Está fora de questão refrear o investimento na investigação e desenvolvimento de novas moléculas neste momento. Quem o diz é António Portela, CEO da Bial, que, na conferência "O Norte Faz Bem", anunciou que no próximo ano serão investidos 50 milhões de euros em I&D.
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A Bial sabe que o trunfo de uma empresa farmacêutica é estar à frente da concorrência e chegar primeiro ao medicamento que traga a cura para as doenças que ameaçam a vida humana.
Fundada em 1924, a Bial é hoje a única empresa do setor farmacêutico sediada no Norte, com um volume de negócios e uma difusão internacional que a coloca na liderança em Portugal, com 55% da faturação a ser feita no mercado português e o restante da operação internacional em diversos países da América, Europa, África, Ásia e Médio Oriente.
Este sucesso também se explica por uma orientação estratégica definida em meados da década de 80 que veio focar a empresa no desenvolvimento de fármacos na área das doenças neurológicas e das doenças cardiovasculares.
António Portela explica que "ainda há carências enormes na área do sistema nervoso central. É a área em que se sabe menos". Mas explicou também que o envelhecimento da população vai tornar esta área estratégica, uma vez que "vamos ter mais pessoas a serem afetadas e por isso sentíamos que havia nesse campo carências terapêuticas muito grandes, o que também se passa na área cardiovascular".
Aliás, foi precisamente no campo das doenças neurológicas que o investimento em investigação veio a dar frutos importantes. Ao fim de 13 anos de desenvolvimento e depois de gastos 300 milhões de euros em investigação, a empresa conseguiu sintetizar uma molécula que acabou por resultar no Zebenix, um fármaco que já está a ser comercializado em 17 países e que está a contribuir para melhorar a qualidade de vida dos doentes epiléticos.
"A epilepsia é uma doença grave, não só pelos ataques que provoca e que são muito limitadores para os doentes, mas também pela incerteza de quando os ataques acontecem", explica o responsável.
Nesta área, o tratamento comum é feito com medicação assente em antiepiléticos, mas em 30% dos doentes a medicação e terapêuticas tradicionais não surtem qualquer efeito. António explica que a solução desenvolvida pela empresa veio permitir "tratar alguns doentes que não seria possível com outros medicamentos, com uma toma muito simples e sem efeitos secundários, que é uma grande mais-valia."
Entretanto, a senda da internacionalização teve um momento chave em 1998, com a aquisição de uma empresa espanhola que resultou na filial Bial-Aristegui, localizada em Bilbau, que veio permitir incorporar no grupo uma nova área de especialização assente no desenvolvimento de novas vacinas e diagnósticos para o tratamento de alergias, uma área promissora se tivermos em conta que 25 a 30% da população tem alergias.
Neste caso o que a Bial propõe é um conceito de medicina personalizada, que embora pareça futurologia, é já uma realidade. Segundo António Portela, a Bial "faz vacinas à medida de cada doente. Não fazem vacinas para o pólen. Fazem vacinas para o pólen de um doente específico". E acredita que o horizonte de possibilidades não fica por aqui: "Haverá ainda evolução, e cada vez mais rápida, como se tem constatado".
Mas este caminho de investigação e de tentativa e erro não é fácil. Apesar do investimento previsto para o próximo ano, António Portela tem consciência de que este é um investimento a longo prazo. Os tempos da ciência não se coadunam com respostas rápidas e lucros imediatos.
"É um processo muito longo, de muita persistência, trabalho, de altos e baixos. A média que existe hoje na indústria farmacêutica é a de que para um medicamento chegar ao mercado têm de ser sintetizadas entre 7000 a 10 000 novas moléculas. Portanto é um esforço muito grande das nossas equipas e ao nível da motivação é preciso um trabalho muito forte, porque são muitos anos a trabalhar com equipas que têm de estar motivadas para continuar", explica o responsável.
E motivação não pode faltar num processo de investigação complexo e que se arrasta no tempo. A cada nova etapa vencida, "a probabilidade de uma molécula chegar aos mercados é maior. Normalmente, quando se entra nos testes em humanos já há uma probabilidade razoável de poder chegar ao mercado". Ora, apesar das probabilidades nem sempre jogarem a favor das necessidades do mercado, o certo é que dos laboratórios desta farmacêutica já saíram seis novos medicamentos e duas vacinas.
Hoje, o alcance da Bial chega a quase todo o mundo. Tem uma equipa de 878 colaboradores, metade dos quais estão espalhados pelos quatro continentes onde a empresa tem filiais instaladas. Por agora, o objetivo é continuar o processo de internacionalização de mãos dadas com a investigação dentro de portas, sempre com uma certeza em mente: continuar a fazer bem, e sempre a partir do Norte do país.
Quem o admite é o próprio administrador, para quem a deslocalização "está fora de questão. Hoje temos competências concentradas na nossa sede e seria muito difícil pegar nelas e levá-las para outro sítio. As empresas vivem muito das pessoas, (...) temos uma equipa muito forte e com muitas competências. Podemos levar as paredes e as máquinas mas não podemos levar as pessoas todas".