos clientes que, comodamente em casa, fazem a sua encomenda online.
Com um sorriso estão ainda os produtores de amêndoas e chocolates, que se vendem como pãezinhos quentes. Se a recente venda ao postigo não ajudou a cobrir os prejuízos de dois meses quase parados, mais uma vez, a venda pela Internet tem sido uma grande ajuda e fá-los até chegar a locais que provavelmente não chegariam sem a ajuda da tecnologia.
PREOCUPAÇÃO
Cabrito a 2,5 euros
Em Carrazeda de Ansiães, para que os mais desanimados não deixem de celebrar a Páscoa, a Câmara decidiu ajudar os restaurantes locais, que vão vender doses a 2,5 euros.
Menos 10 euros
Também o município de Mêda vai dar 10 euros por cada dose que os restaurantes locais venderem, até ao limite de 50 doses. Se o prato custar 20 euros, o munícipe que for comprar só paga 10 e a Câmara subsidia com outros 10 euros", explicou o presidente da Câmara, Anselmo Sousa.
Menos pão de ló
Os dois únicos produtores em Arouca de doçaria conventual (o pão de ló , que se apresenta numa única fatia, alta e quase quadrangular, encharcada em calda de açúcar e a bola de pão de ló) queixam-se de uma ligeira quebra nas vendas
Bolo podre cai
O bolo podre e o bolo de azeite, tradicionalmente mais vendidos na altura da Páscoa, nos distritos de Viseu e Guarda, estão a sofrer quedas nas vendas superiores a 50%, disseram responsáveis do setor.
Quebras na bola doce
A bola doce mirandesa deixou de ser uma iguaria da época da Páscoa e tornou-se num ex-líbris da doçaria do Planalto Mirandês. Mesmo assim, os produtores deste doce dizem que a pandemia trouxe quebras à produção. As vendas online ajudam, contudo, em menores quantidades que num ano normal.
Em 2020, nem um cabrito vendi
Criador de cabras e ovelhas mais feliz com faturação deste ano.
"No ano passado nem um se vendeu, este ano tenho quase os 100 cabritos vendidos", diz Higino Esteves, produtor de queijo e carne de cabrito. É professor e segurou ainda a atividade dos pais há mais de 20 anos, em Proença-a-Nova.
A mesa do domingo de Páscoa tem, por tradição, cabrito ou borrego. Nesta zona do distrito de Castelo Branco, o cabrito é rei. Daí que a procura aumente, habitualmente, por estes dias. Mas com os restaurantes fechados, os produtores têm dificuldade em escoar. "Nos restantes anos, a Páscoa era boa para a venda dos cabritos. No ano passado, por causa da pandemia, foi péssimo". Higino Esteves ficou com todos os cabritos. "Foi um drama. O que me valeu foram os amigos que compraram alguns", lembra.
Higino Esteves abre o portão para as cabras irem pastar, os cabritos ficam dentro da cerca do pavilhão. "Daqui a pouco vem um distribuidor buscar alguns para irem para os talhos. Este ano, o escoamento está a correr melhor", garante o produtor e dono de um rebanho de 150 cabras e 100 ovelhas. "As coisas estão melhores. Mesmo em relação aos queijos, que também vai à mesa em festas, já tenho encomendas e vendas feitas. No ano passado, nem um vendi", explica.
Diz o produtor que "a Páscoa era melhor que o Natal. As aldeias recebiam os de fora, o tempo estava bom, havia turismo e os restaurantes estavam abertos".
A venda de cada cabrito "pronto a comer", de mês e meio de vida, com um peso de cerca de sete quilos, custa entre 40 e 55 euros. A iguaria na mesa pode custar entre 80 a 100 euros. "O pior é que nos afeiçoamos aos animais. Já convivo com cabras e cabritos desde os tempos dos meus avós, mas a vida é assim", confessa Higino.
Amêndoas e chocolates em grande
Arcádia deu a volta à crise com comércio digital que chega a todo o país.
Sabendo do inevitável prejuízo que iria sofrer com o segundo confinamento, a Arcádia, criada e mantida há quatro gerações na cidade do Porto pela família Bastos, decidiu pensar em novas estratégias e modernizar-se para alargar a venda da sua doçaria.
Foi o avô de Francisco Bastos que abriu, em 1933, uma espécie de salão de chá para a elite portuense e que evoluiu para a mais afamada casa de chocolates da cidade e, provavelmente, do país. O administrador conta que o confinamento do ano passado levou a uma quebra de cerca de 25% nas vendas, embora tenha recuperado nos meses seguintes, com a ajuda de novos canais de venda, como o online.
Em 2020, nas 30 lojas que a marca tem espalhadas pelo país, "as vendas ao balcão até superaram as de 2019", conta. Para isso, contribui o facto de a grande maioria das iguarias da Arcádia ser para o mercado interno, não dependendo de exportações nem do turismo, que tem deixado as cidades mais desertas.
Este ano, as vendas superaram três vezes as de 2020, "o que nos tem dado mais alento", explicou Francisco Bastos, sublinhando as grandes vendas feitas para hipermercados, que dão uma grande ajuda no escoamento do produto.
Nesta altura, o que mais sai são as amêndoas, que as há de todos os sabores, sempre de inigualável qualidade, assim como os chocolates (em formas de ovo ou coelhos, assim como em tablet ou bombons). Mas uma das best-sellers, fabricada o ano inteiro, é a amêndoa de licor, cuja receita o avô trouxe de Paris quando abriu a primeira Arcádia no Porto. Em formas de frutos, legumes e bebés, é dos produtos mais conhecidos da empresa, um pouco abaixo, apenas, das línguas de gato e do sortido tradicional.
Vendas online contornam prejuízos
Casa do pão de ló fabrica doce num forno a lenha de 1730.
Na cozinha da centenária Casa do Pão de Ló de Margaride, em Felgueiras, o cheiro adocicado denuncia a azáfama vivida na última semana, durante a qual foram confecionados mais de 3000 pães de ló.
Fundada em 1730, a Casa do Pão de Ló do Margaride é uma das empresas mais antigas de Portugal. Atravessou sete gerações e conta atualmente com oito funcionários a tempo inteiro, aumentando esse número para o dobro nas festividades. Há 120 anos que ocupa uma casa antiga, ao lado da Câmara, que faz dela "a sala de visitas do concelho, a mais antiga e tradicional", contou ao JN, Guilherme Lickfold, o proprietário da empresa que, em 1893, recebeu a distinção, por D. Carlos, de fornecedor da Casa Real.
O carinho colocado no fabrico desta iguaria "única e com características próprias", levou reconhecimento à Casa do Pão de Ló de Margaride. "É um pão de ló de massa fofa, mais seco, feito apenas com ovos, farinha e açúcar, segundo o processo tradicional", confidenciou Guilherme Lickfold. Durante esta semana, de Felgueiras sai pão de ló para todo o país. Mas na loja, os clientes passaram a ser menos devido à pandemia, o que obrigou a empresa a adaptar-se e apostar nas vendas online. "No ano passado tivemos uma quebra de cerca de 80% na Páscoa, mas deu-se a explosão das vendas online. Este ano há quebra mas menor, e houve um aumento de mais de 50% no online", explicou.
Com um processo de certificação a decorrer, Guilherme Lickfold quer ainda criar um museu "ou uma casa de chá, para que as pessoas possam apreciar o espaço, a sua antiguidade e decoração e, ao mesmo tempo, deliciar-se com o nosso pão de ló", rematou.