Dos 280 suplementos pagos na Função Pública, não se conhece a base jurídica de 68. Muitos estão previstos em contrato de trabalho ou acordo coletivo. Para os sindicatos, a prioridade é assegurar atualizações salariais e progressões na carreira para os trabalhadores do Estado.
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A revisão dos suplementos pagos no Estado, defendida pelas Finanças em 2013, ficou na gaveta. O Governo de Passos Coelho invocou a proximidade de legislativas para não avançar com uma tabela única de suplementos. E o atual Executivo diz que a matéria não foi considerada prioritária no programa de Governo. Em causa está o pagamento de 700 milhões de euros por ano, em 280 subsídios. Em 68, desconhece-se a base legal para o seu pagamento.
A longa lista de suplementos pagos na Função Pública, revelada pelas Finanças em 2015, mostra que dois suplementos estão entre os que mais vezes são mencionados: um abono para lavar viaturas do Estado e um suplemento de falhas, para quem lida com dinheiro vivo.
A lista divulgada em 2015 inclui outros subsídios, como o de campo, pago aos funcionários da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária que permaneçam no campo por, pelo menos, quatro horas consecutivas, ou a quem trabalha no Laboratório Nacional de Energia e Geologia. Ou um suplemento pago a quem trabalha numa Loja do Cidadão, para compensar pela "especificidade das funções" pelo "regime de horário".
68 sem justificação
Na lista do Ministério das Finanças, a maior parte dos suplementos indica o diploma legal que justifica o seu pagamento, mas muitos foram criados por decisão discricionária da administração do serviço, por acordo coletivo ou por contrato de trabalho.
No caso dos 68 subsídios, não se encontra qualquer justificação para o seu pagamento. Note-se que desde 2014, com a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, só o legislador pode criar novos suplementos.
Sindicatos querem salários
Em fevereiro de 2015, invocando a necessidade de equilibrar as contas públicas, o Governo de Passos Coelho publicou um decreto-lei para enquadrar uma tabela única de suplementos. O diploma mandava rever os subsídios nos 60 dias seguintes, mas tal nunca aconteceu.
No verão desse ano, a proximidade das legislativas foi a justificação dada para remeter as negociações com sindicatos para o governo seguinte. A coligação PSD/CDS venceu as eleições, mas quem formou Governo foi o PS com o apoio da Esquerda. Questionado agora pelo JN, o Ministério das Finanças disse que "esta matéria não foi identificada como prioritária no Programa do Governo", mas sim a "devolução e recuperação de rendimentos e o descongelamento de carreiras".
Agora, insistem os sindicatos, a prioridade deve ser a subida dos salários. Até porque suspeitam que qualquer mexida nos suplementos será feita para diminuir o valor pago aos trabalhadores.
"Não nos conformamos com um acréscimo remuneratório só em 2020", afirmou Helena Rodrigues, do Sindicato de Quadros Técnicos do Estado, insistindo que o importante é assegurar aumentos salariais e progressões na carreira antes da data admitida pelo Governo.
Sindicatos querem mais
Da Frente Comum, Ana Avoila assegura que poucos são os funcionários públicos que recebem suplementos e defende a criação de novos abonos, por exemplo para quem lida com grupos de risco, na Saúde, ou para quem trabalha na recolha e tratamento de resíduos.
José Abraão, da Frente Sindical da Administração Pública, soma a urgência em repor suplementos cortados no tempo da troika e dá o exemplo do subsídio de inspeção: "Os inspetores dos jogos já o recebem por inteiro, mas os da Segurança Social e da Autoridade para as Condições no Trabalho ainda estão à espera de autorização das Finanças."
Lavar carros do Estado
Os motoristas com a incumbência de manter os carros do Estado limpos recebem 43,21 euros por mês. É um dos abonos mais comuns na Função Pública
Abono por falhas
É um subsídio comum, quer no Estado quer em empresas privadas, pago a quem lida com dinheiro vivo, valores, documentos ou títulos. No caso do Estado, equivale a 86,29 euros por mês
Prémio de assiduidade
A Administração da Editorial do Ministério de Educação paga um prémio por assiduidade, mas não é a única: o prémio também é pago no Centro Hospitalar do Alto Ave e na Administração Regional de Saúde do Centro
700
Um estudo de 2013 mostra que os suplementos custam 700 milhões de euros, cerca de 5% da despesa do Estado com pessoal. O valor não inclui gastos como subsídio de alimentação, trabalho extraordinário ou ajudas de custo.