As empresas que querem recorrer às "linhas de crédito covid-19" debatem-se com obstáculos de monta. Segundo relatos de vários empresários, perante a demora nos empréstimos ou numa resposta em tempo útil para pagar despesas e salários, alguns bancos estão a oferecer créditos comuns, mais caros e que exigem garantias pessoais.
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Por outro lado, são precisos 17 papéis diferentes no circuito entre o banco e a sociedade de garantia mútua, que representa o Estado no processo. Uma burocracia reforçada por uma circular do Banco de Portugal.
"Ainda há um bocado, recebi um telefonema de um empresário que recebeu uma oferta de uma linha de crédito comum por parte do Bankinter, uma vez que a linha do Estado em causa estava já esgotada. Mas temos casos também com a CGD e Santander", refere Jorge Pisco, presidente da Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas (CPPME). Perante este problema e face "aos enormes atrasos no pagamento dos lay-off por parte da Segurança Social", a CPPME solicitou com caráter de urgência uma audiência ao primeiro-ministro. "A desorientação nos ministérios e noutros departamentos governamentais tem levado a que, muitas vezes, os próprios não consigam ajudar a interpretar o que legislaram", sublinhou.
Sociedades de garantia
A burocracia começa quando o empresário se dirige ao banco. Faz o pedido de acesso às linhas covid-19 e a instituição até pode aprová-lo de forma célere, mas ainda assim "há 17 papéis diferentes a preencher", refere Jorge Pisco. O processo segue para uma sociedade de garantia mútua, onde é colocado o "carimbo" do Estado que avaliza o empréstimo. Neste circuito, é possível perder um mês ou mais. Esse foi o caso de Pedro S., sócio-gerente de uma tecnológica na Região Norte, que aguarda desde finais de março luz verde a um crédito de 50 mil euros. A teia burocrática estabeleceu-se, no caso, entre o Novo Banco e a Norgarante, sociedade de garantia mútua. Questionado pelo JN, o Novo Banco garantiu que "não existem problemas significativos com clientes, embora haja pedidos recentes a aguardar reabertura de linhas [de crédito com garantia estatal]".
A SPGM, que é a entidade coordenadora do Sistema Português de Garantia Mútua (inclui a Norgarante), veio ontem esclarecer que registou mais de 43 mil candidaturas apresentadas à Linha de Apoio à Economia Covid-19. "Até ao momento, as operações aprovadas correspondem a um valor de 4,3 mil milhões de euros, 70% da dotação total da linha [6,2 mil milhões]", refere a SPGM em comunicado. O Ministério da Economia, que já referiu pedidos de 9,3 mil milhões, não esclarece se o conjunto das linhas vai saltar dos atuais 6,2 para 13 mil milhões, medida a que Bruxelas deu o aval (ver perguntas & respostas).
"Repare que até o Banco de Portugal emitiu uma circular que agrava a burocracia", refere Jorge Pisco. A referida circular, que também aborda as moratórias nos créditos, foi emitida no dia 25 de abril, e sublinha que os bancos não podem aligeirar a avaliação de risco.