Uma testemunha no julgamento em que o militante neonazi Mário Machado e outro arguido estão acusados de incitamento ao ódio e à violência por terem alegadamente apelado online à "prostituição forçada" de mulheres de partidos de Esquerda garantiu, esta terça-feira, que a ameaça gerou, à data, "pânico" entre as visadas.
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Em causa está uma troca de mensagens públicas no Twitter (atual X) entre Mário Machado, de 47 anos, e Ricardo Pais, de 43, a 17 de fevereiro de 2022, menos de um mês depois das eleições legislativas de 30 de janeiro do mesmo ano.
De acordo com a acusação do Ministério Público, o primeiro terá, em resposta a um terceiro utilizador da rede social alheio ao processo, defendido a "prostituição forçada de gajas do Bloco [de Esquerda]". O segundo terá então sugerido que se incluíssem as do Movimento Alternativa Socialista (MAS), do MRPP e do PS, tendo Mário Machado retorquido "de arrastão". Ricardo Pais terá acrescentado que a líder do MAS, Renata Cambra, teria "tratamento VIP" e que tal serviria para "motivar as tropas para a reconquista".
"Eu pessoalmente fiquei em pânico. Falámos, em conjunto com a Renata [Cambra] e outras camaradas, sobre o assunto, porque ficámos todas em pânico e queríamos saber como nos devíamos proteger", testemunhou esta terça-feira no julgamento, em Lisboa, Anabela Sobrinho, então militante do MAS. Na altura, salientou, recebeu igualmente mensagens de preocupação e de alerta de mulheres do Bloco de Esquerda.
"Nenhuma mulher devia sofrer este tipo de ameaça", acrescentou, salientando que o facto de Mário Machado ter condenações, já cumpridas, por crimes violentos contra homens a fez sentir que a violência contra mulheres seria "ainda pior". "A ideia de ser violada não é agradável", insistiu.
Arguidos em silêncio
O atual porta-voz do movimento de extrema-direita 1143 e Ricardo Pais começaram a ser julgados a 6 de fevereiro de 2024, tendo optado por se manter, até agora, em silêncio. No final da primeira sessão do julgamento, a sua defesa alegou que os arguidos não são os autores das publicações, apesar de, a 21 de fevereiro de 2022, Mário Machado ter reagido, num direito de resposta à revista Sábado, como sendo o autor dos tweets a si atribuídos.
Esta terça-feira, uma outra militante do MAS, Ângela Lima, confirmou que viu no Twitter - e não num print screen (fotografia do ecrã, mais facilmente falsificável) - a troca de mensagens. E garantiu que a conta atribuída a Mário Machado tinha o nome e a imagem deste.
O julgamento prossegue a 19 de março de 2024, com a inquirição enquanto testemunhas da diplomata de Ana Gomes, que esta terça-feira não pôde comparecer por se encontrar num julgamento no Porto, e da deputada Isabel Moreira, que aguarda que a Assembleia da República volte a reunir, no próximo dia 13 de março, para ter autorização para depor.
A sessão será, à partida, também destinada às alegações finais, o último ato antes de o Tribunal Local Criminal de Lisboa proferir a sentença, numa data a definir.
O crime de discriminação e incitamento ao ódio e à violência é punível com pena entre seis meses e cinco anos de prisão e, na acusação, o Ministério Público pediu que Mário Machado, há quase três décadas ligado a diversos movimentos de extrema-direita, incluindo neonazis, seja punido como reincidente.