Proposto corte nas pipas de mosto para produção na vindima deste ano. Queda no rendimento pode chegar a 48 milhões de euros em três anos. Viticultores manifestam-se, esta quarta-feira, na Régua.
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A Associação de Empresas de Vinho do Porto (AEVP) defende a redução para 68 mil do número de pipas de mosto a transformar em vinho do Porto na vindima de 2025. A proposta do comércio foi apresentada ao Conselho Interprofissional do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP) e representa menos cerca de 22 milhões de euros a entrar no bolso dos viticultores em relação a 2024. Somado este prejuízo aos registados nas duas campanhas anteriores, pode significar 48 milhões a menos na Região Demarcada do Douro em apenas três anos. Há agricultores a bater a muitas portas para tentarem vender as uvas, depois da recusa do habitual comprador. E, por isso, dezenas de viticultores saem hoje à rua em protesto, na Régua.
Ao JN, o presidente da AEVP, António Filipe, justifica que, desde o ano 2000, a comercialização em volume de vinho do Porto caiu 32%. Ou seja, “um terço do mercado mundial do vinho do Porto desapareceu”. Isto faz com que tenha de haver “consequências nas possibilidades de compra das empresas”. Por um lado, têm “stocks muito elevados” e, por outro, “a falta de capacidade de vendas nunca foi tão elevada”. Daí que as empresas queiram olhar para este problema de uma forma “absolutamente responsável”, pois “criar excedentes seria empobrecer toda a cadeia de valor”, uma vez que a pressão significaria “preços inferiores e stocks excedentários”.
“Estando o negócio como está e tendo as empresas de tomar decisões racionais, seria uma total irresponsabilidade que o benefício fosse marcado em valores significativamente acima das 68 mil pipas”, nota António Filipe. O responsável adverte que as empresas, que constituem AEVP, têm “responsabilidades para com os seus acionistas, para com milhares de colaboradores e para com centenas de fornecedores”.
Benefício não é um subsídio
“Não se trata de vontade, mas sim de possibilidade”, insiste António Filipe. Lembra que “o benefício não é um subsídio. É o resultado de um entendimento entre produção e comércio, baseado na realidade do mercado”. O líder da AEVP defende que, nos últimos quatro anos, construiu-se “um respeito entre as profissões que não tem paralelo no tempo”.
O problema é que o mercado está em contração, “não só o do vinho do Porto como o dos vinhos em geral e em todo o Mundo”. Por isso, rejeita que a associação que lidera seja vista como “uma entidade, que, de uma forma coordenada, pretende a destruição da lavoura duriense. Isso não faz sentido absolutamente nenhum. Nunca fez e muito menos agora”.
A decisão do Conselho Interprofissional do IVDP, onde as duas profissões do Douro têm assento em equilíbrio de forças, vai ser conhecida no dia 18. A proposta da AEVP para reduzir o quantitativo de mosto a destinar à produção de vinho do Porto para 68 mil pipas tem a total oposição da produção, que está a bater-se para que não baixe das 90 mil pipas (550 litros cada uma), aprovadas no ano passado. E, mesmo assim, bem abaixo das 104 mil de 2023 e das 116 mil de 2022.
Tendo em conta que cada pipa de vinho do Porto é paga ao viticultor, em média, a mil euros – preços semelhantes aos do início deste século e com custos de produção incomparavelmente maiores –, a viticultura da Região Demarcada do Douro perdeu 26 milhões de euros na soma das colheitas de 2023 e 2024, prejuízo que pode subir para mais 22 milhões em 2025.
Apesar do contexto de crise acentuada, o presidente da AEVP reconhece que “o setor precisa dos pequenos e médios viticultores que trabalham a vinha e permitem manter a paisagem viva do Douro”, classificada como Património Mundial pela UNESCO desde 2001. “Não queremos que o Douro se transforme num Alentejo com grandes propriedades”, afirma.
“Uva para destilação”
Para minimizar o impacto de mais um ano difícil para a produção, a AEVP apoia a proposta da medida Uva para destilação, aprovada no Conselho Interprofissional do IVDP. Vai permitir que os viticultores possam ter “uma compensação pela previsível perda de rendimento”. A medida determina que o agricultor possa colher uvas que se destinem exclusivamente à destilação, com compensações financeiras diretas. O ministro da Agricultura e Mar, José Manuel Fernandes, disse, ao JN, que está a ser preparado um plano de ações para fazer face à crise no Douro e promete anunciá-lo em breve (ler entrevista ao lado).
Contra o empobrecimento progressivo da Região do Douro, realiza-se, na manhã de hoje, uma manifestação na cidade da Régua, que é promovida pela Confederação Nacional de Agricultura (CNA) e pela filiada Associação dos Viticultores e da Agricultura Familiar Douriense (Avadouriense).