Só em 2019 é que Portugal deve respeitar as novas regras europeias para as contas públicas. Dito de outra forma: o Governo está adiar para 2019, o final da legislatura, a maior redução estrutural do défice, ou seja, a aplicação do maior valor em medidas que cortem de forma permanente a despesa ou subam a receita. Medidas estruturais, portanto.
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De acordo com uma versão preliminar do Programa de Estabilidade (PE) a que o JN/Dinheiro Vivo teve acesso, e que será aprovado em Conselho de Ministros, esta quinta-feira, juntamente com o Programa Nacional de Reformas (PNR), o saldo público estrutural reduz-se este ano o equivalente a 0,3% do Produto Interno Bruto, um valor que é metade do que continua a ser exigido pela Comissão Europeia e os credores europeus, que "recomendam" uma correção de 0,6% desde julho do ano passado.
Em 2017, Portugal prossegue este ajustamento, mas fica sempre aquém do mínimo de 0,5% inscrito no Pacto: corrige 0,4% em 2017, outros 0,4% em 2018 e, finalmente, 0,5% em 2019.
Apesar disso, fonte do Governo refere ao JN que tanto o PE como o PNR "seguem, por um lado, a estratégia do programa de viragem definido no programa de Governo e, por outro lado, cumpre os compromissos assumidos".
Ou seja, o Programa de Reformas "responde exatamente ao diagnóstico da Comissão Europeia e apresenta cerca de 120 medidas que são a resposta exata e concreta perante as recomendações apresentadas" (ver textos em baixo). A mesma fonte explica que o PE "cumpre os nossos compromissos internacionais nomeadamente quanto ao ritmo de redução do défice e da dívida".
É certo que neste novo PE as Finanças prometem que o défice clássico (nominal) caia este ano e, finalmente, fique abaixo dos 3%, evoluindo até um excedente de 0,1% em 2020. O problema é que enquanto um país tiver uma dívida pública acima dos 60%, aplica-se sempre a regra do ajustamento estrutural independentemente de já não violar o teto dos 3%.
Contudo, há um bom indicador neste PE. Se tudo correr como prevê agora o Governo, Portugal pode atingir o "objetivo de médio prazo" em 2019 ao apresentar um défice estrutural de 0,4% (o tratado exige 0,5%). Segundo apurou o JN/Dinheiro Vivo, o Executivo de António Costa já está a usar este argumento para que este PE não seja alvo de críticas mais ferozes dos defensores da disciplina orçamental.
E para tentar obter alguma flexibilização ou tolerância noutras medidas que evitará tomar pela impopularidade (caso de novos aumentos de impostos) ou pela dificuldade em negociar à esquerda (caso de cortes permanentes na despesa). Recorde-se que em janeiro, Bruxelas reagiu violentamente ao facto de o Governo "só" prever um ajustamento estrutural de 0,2% no esboço orçamental.
"Estamos a escrever-lhe para saber as razões pelas quais Portugal planeia uma variação do balanço estrutural em 2016 bem abaixo do ajustamento recomendado pelo Conselho em julho [0,6% do PIB potencial]",dizia a carta enviada às Finanças em que se acenava com um "incumprimento particularmente sério" do Pacto. As divergências seriam sanadas com a inclusão de mais medidas de austeridade no valor de quase 800 milhões, que desceriam o défice nominal de 2,6% para 2,2%.
Em 2016, o Governo conta com uma menor carga de juros face ao que está no OE, mas também com menor carga de impostos diretos e com menos contribuições sociais.
Em 2017, novo corte no défice, que cai para 1,4% o que deve significar um novo aperto orçamental de 1400 milhões de euros que terá de vir, claro, de mais contenção da despesa e de uma receita maior.
* COM ANTÓNIO JOSÉ GOUVEIA