Agricultura mais inteligente: agricultores trabalham com a natureza para reduzir pesticidas

Foto: Soo Ann Woon/Pexels
Com o apoio de investigadores financiados pela União Europeia (UE), os agricultores de toda a Europa estão a adotar uma gestão de pragas mais inteligente e mais bem integrada, que protege as culturas e reduz o uso de produtos químicos, sem diminuir os lucros.
Na ensolarada Tourinha, uma pequena cidade a norte de Lisboa, o agricultor Bruno Neves caminha orgulhosamente pelos seus campos e estufas repletas de alface e pepinos. Na época do Natal, também haverá a tradicional couve de Natal portuguesa. Joaninhas, moscas-das-flores e outros insetos zumbem pelo ar, pequenos aliados na sua missão de produzir colheitas saudáveis.
"Eu crio boas condições para os insetos viverem na minha quinta", disse Neves, que trabalha arduamente para limitar o uso de pesticidas químicos. "Não podemos lutar contra a natureza, devemos vê-la como nossa amiga".
A natureza em primeiro lugar
A sua abordagem reflete a essência de um método de agricultura conhecido como gestão integrada de pragas, ou GIP (IPM na sigla em inglês). Ela oferece uma maneira inteligente e ecológica de proteger as culturas, trabalhando com processos naturais em vez de depender principalmente de produtos químicos.
A GIP combina técnicas como a rotação de culturas e variedades resistentes a pragas. Também recorre a controlos biológicos, como joaninhas, vespas parasitas e fungos benéficos, para manter as pragas sob controlo.
É importante ressaltar que os pesticidas não são totalmente proibidos, mas são usados com a maior moderação possível e de forma a minimizar os riscos para a saúde humana, organismos benéficos, como abelhas, joaninhas ou fungos que protegem as plantas de patógenos e, claro, para o meio ambiente.
Bruno Neves é um dos muitos agricultores na Europa que têm vindo a experimentar a GIP no âmbito de uma iniciativa financiada pela UE denominada IPMWORKS, que decorreu entre 2020 e abril de 2025.
"O objetivo do IPMWORKS é conseguir culturas saudáveis e gerir doenças, ervas daninhas e pragas, reduzindo simultaneamente o uso de pesticidas", afirmou Nicolas Munier-Jolain, do Instituto Nacional de Investigação para a Agricultura, Alimentação e Ambiente de França, que coordena a equipa de investigação do IPMWORKS.
Riscos dos pesticidas
Os pesticidas químicos continuam a ser uma importante fonte de poluição, contaminando o solo, a água e o ar, prejudicando a biodiversidade e criando pragas resistentes. Também representam riscos para a saúde humana, com a exposição associada a doenças crónicas, como cancro, doenças cardíacas, respiratórias e neurológicas.
Embora a GIP se tenha tornado obrigatória na UE em 2014, a sua adoção tem sido lenta. A maioria dos agricultores ainda depende fortemente dos pesticidas. A IPMWORKS decidiu mudar essa situação, criando uma rede de agricultores pioneiros como Bruno Neves.
"Nunca gostei de pesticidas", afirmou Bruno Neves, que aplica a GIP desde que assumiu a gestão da quinta da família em 2011. "Não queria usá-los por questões de saúde, mas também porque acredito que, se podemos fazer melhor, devemos fazê-lo."
A sua persistência está a dar frutos. "Muitos agricultores não acreditam em mim, mas no ano passado só pulverizei três ou quatro vezes", disse. "Algumas explorações agrícolas pulverizam até duas vezes por semana."
Aprender uns com os outros
"A rede IPMWORKS deu um apoio valioso na procura de alternativas eficazes aos pesticidas", afirmou.
"Foi ótimo ligar-me com agricultores que pensam da mesma forma e têm os mesmos objetivos e desafios. Ter a oportunidade de partilhar as minhas experiências e aprender com os outros deu-me força para continuar, mesmo quando não foi fácil."
Um dos grandes sucessos da iniciativa foi a criação de centros de agricultores. São redes peer-to-peer lideradas por formadores especializados, como Jolien Claerbout, uma investigadora agrícola belga da Inagro, uma consultoria agrícola, que trabalhou com agricultores na Flandres.
"O papel dos formadores centrais foi crucial", afirmou Claerbout. "Primeiro, precisávamos que os agricultores confiassem em nós e uns nos outros. Então, poderíamos partilhar ideias e soluções práticas."
Esses centros tornaram-se espaços para os agricultores trocarem experiências e encontrarem alternativas em conjunto. "Caso contrário, com tanto trabalho nas suas quintas, talvez nunca tivessem tempo para isso", afirmou.
Igualmente lucrativo
Funcionou? Sim, e não apenas para o ambiente. Os agricultores também têm a ganhar com isso.
"Demonstramos que a GIP holística é rentável e oferece um melhor controlo de pragas", afirmou Munier-Jolain. "Isso reduz a dependência de pesticidas caros, muitas vezes sem qualquer perda de lucros." A equipa de investigação também produziu módulos de formação e uma Caixa de Ferramentas de Recursos de GIP online para ajudar os agricultores a adotar métodos sustentáveis.
Munier-Jolain observou, no entanto, que muitos agricultores ainda hesitam. Mais incentivos financeiros poderiam ajudar, assim como uma mudança de percepção, disse ele.
"Devemos tentar apresentar a GIP como uma oportunidade económica, não como uma restrição para os agricultores."
Segundo Bruno Neves, o medo também desempenha um papel importante. "O maior desafio é a mentalidade", afirmou. "Muitos agricultores temem que as suas colheitas percam valor. Eles precisam acreditar que é possível."
Impacto mais amplo
Embora não existam números exatos disponíveis, os dados da UE sugerem que existe um enorme potencial para expandir a GIP. De acordo com Munier-Jolain, a sua expansão poderia trazer grandes benefícios tanto para a sociedade como para o ambiente.
"Se todos os agricultores europeus adotassem a GIP holística, poderíamos ter como objetivo realista, uma redução de 50% no uso de pesticidas, sem qualquer diminuição real na segurança alimentar", disse Munier-Jolain. Isso significaria água mais limpa, solos mais saudáveis e um grande impulso para a biodiversidade.
Para Bruno Neves, esta visão motiva-o. "Como agricultor, não produzo apenas alimentos, também protejo o ambiente. Quero que os meus filhos olhem para esta terra daqui a 40 anos e vejam que o pai deles ajudou a protegê-la, não a destruí-la."
Não se trata apenas de usar menos pesticidas. Trata-se de repensar a agricultura para que as pessoas, os lucros e o planeta saiam a ganhar. O desafio agora é ampliar esses sucessos, porque um futuro mais verde para a agricultura depende disso.
Este artigo foi originalmente publicado na Horizon, a Revista de Investigação e Inovação da UE.
