Preço dos materiais e custo da mão de obra sobem a uma escala sem precedentes. Aço, cobre, alumínio, madeira e betuminosos foram os que encareceram mais. Faltam 70 mil trabalhadores.
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O setor da construção está a enfrentar uma escalada de preços sem precedentes e isso está a fazer com que dezenas de obras públicas, de norte a sul do país, sejam adiadas. Não faltam concursos públicos vazios e obras que ficam suspensas à espera que se resolvam os dois principais problemas do setor: as subidas do preço dos materiais e do custo da mão de obra.
O JN encontrou dezenas de obras adiadas e concursos públicos vazios em todos os distritos do país, no último ano, por causa do preço da construção. Concelhos como Coimbra, Viana do Castelo, Guimarães, Bragança, Vila Nova de Gaia, Porto ou Lisboa são os mais afetados em termos de valor de obras. Fernando Ruas, presidente da Câmara de Viseu, afirmou que "nenhuma obra está dentro do prazo" no concelho viseense.
Já Manuel Reis Campos, presidente da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN), garante que há "fortes subidas de preços em matérias-primas como o aço, o cobre, o alumínio, a madeira e produtos derivados do petróleo, como os betuminosos". As cotações de fecho de contratos futuros da Bolsa de Metais de Londres registavam, no final de outubro, subidas de 55% no preço do aço em varão para betão, 59% no alumínio e 46% no cobre, quando comparados com o período homólogo de 2020.
O presidente da AICCOPN constata que os impactos da inflação "têm-se repercutido a uma escala sem quaisquer precedentes", pois as empresas também estão a sentir o efeito do aumento dos preços dos combustíveis e eletricidade. Aliás, a escalada de preços dos materiais de construção resulta de disrupções nas cadeias logísticas e produtivas pós-pandemia, mas também do aumento do custo da energia: "A maior parte do preço dos produtos siderúrgicos é energia", esclarece José de Matos, secretário-geral da Associação Portuguesa dos Comerciantes de Materiais de Construção (APCMC).
AUMENTO DE 6,8%
A variação homóloga estimada do índice de custo de construção de casas novas, divulgada pelo INE, foi de 6,8% entre agosto de 2020 e o mesmo mês de 2021. Para isto contribuiu a aceleração do preço dos materiais em 8,7% e do custo da mão de obra em 4,1%.
José de Matos estima que os preços estabilizem em abril do próximo ano, data prevista para o fim da crise energética: "Eu diria que ficarão na ordem dos 5% acima, no final deste processo". Esta previsão depende da variação do custo da mão de obra, que está a subir desde 2015 devido à falta de profissionais. O secretário-geral da APCMC afirma que a mão de obra encareceu mais que os materiais nos últimos cinco anos, muito por causa da política de imigração da União Europeia: "A Europa não deixa entrar gente, por muito que as empresas tentem trazer gente de fora". Manuel Reis Campos estima que o setor "tem necessidade de 70 mil trabalhadores". Atualmente são 300 mil.
EXEMPLOS
Guimarães: Falta de materiais adia teatro
O Teatro Jordão é uma das principais obras do segundo mandato de Domingos Bragança, presidente da Câmara de Guimarães, mas a falta de materiais de construção tem vindo a adiar a inauguração do espaço que vai servir como escola para a Universidade do Minho e Academia de Música Valentim Moreira de Sá. A reabertura do espaço estava prevista para junho deste ano, foi adiada para agosto, depois para outubro e agora não tem data prevista.
Viseu: USF adjudicada ao terceiro concurso
A Unidade de Saúde Familiar da Rua das Bocas está prestes a ser inaugurada, mas só algumas semanas depois do esperado. O projeto orçado em cerca de dois milhões de euros teve problemas logo na fase de concurso. Não havia empreiteiros interessados e foram precisos três concursos públicos. A reabilitação do Estádio Municipal do Fontelo também tarda. A empreitada, avaliada em mais de um milhão de euros, atrasou devido à falta de materiais.
Sines: Terminal Vasco da Gama sem ofertas
O concurso para a construção e exploração do terminal Vasco da Gama, em Sines, foi lançado com o preço de 640 milhões de euros. Várias empresas, incluindo da China e dos Estados Unidos, levantaram o caderno de encargos. Antevia-se que a concorrência fosse elevada, mas ninguém apresentou propostas. O novo concurso vai ter um preço-base mais baixo, mas a carga inicial suportada também será menor. Ainda não há prazo para o segundo concurso.