Ricardo Araújo Pereira, o humor e a morte: "Gente boazinha não tem piada nenhuma"

1º Congresso Internacional "A Morte: leituras da humana condição"
Miguel Pereira/Global Imagens
Ricardo Araújo Pereira foi a estrela do primeiro congresso sobre a morte e diz que sem esta, o humor não podia existir.
O humorista Ricardo Araújo Pereira abordou a relação entre a morte e o humor, esta quinta-feira, em Guimarães, a propósito do primeiro congresso internacional sobre a morte, organizado pelo Instituto de Estudos Avançados em Catolicismo & Globalização.
Tendo em conta o nome da entidade organizadora, já se sabia que era um risco convidar um humorista que não acredita em Deus e faz questão de o frisar por onde passa. Fê-lo, logo no início do painel em que participou. "Para mim, que sou ateu, quando morremos vamos para o sítio onde estávamos antes de nascermos. E isso até nem é mau, pelo menos não tenho más recordações desses tempos", ironizou.
Numa palestra marcada pela boa disposição, Ricardo Araújo Pereira também falou a sério ao dizer que a morte é um dos motivos pelos quais existe humor, dada a necessidade que o ser humano tem de superar a finitude da vida, vivendo-a num espírito mais leve, pois "se o medo da morte não existe, é muito improvável que o riso sirva para alguma coisa".
O humorista considera que só há comédia quando existem problemas, até porque "gente boazinha não tem piada nenhuma". E completa: "Se está tudo bem, há uma vida perfeita e não sei quê, não tem comédia, não existe. A não ser que a pessoa seja tão boazinha que dê o dinheiro todo aos pobres e fique pobre, isso já tem graça. Lixou-se e já é engraçado, porque enquanto está tudo bem não há razão para rir".
Histórias sérias
A brincar com um assunto sério, arrancando gargalhadas rasgadas do público, o humorista deambulou sempre entre religião, morte e humor, muitas vezes contando histórias como a de São Lourenço, cujas últimas palavras antes de ser assassinado, queimado numa fogueira, foram: "Virem-me, que já estou bem assado deste lado".
Ricardo explicou ainda que o humor tira peso às coisas, daí que seja normal haver gente que conta uma anedota num funeral, ou o epitáfio que Raul Solnado queria: "Aqui jaz Raul Solnado, mas muito contra a sua vontade".
Esse peso que o humor tira às coisas fica comprovado com a participação do humorista, que foi nitidamente destoante, num congresso onde se fala a sério da morte, sob o ponto de vista jornalístico, económico, filosófico, educativo ou literário.
