Operária de Guimarães que ganha o salário mínimo condenada a pagar 60 euros mensais a filha de 21 anos.
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Uma mãe de Guimarães foi processada pela filha de 21 anos que saíra de casa aos 16 por não querer viver em pobreza. Foi morar com uma madrinha, que a ajuda financeiramente, e exigiu uma pensão de 200 euros à mãe, uma operária que ganha o ordenado mínimo. O Tribunal de Guimarães condenou a progenitora a pagar-lhe 90 euros mensais. A mãe recorreu e, em março, a Relação baixou o valor para 60 euros.
Em 2017, a jovem saiu de casa "queixando-se das condições de vida, da pobreza e de chegar a não haver dinheiro para comprar comida". Foi morar com a irmã, mas sentiu que era explorada como empregada doméstica e, após cinco meses, mudou-se para casa da madrinha, onde ainda reside. Também passou a receber diretamente a pensão do pai - falecido em 2015 -, de 232 euros, e foi para tribunal, exigindo à mãe 200 euros de alimentos, por continuar a estudar e não ter como subsistir.
Em tribunal ficou estabelecido que o relacionamento entre mãe e filha é "péssimo ou inexistente". Um dos dois filhos que ainda moram com a mãe confirmou que, durante dez ou 11 anos, o ambiente em casa era de miséria e que chegaram a ter de pedir dinheiro para comer. Agora que são três a trabalhar, todos com ordenado mínimo, a situação melhorou.
O Tribunal de Guimarães condenou a mãe a pagar 90 euros mensais à filha até ao fim do curso de técnica auxiliar médica ou até fazer 25 anos, desde que não reprove por culpa própria. A mãe recorreu para a Relação, alegando que a filha não a respeitava e apenas a via como "uma fonte de rendimento".
O recurso realça a contradição entre a saída de casa da filha porque existia miséria e fome e o facto de, um ano depois, ela exigir dinheiro à mãe. Comparando os rendimentos de ambas (a jovem não tem despesas de renda e familiares) e constatando a falta de respeito que mostrou, o defensor da progenitora conclui que não é razoável exigir-lhe a pensão.
A Relação admite que a jovem tem "rendimento mensal muito diminuto". Porém, não tem despesas obrigatórias e o seu rendimento é semelhante ao de muitos estudantes. Aliás, os juízes lembram que, quando recebeu uma bolsa de mérito escolar de 600 euros anuais, a jovem foi tirar a carta de condução, "opção inquestionavelmente legítima, mas não compaginável com um quadro de vincada necessidade financeira".
Já quanto à mãe, os juízes consideram que, ao contrário da filha, não tem casa nem alimentação gratuitas e uma intervenção cirúrgica ditou "um longo internamento de quatro meses". Assim, reduziram a pensão para 60 euros/mês.
RESPEITO
Grau de exigência em pobreza é diferente
A mãe alegou que a filha ofendeu a sua dignidade pessoal, a desrespeitou, o que anularia a obrigação de pagar alimentos. "Neste quadro de grande pobreza, espelhando o velho ditado de que "casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão", não se pode aferir do nível de respeitabilidade com o mesmo grau de exigência que teríamos de usar num meio de abundância", consideraram os juízes.
PORMENORES
Estudante
Com 21 anos, a jovem está matriculada no terceiro ano de um curso profissional de técnica auxiliar de saúde.
Poucas despesas
A jovem não paga renda nem passe de transportes e tem senhas de refeição na escola. Recebe 232 euros mensais e a madrinha ajuda-a com outras despesas.
Alimentos
A pensão de alimentos engobla tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário de uma pessoa.