O novo guião da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento já está em consulta pública e traz novidades que estão a originar contestação. O Governo retirou a sexualidade e a saúde sexual das matérias que devem ser obrigatoriamente abordadas e colocou a literacia financeira no topo das prioridades. Saiba mais aqui.
Corpo do artigo
Os conteúdos sobre sexualidade vão desaparecer do currículo dos alunos?
O novo guião de Cidadania e Desenvolvimento, que está plasmado na nova Estratégia Nacional para a Educação para a Cidadania, retirou das aprendizagens essenciais da disciplina matérias relacionadas com a sexualidade e o bem-estar animal.
Os temas como abusos sexuais, violência de género, bem como violência contra pessoas com orientação sexual e identidade e expressão de género não normativas só são mencionados nas aprendizagens essenciais para o terceiro ciclo, no capítulo dos direitos humanos.
Estas alterações são novas?
No programa do Governo está vincada a intenção do Executivo "rever as aprendizagens essenciais de todas as disciplinas", nomeadamente a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento e no âmbito do desporto escolar. Luís Montenegro também já tinha prometido, em outubro do ano passado, "libertar [a disciplina de Cidadania] das amarras dos projetos ideológicos".
Contudo, o ministro da Educação, Fernando Alexandre, também tinha assegurado que não ia mexer nos 17 temas lecionados na disciplina.
O que está na origem destas mudanças?
As críticas feitas à disciplina de Cidadania, sobretudo por parte dos setores mais conservadores, começaram em 2020 quando os pais de dois alunos de Famalicão impediram os filhos de frequentar as aulas de Educação para a Cidadania. Na altura, sugeriam que a educação para a cidadania é uma competência dos pais e realçaram que temas como "Educação para a igualdade de género" e "Educação para a saúde e sexualidade" causavam-lhes preocupação e repúdio.
O CDS, que faz parte do Governo da AD, já tinha defendido que a disciplina fosse de frequência facultativa e o Chega apresentou uma proposta nesse sentido na última legislatura.
E quem é que está contra o novo programa para a disciplina?
Da Esquerda à sociedade civil, são várias as vozes que criticam a sujeição dos temas sobre sexualidade para segundo plano no currículo dos alunos. Mariana Vieira da Silva, do PS, considera que se trata de um "recuo de décadas na valorização dos direitos humanos, da educação das nossas crianças e da educação sexual".
Mariana Mortágua, deputada única do BE, argumenta que a "educação sexual é essencial para prevenir o abuso sexual de menores, a educação sexual é essencial para respeitar os direitos das crianças". E a líder parlamentar do PCP, Paula Santos, diz que as alterações revelam "as conceções políticas e ideológicas do PSD e do CDS".
Várias figuras públicas e especialistas também manifestaram-se contra o novo guião da disciplina nos últimos dias. Ao JN, Margarida Gaspar Matos, psicóloga clínica, refere que os "estudos confirmam que a informação leva os jovens a começar a sua vida sexual mais tarde e mais protegidos".
O que dizem os diretores das escolas e os pais?
O presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, Filinto Lima, fala numa "opção mais política do que pedagógica" e realça que as escolas não foram ouvidas na tomada da decisão. A Associação de Mães e Pais pela Liberdade de Orientação Sexual e Identidade de Género diz que o assunto é "desconfortável para este Governo", mas não é por isso que "deve deixar de ser tratado".
A Confederação Nacional das Associações de Pais já pediu ao Governo a clarificação sobre os novos conteúdos da disciplina. Já a Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo afirma que as alterações não têm impacto e defendem a "liberdade de escolha" na educação dos alunos.
Mas, afinal, que temas são abordados nas aulas de Cidadania sobre sexualidade?
A disciplina de Educação para a Cidadania e Desenvolvimento passou a fazer parte do currículo nacional do Ensino Básico e Secundário em 2017. Do lote de matérias faz parte: a Educação Rodoviária, Igualdade de Género, Direitos Humanos, Educação Financeira, Segurança, Defesa Nacional, entre outros.
No caso específico da Educação para a Saúde e a Sexualidade, o objetivo da disciplina é "dotar as crianças e os jovens de conhecimentos, atitudes e valores que os ajudem a fazer opções e a tomar decisões adequadas à sua saúde e ao seu bem-estar físico, social e mental", lê-se no documento publicado pela Direção-Geral da Educação que explica as linhas orientadoras da disciplina.
Posso participar na consulta pública que quer alterar os conteúdos da disciplina?
Sim. Estão abertos os dois procedimentos Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania (ENEC) e Aprendizagens Essenciais de Cidadania e Desenvolvimento. Para participar nas duas consultas públicas, deverá responder em que papel se apresenta, deixar contactos e identificação e responder a cada ponto dos diplomas. Pode saber mais aqui.