O ex-subdiretor-geral da Autoridade Tributária José Maria Pires admitiu, esta quinta-feira, que concordou com a criação de um sistema "proativo" de proteção de dados, não para proteger contribuintes VIP do pagamento de impostos, mas pelo direito ao sigilo fiscal.
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Numa carta de despedida enviada por email aos trabalhadores da AT, a que a agência Lusa teve acesso, José Maria Pires explica que pediu na quarta-feira a demissão para "proteger a instituição", depois de também o diretor-geral da entidade, Brigas Afonso, se ter demitido, no seguimento do caso da lista VIP de contribuintes na AT (mediáticos, da área política, financeira e económica), a cujo cadastro terá sido aplicado um filtro que permitiria detetar quem lhe acedia.
O ex-subdiretor-geral da Justiça Tributária e Aduaneira recorda uma informação de 10 de outubro da Área de Segurança Informática (ASI), que dava conta da implementação "de uma nova metodologia de proteção e segurança dos dados pessoais dos contribuintes".
José Maria Pires refere que, perante a constatação de um "aumento significativo de consultas a dados fiscais sigilosos de contribuintes e de violação do direito ao sigilo fiscal", a ASI informava que "o controlo efetuado era apenas reativo" e que, por isso, propunha-se que "se implementassem diversas medidas com um efeito preventivo, no sentido de obstar à violação do sigilo fiscal".
"Concordando com a necessidade de criação de um sistema proativo, que atuasse de forma prévia à efetiva violação do direito ao sigilo fiscal, remeti a informação à Direção de Serviços de Auditoria Interna (DSAI), solicitando-lhe a elaboração de um relatório" sobre os acessos indevidos a informação fiscal até ao final do ano passado, afirma o subdiretor-geral demissionário, acrescentando que esse relatório nunca foi apresentado.
José Maria Pires sublinha que esta foi a sua "única intervenção" no processo e assegura que "não recebeu instruções de ninguém" para avançar com o sistema, reiterando que apenas concordou com a "avaliação da hipótese de substituição de uma ação meramente reativa da AT perante a violação consumada de um dever, pela implementação de diversas medidas preventivas, que obstassem a violação" do direito do sigilo fiscal.
"Jamais pretendemos proteger contribuintes contra a atuação legal da administração fiscal, mas apenas contra a devassa de dados pessoais e a violação do direito ao sigilo fiscal", assegura.
No final da carta de despedida, José Maria Pires afirma que "as instituições sobrepõem-se às pessoas que as servem", e defende a equipa e a missão da AT, considerando que "engrandece o país".
José Maria Pires é a segunda "baixa" causada pela lista VIP na AT, que se demitiu na quarta-feira, no mesmo dia em que também o diretor-geral da AT, António Brigas Afonso, colocou o lugar à disposição da ministra das Finanças.
Na carta enviada na quarta-feira aos trabalhadores, o diretor-geral demissionário defendeu que "a importância e a sensibilidade da proteção dos dados pessoais dos contribuintes exigem da AT a adoção de metodologias preventivas, e não apenas reativas, contra a intrusão e o acesso ilícito", acrescentando que "estavam a ser ponderadas novas alternativas", mas que "nenhuma tinha sido até agora implementada", e sublinhando que a lista VIP "não existe e nunca existiu".