Assinados contratos no valor de 842 milhões de euros no primeiro semestre deste ano. AICCOPN fala em legislação "desajustada".
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Dos 2,671 mil milhões de euros previstos no lançamento de concursos públicos durante o primeiro semestre deste ano, celebrou-se apenas um terço. Ou seja, 842 milhões de euros. Um facto que espelha as dificuldades que as obras públicas enfrentam para serem concretizadas, sendo que as autarquias e a AICCOPN (Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas) apontam a necessidade de alterações legislativas para acelerar os processos. O próprio presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, tem vindo a criticar a situação, exigindo medidas ajustadas ao Governo.
"Uma obra pública, em Gondomar, não demora menos de três anos a começar", atira a Autarquia gondomarense, criticando a excessiva burocracia que, muitas vezes, atrasa o processo "em cerca de seis a nove meses".
A demora do visto do Tribunal de Contas, a falência dos empreiteiros, os vários concursos que ficam desertos e as impugnações judiciais são outros dos entraves à realização célere das obras. O Terminal Intermodal de Campanhã, a requalificação da Ponte Luís I, o Terminal Rodoviário de Vila Real, são alguns dos exemplos de projetos que sofreram com a legislação (ver ao lado).
Entre o lançamento dos concursos e o avançar das obras no terreno passam-se meses e até anos, aumentando o prejuízo para o erário público e, por vezes, colocando em causa o financiamento das empreitadas por fundos europeus. Aliás, metade dos fundos do "Portugal 2020" ainda está por executar.
QUADRO LEGISTATIVO
Tudo isto "é fruto de um quadro legislativo da Contratação Pública que está desajustado da realidade e que se transformou num entrave à concretização dos projetos que o país precisa de implementar", critica Reis Campos, presidente da AICCOPN.
O autarca portuense, Rui Moreira, já em 2017 criticou a lei da contratação pública, considerando que a mesma foi feita "para não se contratar nada" e que, por esse motivo, a Autarquia "pura e simplesmente não consegue realizar obra". O presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, vai mais longe: "Tão importante como os prazos a deslizar são os custos reais com a burocracia a pensar nas contas do Estado".
O pesadelo não faz só parte do dia a dia dos autarcas, mas também de empresas como a Infraestruturas de Portugal e a Metro do Porto, cujas empreitadas, de interesse público, acabam também por ser sucessivamente adiadas.
Porto
Terminal Intermodal de Campanhã
Com o arranque dos trabalhos no ano passado, a concretização do interface de transportes em Campanhã soma cerca de quatro anos de espera. A vontade de executar um projeto há muito desejado pela cidade foi recuperada por Rui Moreira em 2015. O concurso foi lançado um ano depois. Conhecida a proposta vencedora e feita a expropriação dos terrenos necessários, a espera pelo visto do Tribunal de Contas foi o principal motivo do atraso da obra. O autarca afirmou até que o impasse parecia ser "veto político". Isto porque a Autarquia esperou mais de um ano para receber uma luz verde. A previsão para a conclusão do projeto é junho de 2021.
Gaia
Escarpa da Serra do Pilar
A empreitada de requalificação da Escarpa da Serra do Pilar, em Gaia, esteve cerca de dois anos em litigância judicial. Isto porque, explica o presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, "o primeiro classificado no concurso não apresentou a garantia bancária, foi excluído e, mesmo assim, achou-se no direito de impugnar" o procedimento. A contestação acabou por cair por terra. O processo provocou a perda de "três milhões de euros de financiamento comunitário", e atrasou uma obra "de proteção civil".
Matosinhos
Habitação social
De acordo com a Câmara de Matosinhos, as obras nos três conjuntos habitacionais de Carcavelos, do Seixo e da Biquinha foram as que sofreram mais atrasos naquele concelho. Isto porque um dos concorrentes apresentou uma impugnação judicial, explica a Autarquia. A medida obrigou à suspensão imediata da obra. O Município esteve um ano à espera de uma decisão e a adjudicação da obra acabou por ser anulada.
Gondomar
Avenida da Conduta
Em janeiro de 2018, a Câmara de Gondomar aprovou a minuta do contrato a celebrar com a empresa responsável pela beneficiação da Avenida da Conduta, entre a Rotunda da Carvalha e a Rotunda dos Rotários. Os trabalhos ficaram à espera do visto do Tribunal de Contas e previa-se que arrancassem no final da primavera. Mas a obra, no sentido S. Cosme-Fânzeres, só avançou em setembro. Para a requalificação no sentido contrário já foi lançado o concurso público.
Figueira da Foz
Intervenção no porto
Por não ter cumprido as condições de acesso a fundos europeus, a obra no porto da Figueira da Foz ficou adiada por mais um ano. A candidatura ao programa "Compete 2020", apresentada em setembro de 2019 não foi aprovada por falta de "documentação obrigatória a nível ambiental". O ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, garantiu que a obra, com um custo de cerca de 17 milhões de euros, terá financiamento disponível em 2021. Certo é que o adiamento foi recebido com muita preocupação, principalmente pela presidente da Administração do Porto da Figueira da Foz, Fátima Alves. A intervenção no porto permitirá o acesso a navios de maior dimensão, demolição de dois antigos molhes e deposição das areias dragadas nas praias.
Vila Real
Terminal Rodoviário
Por contencioso pré-contratual, a empreitada de execução do Terminal Rodoviário de Vila Real foi a obra que mais atrasos sofreu naquele concelho, de acordo com a Autarquia. A infraestrutura foi inaugurada em 2016, três anos após ter sido aprovado o financiamento de mais de dois milhões de euros pelo programa "O Novo Norte" para a conclusão da obra, que tinha sido suspensa por falência do empreiteiro.
Guimarães
Rotunda de Silvares
A obra do túnel de acesso à A7 e A11 viu o concurso público da empreitada impugnado por um concorrente em outubro do ano passado. Os trabalhos tinham sido adjudicados há poucos meses à construtora vimaranense Cândido José Rodrigues. A construtora bracarense ABB, que ficou em segundo lugar, interpôs uma providência cautelar a contestar o resultado do concurso e impediu o início da obra que, entretanto, arrancou em fevereiro deste ano.
Porto
A Infraestruturas de Portugal prepara-se para lançar um segundo concurso público para a reabilitação do tabuleiro inferior da Ponte Luís I, entre o Porto e Gaia. O primeiro procedimento ficou deserto porque todos os concorrentes apresentaram propostas acima do valor-base de dois milhões de euros. O novo procedimento deverá ser lançado com um valor de 3,8 milhões de euros (quase o dobro).