A 34ª edição anual de um concurso da UE para investigadores adolescentes terminou na semana passada com participantes do Canadá, Dinamarca, Polónia e Portugal a conquistarem o prémio principal.
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Inês Alves Cerqueira, portuguesa, passou cinco dias em Bruxelas e saiu de lá com um dos principais prémios da UE para jovens cientistas.
Mas se perguntar a Inês Cerqueira, de 17 anos, o que mais recorda do evento, que contou com 136 concorrentes de três dezenas de países da Europa e não só, o tão cobiçado prémio quase não é mencionado.
Sem preocupações
"Adorei ouvir todos os projetos e ter conversas sobre ciência sem ter de me preocupar com o facto de as pessoas me julgarem ou algo do género", disse a jovem cientista no final da 34ª edição anual do Concurso Europeu para Jovens Cientistas (EUCYS) na capital belga.
Preocupados ou não, Inês Cerqueira e os outros concorrentes, com idades compreendidas entre os 14 e os 20 anos, foram avaliados por um júri de 22 cientistas e engenheiros de renome de toda a Europa, no âmbito do concurso oficial. O concurso contou com 85 projetos científicos que concorreram ao primeiro, segundo e terceiro prémios e que partilharam um total de 62 000 euros em prémios monetários.
As recompensas incluem também bolsas de estudo e visitas a instituições como a Agência Espacial Europeia, a organização de investigação nuclear CERN, e um fórum que reúne oito dos maiores organismos de investigação da Europa.
Todos os participantes já tinham ganho primeiros prémios em concursos científicos nacionais. No EUCYS, quatro projetos ganharam o prémio principal e receberam 7 000 euros cada.
Inês Cerqueira ganhou o seu com dois colegas de equipa: Afonso Jorge Soares Nunes e Mário Covas Onofre. Os três portugueses, oriundos da cidade do Porto, estão a explorar o potencial da seda de aranha para tratar doenças ósseas, incluindo a osteoporose.
Os projetos EUCYS, que abrangeram das ciência dos foguetões, aos medicamentos para as dores crónicas, à demografia climática e à poluição dos rios, eram tão variados como as origens dos participantes, de lugares tão distantes como o Canadá e a Coreia do Sul.
A canadiana Elizabeth Chen foi outra das vencedoras do primeiro prémio com um projeto de uma terapia contra o cancro. Os outros dois primeiros classificados foram Maksymilian Gozdur, da Polónia, com um trabalho sobre instituições judiciais, e Martin Stengaard Sørensen, da Dinamarca, com uma iniciativa sobre sistemas de propulsão de foguetões.
Mentes brilhantes
"O objetivo da EUCYS é recompensar o entusiasmo, a paixão e a curiosidade da próxima geração de mentes brilhantes da Europa que procuram novas soluções para os nossos desafios mais
prementes", afirmou Marc Lemaître, Diretor-Geral da Investigação e Inovação da Comissão Europeia.
O entusiasmo e o espírito de iniciativa foram uma constante no evento. A camaradagem também.
Noemi Marianna Pia, Pietro Ciceri e Davide Lolla, todos italianos de 17 anos, disseram que se sentiam vencedores por terem conseguido um lugar na EUCYS para um projeto sobre alimentação sustentável e descreveram o evento como uma oportunidade única de se misturarem com jovens cientistas de todo o mundo.
Os três italianos querem desenvolver alternativas às proteínas animais à base de plantas. No seu stand de exposição, falaram com um entusiasmo contagiante sobre a sua investigação enquanto seguravam grão-de-bico e soja secos.
Lolla afirma que, apesar de gostar de comer um bife suculento, sente uma necessidade premente de reduzir o consumo de carne para combater as alterações climáticas e preservar a biodiversidade.
Ideias cintilantes
Do outro lado do recinto, Eleni Makri, cipriota de 16 anos, recordou como uma conversa na sala de aula sobre os planos para o verão lhe deu a ideia de utilizar as ervas marinhas existentes em muitas das praias da ilha para produzir fertilizantes.
O seu parceiro de projeto, Themis Themistocleous, juntou-se avidamente à conversa para explicar como as ervas marinhas podem recuperar o fosfato das águas residuais. O processo envolve o tratamento térmico das ervas marinhas.
Themistocleous também se mostrou orgulhoso por ter sido escolhido por Makri como o seu colega de equipa na competição.
"Havia mil pessoas, mas ela escolheu-me a mim!", disse com um sorriso largo, enquanto Makri abanava a cabeça em resposta.
A ciência pode também ser o resultado de uma parceria e não o seu gatilho. Metka Supej e Brina Poropat, da Eslovénia, foram aproximadas pelo desporto, em particular pelo remo.
Após anos de treino na mesma equipa, decidiram investigar o impacto das bebidas energéticas na recuperação do ritmo cardíaco.
Múltiplos caminhos
Ao aplaudirem-se uns aos outros enquanto se preparavam para se despedir, os participantes do EUCYS 2023 deram uma ideia da combinação de qualidades - pessoais, intelectuais, sociais e até profissionais - que transformam os jovens em investigadores pioneiros.
Gozdur, o polaco vencedor do primeiro prémio, descobriu a sua paixão pelas questões judiciais quando trabalhava num escritório de advogados. Antes disso, queria estudar medicina e chegou mesmo a aventurar-se na indústria cinematográfica.
O seu projeto EUCYS baseou-se nos códigos de processo penal francês e polaco para analisar as perspectivas da "justiça reparadora", cujo elemento central é a reabilitação do condenado. A conclusão a que se chegou foi que "o populismo penal não é benéfico para nenhuma das partes, especialmente para a vítima", segundo uma descrição.
Atualmente com 19 anos, a estudar direito em Varsóvia, Gozdur afirmou que gostaria que as instituições internacionais aceitassem o seu trabalho para que, no futuro, este influencie as normas jurídicas "da vida real".
"O EUCYS mostrou-me que a minha ideia é realmente relevante e que pode ajudar as sociedades", afirmou. "Gostaria de lutar mais pelo meu projeto".
Para Sørensen, o dinamarquês que recebeu o primeiro prémio, aventurar-se na ciência dos foguetões quando era adolescente não foi uma surpresa. Oriundo da cidade de Odense, começou a programar computadores aos 10 anos e foi inspirado pelo seu pai - um engenheiro eletrotécnico - a estudar engenharia.
Agora com 19 anos, Sørensen esforça-se na sua investigação para criar motores de foguetão mais baratos. O seu projeto, intitulado "Desenvolvimento de pequenos sistemas de propulsão de foguetões arrefecidos regenerativamente", demonstrou como pequenos motores de foguetões podem ser arrefecidos utilizando um combustível que mistura etanol e óxido nitroso.
Sørensen disse não ter a certeza de qual será o seu caminho no futuro, mas manifestou interesse em prosseguir a sua investigação sobre foguetões.
"Gostaria de continuar a trabalhar neste projeto", afirmou. "E gostaria de fazer algo que fosse importante para o mundo".
Elizabeth, a canadiana vencedora do prémio máximo, há muito que tem uma paixão pela investigação sobre o cancro.
Desde a infância que se envolveu em campanhas de angariação de fundos para uma associação canadiana de luta contra o cancro e ficou intrigada com a razão pela qual tantos donativos não tinham resultado em nenhuma cura. Agora com 17 anos e a frequentar o ensino secundário, Elizabeth Chen procura uma terapia que evite os efeitos secundários, muitas vezes consideráveis, dos tratamentos convencionais.
O seu projeto incide sobre uma nova forma de imunoterapia baseada em "células CAR-T", que são geneticamente alteradas para poderem combater o cancro de forma mais eficaz.
"Quero muito ir já para a universidade e depois, quero envolver-me na investigação sobre o cancro que é o que me interessa mesmo", disse esta jovem natural de Edmonton.
Os três vencedores portugueses - Inês Cerqueira, Afonso Nunes e Mário Onofre - afirmaram ter desenvolvido uma parceria tão forte como a sua seda de aranha e planeiam prosseguir a sua investigação enquanto estiverem na universidade, com a esperança de, um dia, realizarem estudos clínicos.
Denominado "SPIDER-BACH2", o seu projeto reflete a consciência de que a osteoporose se tornará um desafio crescente para a saúde em todo o mundo agora que as pessoas vivem mais tempo. O seu objetivo é a produção in vitro de células de construção óssea conhecidas como osteoblastos.
"O futuro é brilhante para nós", afirmou Afonso Nunes.
Este artigo foi originalmente publicado na Horizon, a Revista de Investigação e Inovação da UE.