Cinco dias bastaram para pôr fim ao centenário BES tal como era. Apesar de nos últimos meses já se sentirem as dificuldades, os prejuízos históricos e as irregularidades reveladas nas contas semestrais foram o golpe de misericórdia na instituição fundada pela família Espírito Santo, há cerca de 150 anos.
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Na noite de quarta-feira, 30 de julho, o rombo já se esperava forte, mas a realidade superou qualquer expectativa: as contas do BES, ainda referentes à gestão de Ricardo Salgado, mostravam 3,6 mil milhões de euros de prejuízos e punham a descoberto uma série de irregularidades financeiras. Mais: o banco fechou junho com um rácio de solvabilidade abaixo do mínimo exigido pelo regulador para funcionar.
Ainda nessa noite tanto o novo presidente do BES, como o Governador do Banco de Portugal garantiram por escrito que o banco ia continuar. Vítor Bento anunciava um aumento de capital imediato e Carlos Costa reiterava que continuavam "reunidas as condições necessárias à continuidade da atividade".
Em cinco dias tudo mudaria. O BES, banco centenário, deixou de existir como tal. Eis o filme dos últimos cinco dias de vida:
Dia 30 de julho, quarta-feira
21.15 HORAS - O BES revela um resultado negativo de 3577,3 milhões de euros entre janeiro e junho de 2014, o maior prejuízo de sempre de um banco em Portugal. As contas evidenciam uma série de problemas e irregularidades financeiros. Além disso, a 30 de junho, de acordo com as contas semestrais apresentadas, o banco tinha um rácio de capital de apenas 5%, abaixo do mínimo exigido para garantir a solvabilidade.
22:31 HORAS - O presidente do BES, Vítor Bento, que substituiu o líder histórico Ricardo Salgado, anuncia em comunicado que "será desencadeado de imediato" um aumento de capital. Garante ainda que, "nas últimas semanas, o banco tem assistido a manifestações de interesse de atuais e potenciais acionistas em participar no Plano de Capitalização, alguns expressando mesmo interesse em tomar participações significativas".
Dia 31 de julho, quinta-feira
00:00 - O Banco de Portugal emite um comunicado em que reitera que "estão reunidas as condições necessárias à continuidade da atividade desenvolvida" pelo BES e garante a "plena proteção dos interesses dos depositantes".
A entidade liderada por Carlos Costa informa ainda que "determinou a realização de um aumento de capital" para reforçar os fundos próprios para níveis "adequados de solvabilidade", acrescentando que é "desejável" que esse reforço de capital seja feito através de investidores privados.
Dá ainda conta que irá apurar responsabilidades, até criminais, dos gestores da equipa de Ricardo Salgado.
08.04 HORAS - A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) informa da suspensão da negociação das ações do BES até às 10 horas.
10.19 HORAS - Pouco depois do regresso à negociação, as ações caem 49,28% para 0,18 euros, num novo mínimo.
16.30 HORAS - A sessão em bolsa termina com uma grande volatilidade do preço dos títulos do BES e um volume de transações muito acima da média diária, que ronda os 37,7 milhões de ações.
Dia 01 de agosto, sexta-feira
08.03 HORAS - As ações do banco arrancam a subir 5,9% face ao fecho do dia anterior, para 0,210 euros.
15.31 HORAS - Os títulos atingem o valor mínimo de sempre ao perderem metade do seu valor para 0,105 euros.
15.51 HORAS - A CMVM suspende a negociação das ações do BES até à divulgação de informação relevante sobre o emitente. Nesse momento, os títulos valiam 0,12 euros.
Mais tarde, foi conhecido que a entidade liderada por Carlos Tavares suspendeu as ações "logo após ter tido conhecimento de iminentes desenvolvimentos que vieram a ser conhecidos durante o fim-de-semana". A CMVM abriu ainda uma investigação para saber se foi usada informação privilegiada na transação de títulos do BES nesta sexta-feira.
Entretanto, o Conselho de Governadores do Banco Central Europeu (BCE) suspende o acesso do BES às operações de política monetária com efeitos a partir desta segunda-feira, 04 de agosto.
20 HORAS - A agência de "rating" canadiana DBRS informa que cortou o "rating" da dívida de longo prazo e dos depósitos do BES de BBB para BB, fora de grau de investimento.
21 HORAS - O primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, garante que o Banco de Portugal vai tomar todas as medidas "necessárias", no âmbito da crise do BES, para garantir a estabilidade financeira do país.
Dia 02 de agosto, sábado
21.30 HORAS - O ex-presidente do PSD Marques Mendes anuncia, no seu comentário semanal na SIC, a solução desenhada para o BES. Segundo o comentador, o banco "vai ser recapitalizado" e "será no valor de 4 mil milhões de euros", numa injeção de capital em que "não há dinheiro do Estado, o dinheiro vem do fundo de resolução".
"Na segunda feira nascerá um novo banco, com o mesmo nome mas com uma estrutura acionista diferente", disse ainda Marques Mendes.
Dia 03 de agosto, domingo
22.50 HORAS - O governador do Banco de Portugal faz a sua primeira declaração ao país em quatro anos de mandato. Em cerca de quinze minutos, Carlos Costa dá conta de como se sente traído pela gestão de Ricardo Salgado e acusa o Grupo Espírito Santo de ter desenvolvido "um esquema de financiamento fraudulento".
O Governador informa que o Banco de Portugal tomou controlo do BES nesse dia e anuncia a separação da instituição num banco mau ("bad bank"), que concentra os ativos e passivos tóxicos, e num "banco bom", a chamar-se Novo Banco, que reúne os ativos e passivos não problemáticos, como será o caso dos depósitos.
Carlos Costa diz que o Novo Banco, que nasce segunda-feira, será capitalizado com 4,9 mil milhões de euros do Fundo de Resolução bancário, sendo que a maior fatia virá de um empréstimo do dinheiro da "troika" a este fundo.