Drones com capacidade para transportar 350 quilos prestes a descolar para entregas na Europa
Os drones podem tornar o transporte aéreo mais barato e melhorar a ligação a zonas remotas. Mas será fundamental monitorizá-los.
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Quando os irmãos Svilen e Konstantin Rangelov criaram uma pequena start-up chamada Dronamics na sua Bulgária natal, em 2014, a sua ambição era democratizar as entregas de carga na Europa e tornar a entrega de encomendas no dia seguinte uma realidade, a preços acessíveis, mesmo nas regiões mais remotas.
Acesso remoto
Tinham detetado um importante ponto de bloqueio no sistema de comércio global: a ausência de um transporte de carga rápido e fiável para as partes menos acessíveis do mundo. Esta era uma lacuna que acreditavam que a entrega de carga por drones poderia preencher.
"O nosso objetivo era construir um avião de carga da próxima geração para ajudar a acelerar o comércio e permitir entregas no mesmo dia para todos e em todo o lado", afirmou Konstantin Rangelov, um engenheiro aeroespacial com grande interesse em drones.
Graças ao financiamento da UE, os irmãos Rangelov aceleraram a sua visão e, em 2022, criaram a primeira companhia aérea de drones de carga totalmente licenciada da Europa.
No ano passado, foram-lhes atribuídos oficialmente códigos designadores da IATA e da ICAO, os dois principais organismos internacionais de aviação, que lhes conferem um reconhecimento equivalente ao das outras companhias aéreas internacionais.
A Europa tem mais de dois mil aeroportos, mas menos de 1% desses aeroportos recebem aviões de carga. Atualmente, a carga é transportada principalmente para grandes aeroportos que podem receber aviões jumbo.
Segundo Rangelov, trata-se de uma grande oportunidade perdida, que os drones podem resolver.
"Se conseguíssemos ligar aeroportos mais pequenos e entregar encomendas nesses locais, seria uma vantagem para o desenvolvimento económico das regiões menos bem ligadas", afirmou.
Entrega autónoma de carga
A empresa combinou avanços em autonomia, aerodinâmica e produção para fornecer uma solução de entrega de carga completamente nova. Em maio de 2023, a Dronamics fez história quando o seu primeiro drone de carga à escala real, o Black Swan, completou com sucesso o seu primeiro voo.
A aeronave não tripulada de asa fixa pode transportar 350 quilos de carga, o mesmo que uma pequena carrinha de entregas, e tem um alcance de 2 500 quilómetros, o suficiente para ligar a maior parte da Europa. Pode também aterrar nos aeroportos mais pequenos que se possa imaginar, necessitando apenas de 400 metros de pista.
"Se quiséssemos, podíamos até aterrar num parque de estacionamento", disse Rangelov.
Os primeiros portos de drones serão construídos no Mediterrâneo, com planos de expansão para toda a UE para servir comunidades remotas ou mal servidas.
Mobilidade sustentável
Mas porque é que precisamos de drones de carga? Não podemos simplesmente utilizar os pequenos aviões pilotados existentes, como até aqui? Segundo Svilen Rangelov, essa opção é demasiado dispendiosa.
"Os aviões pilotados são muito mais caros", afirmou o diretor-geral búlgaro. "Num avião pequeno, o piloto representa um terço do peso transportado. É muito espaço de carga que se perde. Além disso, existe atualmente uma escassez de pilotos".
As poupanças são substanciais. A Dronamics poderá efetuar entregas internacionais no mesmo dia por um custo até 50% inferior ao do transporte aéreo tradicional, com emissões de CO2 até 60% inferiores.
Os seus drones podem funcionar com combustíveis normais e biocombustíveis, e a empresa está a trabalhar no sentido de construir uma versão movida a hidrogénio. De acordo com os engenheiros, os drones são também mais baratos de produzir e operar do que os meios agora disponíveis.
O objetivo da empresa a médio prazo é operar a sua frota de drones a partir do centro de operações global em Malta, utilizando uma rede de portos de drones em toda a Europa e não só. Embora nos últimos anos se tenha dado alguma atenção à utilização de drones para a entrega de encomendas no último quilómetro, Rangelov afirmou que esta não é a prioridade.
"O problema da entrega de carga não é o último quilómetro. Trata-se de fazer chegar as encomendas a locais com menos ligações", afirmou.
Tendo em vista a sustentabilidade, a Dronamics faz também parte de um grupo selecionado de empresas que participam num grupo de trabalho europeu para a mobilidade do futuro que aconselha a UE sobre a sua Estratégia de Mobilidade Sustentável e Inteligente, que estabelece a forma como o sistema de transportes da UE pode alcançar uma transformação ecológica e digital.
Segurança em primeiro lugar
Até à data, um dos aspetos que tem impedido a comercialização generalizada das entregas de encomendas por drones é a preocupação com a segurança. O nosso espaço aéreo de nível muito baixo poderá em breve ficar muito sobrecarregado e a localização dos drones tem de ser rigorosa para evitar colisões, mas também por razões legais.
Esta é uma preocupação de Alberto Mennella, gestor de inovação da TopView, uma empresa italiana de engenharia de sistemas de aeronaves não tripuladas, especializada na integração de drones em atividades comerciais no espaço aéreo de nível muito baixo. A TopView está a liderar uma iniciativa de investigação internacional denominada CERTIFLIGHT, que desenvolveu um dispositivo que pode rastrear com segurança a localização de um drone, através de um satélite. Esta informação será partilhada com aeronaves próximas, bem como com as autoridades e os clientes dos operadores de drones.
Financiado pela UE, o consórcio CERTIFLIGHT envolve parceiros comerciais e de investigação na Bélgica, Chéquia, Itália, Países Baixos, Roménia e Espanha, e estará concluído em abril de 2025.
Recibo de entrega
Para além da segurança, a equipa de investigação da CERTIFLIGHT também se preocupa em garantir uma entrega segura.
"Se vamos ter drones a entregar encomendas, queremos uma garantia legal de que as encomendas são entregues corretamente", disse Mennella, que fez da sua paixão pelos drones uma carreira.
Para que a entrega por drone funcione, é necessário saber a localização exata do local de aterragem, o que pode provar que a carga foi entregue no sítio certo. Mas haverá malfeitores que tentarão manipular os dados de localização para intercetar as entregas, utilizando uma técnica chamada "spoofing" (mistificação da entidade).
A CERTIFLIGHT utiliza a autenticação de mensagens de navegação do serviço aberto Galileo (OSNMA) da UE para atenuar os riscos de spoofing e interferências e fornecer autenticação da localização e dos tempos.
"Trabalhámos nos laboratórios do Centro Comum de Investigação da UE, em Itália", disse Mennella. "Ali temos equipamentos que geram padrões de spoofing. Ao praticar com deles, o nosso software aprende a reconhecer quando ocorre uma mistificação da entidade".
No final deste ano, a CERTIFLIGHT vai levar a sua tecnologia para fora do laboratório, com testes de voo previstos para outubro, onde acompanharão os voos dos drones. Se forem bem sucedidos, fabricantes ou operadores poderão passar ao próximo passo com a utilização da tecnologia CERTIFLIGHT nos drones.
Desobstruir as cadeias de abastecimento
Entretanto, a Dronamics está a preparar-se para o lançamento de operações comerciais. Esperam começar na Grécia, ligando a capital Atenas a zonas remotas do norte do país e a algumas ilhas do mar Egeu.
Entretanto, estão também a trabalhar em planos para aumentar a sua produção, com instalações que poderão produzir 300 destes drones por ano - uma expansão que também está a ser apoiada pela UE.
A intenção é expandir rapidamente as operações no Mediterrâneo e na Europa, com clientes nos sectores do comércio eletrónico, encomendas postais e correio, produtos perecíveis, produtos farmacêuticos e peças sobresselentes.
A Dronamics está também de olho nas economias emergentes. Rangelov acredita que a melhoria das cadeias de abastecimento pode criar condições para um grande crescimento económico em regiões como África.
"A investigação mostra que as cadeias de abastecimento têm um impacto enorme no desenvolvimento económico, muito mais do que, por exemplo, a ajuda ao desenvolvimento", afirmou. "É como desobstruir as veias e artérias da economia de um país. Os nossos drones vão-lhes permitir fazer isso".
Este artigo foi originalmente publicado na Horizon, a Revista de Investigação e Inovação da UE.