É muito difícil passar incólume pela sub-região da Beira Baixa. Trazemos muito do território (a alma e o coração cheios, desde logo). Mas há algo que lá deixamos, também (talvez a vontade de regressar em breve). Esta constatação é ainda mais poderosa quando o périplo se faz de mão dada com quem connosco partilha, ou pretende partilhar, a vida. Uma escapadinha a dois é uma flechada no coração.
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ESCAPADINHA A DOIS, PARTE I
O escritor francês Antoine de Saint-Exupéry (autor, entre outros, do famoso livro "O Principezinho") é dono destas palavras: "Amar não é olhar um para o outro, é olhar juntos na mesma direção". Certeira ou não, a frase faz todo o sentido, quando nos sentamos num dos bancos de um dos miradouros da aldeia histórica de Monsanto (Idanha-a-Nova). Os olhos fixam-se no horizonte, estacionado bem para lá da campina que se estende aos nossos pés. Tudo aqui é romântico. Tudo aqui puxa pelo beijo. Tudo aqui sabe melhor se as mãos se entrelaçarem - é isso que elas fazem, espontaneamente.
E, porém, tudo em Monsanto é um gigante paradoxo. Os pedregulhos que se estendem com inusitada prevalência pela aldeia são rudes, às vezes assustadores (a dado passo, começamos a pensar se aquele compromisso entre as fragas que se seguram umas nas outras é mesmo, mesmo seguro...). Há algum charme naquele amontoado de rochas? É o sítio certo para namorar? É. Definitivamente: é.
Vaguear pelas ruas e ruelas estreitas e ziguezagueantes de Monsanto, entabulando conversa com a história e a natureza, é, na verdade, enternecedor. Acresce que, como somos obrigados a parar pela enormidade dos fraguedos, ou a entrar nas fendas labirínticas que sob eles nasceram, cresce exponencialmente a possibilidade de cravarmos mais um beijo nos lábios do(a) parceiro(a).
À noite é que é
Passa-se uma manhã (ou uma tarde) namoradeira em Monsanto, tanto é que o há para ver: o castelo, as capelas, as casas de Zeca Afonso e Fernando Namora, a cidadela, a cisterna, as duas igrejas, os penedos mais impressionantes (Penedo do Pé Calvo e Penedos Juntos), a Torre do Lucano encimada por um galo de Barcelos, símbolo do galardão "A Aldeias Mais Portuguesa de Portugal... Verdadeiramente apaixonante, porém, é fazer o percurso dos penedos à noite, com o céu estrelado e a ajuda de uma lanterna. Aí, sim, o amor está no ar.
Neste território, há uma imensidão de sítios para proferir declarações de amor. Mas Penha Garcia, ainda em Idanha-a-Nova, tem um encanto, como dizer?, suplementar. A simbologia do que temos à volta talvez ajude a explicar por quê.
Brinde! Brinde ao amor
São 111 degraus até alcançarmos o Castelo - tarefa dura, como dura é a tarefa de construir uma relação séria e à séria. Lá chegados, olha-se a acalmia da albufeira que a barragem sustenta. Mas, logo de seguida, somos confrontados com a tremenda paisagem quartzítica que as forças tectónicas e a água moldaram ao longo de milhões de anos. A descida a pique anuncia belos moinhos: contudo, é preciso fazê-la. E, a meio do trajeto, bancos de madeira piscam o olho a uma paragem para descanso. Dali já se vê uma cascata deliciosa a servir uma espécie de piscina natural onde se banha uma família inteira. Eis a montanha-russa de emoções que nos permite estabelecer um paralelismo com o curso da vida. Se for esse o caso, as juras de amor devem ser juradas nos aludidos banquinhos de madeira. Dali a vista é deslumbrante. Vai mais um beijinho?
Nada ficará devidamente completo sem a visita a um dos restaurantes da zona. De estômago vazio as palavras costumam sair com membros brilho. Veja as possibilidades aqui.
Aviso: caso goste de vinho, não se atreva a conjugar as refeições com outra coisa que não sejam tintos ou brancos da região. São fantásticos - e têm uma relação qualidade/preço difícil de encontrar no mercado.
E, claro, se quiser entremear a paixão com a aventura também não falta o que fazer. Basta ir aqui para avaliar a adrenalina que está disposto a empregar nas experiências disponíveis.
ESCAPADINHA A DOIS, PARTE II
Impõe-se regressar ao autor de "O Principezinho", no segundo dia da escapadinha. "Amar não é olhar um para o outro, é olhar juntos na mesma direção", lembra-se? Pois no Miradouro das Portas de Almourão (Proença-a-Nova), que mostra as ditas cujas, há dois notáveis picos quartzíticos, um em cada lado do rio Ocreza, que as linhas de água conseguiram rasgar. Não é abuso dizer: olhando na mesma direção, como propõe Saint- Exupéry, neste presente carregado de passado pode mirar-se o futuro, porque nele haverá momentos em que a união terá que fazer a força. Entrelacem-se as mãos, novamente. E faça-se a caminhada à cata dos segredos do Vale do Almourão: o olhar perder-se-á numa das mais belas paisagens da sub-região.
Bailam as aves
Daqui a Vila Velha de Ródão é um pulinho (as estradas são boas). A comunidade de grifos (a maior do País, de acordo com os especialistas) que aqui namora e nidifica há de abençoar a visita. Para ir e estacionar um pouco para lá das Portas de Ródão, monumento natural desde 2009, há barcos de recreios disponíveis. Acredite: vale a pena ir, mais ainda com boa companhia.
Se o que viu até aqui o deixou várias vezes sem capacidade de verbalizar o que tinha pela frente, dispense atenção às paredes íngremes que o rio roubou à solidez das rochas (são 170 metros de altura!). O Tejo corre encaixado entre escarpas quartzíticas das serras das Talhadas e do Perdigão. São estas margens que albergam as mais antigas comunidades humanas de que há memória na Península Ibérica.
Volte a olhar os céus deste paraíso. Algumas das 116 espécie de aves identificadas neste local, algumas delas em vias de extinção e outras raras, hão de andar a perscrutar o solo. Com sorte, as lontras aparecerão também para cumprimentar os forasteiros. Idílico, não é?
Passar pelos passadiços
Ainda há tempo para percorrer, pelo menos, parte dos fantásticos Passadiços do Orvalho, em Oleiros. A paisagem, que se estende por nove quilómetros (só dois deles têm passadiços, o que permite ao viajante andar em trilhos mais exigentes que dão acesso a locais naturais verdadeiramente únicos) é esmagadora. De entre os geomonumentos classificados pela UNESCO, destacam-se o Cabeço do Mosqueiro, a 660 metros de altitude, e a insuperável Cascata da Fraga de Água D"Alta: 50 metros de desnível vencidos por uma sucessão de três véus de água que podem - e devem - ser vistos de perto. Tocar a água límpida e fresca desta maravilha é uma bênção. Abençoados sejam os casais que o fizerem durante esta escapadinha.
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