Há contribuintes com reembolsos atrasados mais de 20 dias, sem informação quanto à data em que receberão descontos prometidos nas contas bancárias.
O programa do Governo de incentivo à economia IVAucher não admite inscrições de quem não possui telemóvel, visto que a empresa gestora exige uma validação por esse meio. A SaltPay também não assegura que a solução dos atrasos nos reembolsos - nalguns casos, desde 1 de outubro - inclui recuperar esses valores de há duas semanas.
Nem todos os contribuintes que têm registo de faturas de compras efetuadas entre junho e agosto nos setores de hotelaria, restauração e cultura estão a conseguir aceder ao programa IVAucher. Especialmente os mais velhos ou carenciados: mesmo que pudessem pedir ajuda a familiares ou a funcionários dos Espaço Cidadão para aceder à plataforma online, se não tiverem telemóvel, não conseguem validar a inscrição. A SaltPay exige números únicos para cada utilizador. Assim, nem uma família consegue registar o benefício de vários elementos num só número, nem ativar a conta de um familiar idoso sem telemóvel.
atrasos nos reembolsos
O Ministério das Finanças remete para a SaltPay a responsabilidade da discriminação no acesso ao programa. A empresa respondeu, ao JN, que "a necessidade do telemóvel tem a ver com questões de segurança" e que a validação da adesão tem de ser feita através da "receção de um código único (OTP - One Time Password) como é feito, por exemplo, pelos bancos".
A utilização do IVAucher tem outros requisitos técnicos, como a posse de um cartão bancário. Porém, as contas de serviços mínimos bancários asseguram que qualquer cidadão pode ter um cartão. O mesmo não acontece com os telemóveis, cujo serviço não é universal ou a preço mínimo.
O programa tem tido outros problemas. Os contribuintes que têm reembolsos por receber desde o início de outubro também não têm garantia de ver os valores depositados. A SaltPay remete a questão para o Ministério das Finanças, que apenas diz prever que os prazos de pagamento (48 horas) vão passar a ser cumpridos esta semana.
Algumas plataformas, como a Uber, e alguns bancos, como a Caixa Geral de Depósitos (CGD), têm estado associados à maioria das queixas relativas a reembolsos por processar. A empresa de estafetas remete a responsabilidade nos atrasos para o programa. O banco admite que só começaram a ser feitos reembolsos 15 dias após o início do programa, na passada sexta-feira.
"Todas as transações elegíveis (ocorridas entre os dias 1 e 14 de outubro até às 20 horas) foram tratadas", assegurou fonte da CGD, estimando que, a partir de agora, os créditos serão efetuados "até 48 horas após a realização da transação".
Falta de tempo para adaptar a informática
A operacionalização do programa IVAucher é da responsabilidade da SaltPay, uma fintech que adquiriu a portuguesa Pagaqui. De acordo com o que o JN apurou, junto de diversas fontes bancárias, a adaptação dos sistemas informáticos únicos de cada instituição aos requisitos de uma plataforma externa "não foi planeada em tempo útil" e, por isso, não foi possível arrancar com os reembolsos a 1 de outubro. Cada banco tem sistemas complexos próprios e "já, no ano passado, teve de dedicar equipas inteiras" a adaptar "medidas anunciadas pelo Governo, como as várias moratórias, quase de um dia para o outro", gerando "queixas e insatisfação quando não foi possível no imediato".
667 mil contribuintes registados na plataforma SaltPay para o IVAucher. Já terão recebido mais de 5,5 milhões de euros através de 18 entidades bancárias.
27 mil terminais de pagamento de mais de sete mil comerciantes, aderentes ao programa. Nem todos estão a comunicar com os bancos desde o dia 1.