CEO diz que comprador de um pacote imobiliário com grande desconto não é anónimo, apesar de estar sediado nas ilhas Caimão.
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Venda de imóveis "com grande desconto", sendo o comprador um fundo sediado num paraíso fiscal (ilhas Caimão), financiado pelo próprio banco e tendo este sido compensado pelo Fundo de Resolução. O Novo Banco (NB) está na berlinda, tendo o tema até sido focado no debate do estado da nação de sexta-feira, levando o primeiro-ministro a pedir à PGR que suspenda as vendas de imobiliário do NB até estar concluída a auditoria da Deloitte. A procuradoria está "a analisar a carta" de António Costa. O JN/Dinheiro Vivo sabe, porém, que não há, neste momento, operações de venda de ativos no mercado. Mas é natural que venham a ser constituídas novas carteiras para alienar até ao fim do plano de recuperação do banco, cujo prazo se prolonga até ao final do ano que vem.
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O NB tem ainda um rácio de "non performance loans" (malparado) a rondar os 11%, acima da média nacional e do que Bruxelas fixa como um nível saudável (cerca de metade). E o compromisso assinado aquando da venda à Lone Star, em 2017, previa a redução desse malparado herdado do BES, que estava então nos 28,1%, até ao final de 2021. Para este ano, o banco previa reduzir esse rácio em 1,7 mil milhões.
A venda de "5355 imóveis, compostos por 8486 frações" em 2018, "herdados do BES e que há muito deveriam ter sido vendidos", diz o NB em comunicado ontem enviado, foi cumprida e incluída no Relatório e Contas de 2018, que atribuía ao Projeto Viriato um valor contabilístico de 631 milhões de euros, com a instituição a estimar receber 388,9 milhões das "entidades indiretamente detidas por fundos geridos pela Anchorage Capital" .
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O negócio, que acabou por ser concretizado por 364 milhões, mereceu ontem a oposição de todos os partidos políticos (ver ao lado), que na sequência da notícia divulgada pelo "Público" exigem ouvir o CEO do NB logo que regresse a atividade parlamentar.
Os partidos questionam o desconto no preço (a venda foi feita por cerca de metade do valor da carteira), mas também o facto de o NB ter financiado as cinco sociedades imobiliárias portuguesas juntas num fundo "de investidores anónimos sediado nas ilhas Caimão" e, sobretudo, que a carteira tenha sido alienada com perdas, mas o banco compensado desses prejuízos pelo Fundo de Resolução, com uma injeção de 260 milhões de euros.
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Compensação por perdas
Em 2017, quando o NB foi vendido à Lone Star, foi criado um mecanismo de capital contingente que obriga o Fundo de Resolução a injetar dinheiro no NB sempre que seja preciso repor capital próprio na instituição por conta de ativos herdados do BES.
"Os imóveis vendidos no Viriato não causaram prejuízos diretos ao Fundo de Resolução", garante o banco em comunicado, justificando que a generalidade dos ativos não está coberta pelo mecanismo de capital contingente. "Refira-se mesmo que para a totalidade dos imóveis protegidos até dezembro de 2019, o banco tinha obtido para o Fundo uma mais-valia de dez milhões que reduzia às perdas noutros créditos."
No Twitter, o presidente do NB garantiu ainda que analisou e conhece os compradores finais da carteira. "Claro que sabemos o beneficiário último e que foi analisado detalhadamente pelo "compliance" do banco e feitos todos os relatórios", sublinha António Ramalho, lembrando que "todas as sociedades são detidas pelo vencedor do concurso, a Anchorage", e que as comunicações requeridas foram feitas e "publicadas logo em outubro de 2018".
O banco garante ter feito a venda "aproveitando as boas condições do mercado imobiliário", numa operação que cumpriu todas as regras e até foi destacada como uma "das melhores do ano".
Administração premiada
Apesar dos prejuízos recorrentes, os salários dos gestores do NB têm vindo a subir e estão a ser contabilizados os bónus anuais - mesmo que só possam voltar a ser pagos em 2022, quando o plano de reestruturação estiver concluído. Só relativamente a 2019, foram inscritos prémios de dois milhões a pagar à administração executiva liderada por António Ramalho - que o fundo de Resolução se recusou a transferir. A mesma Administração cujos salários tiveram um aumento de 7% no último ano.
Poço sem fundo
As polémicas injeções de capital no Novo Banco por via do Fundo de Resolução representam apenas uma parte do dinheiro que tem sido aplicado no reforço do capital da instituição e que já totalizará 11 250 milhões de euros, desde a sua fundação, em 2014. É o caso das obrigações seniores transferidas pelo Banco de Portugal e da emissão de obrigações subordinadas, com troca de dívida, em 2018.
