O Tribunal Central de Instrução Criminal mandou, esta segunda-feira, para julgamento Rui Pinto por 242 crimes no caso dos e-mails do Benfica, menos 135 do que os 377 de que tinha sido acusado, em julho de 2023, pelo Ministério Público.
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Entre os crimes que caíram, 134, de violação de correspondência simples, foram "apagados" devido à amnistia aprovada por proposta do Governo a propósito da Jornada Mundial da Juventude, realizada, em agosto de 2023, em Lisboa.
Os atos sob suspeita foram praticados até janeiro de 2019, quando o mentor do Football Leaks ainda não cumprira 31 anos. Atualmente, tem 35.
O 135.º ilícito, de acesso ilegítimo, tinha sido, atendendo ao número de vítimas indicado na acusação, imputado em excesso pelo Ministério Público.
Rui Pinto será, assim e caso não exista qualquer alteração em sede de recurso, julgado por 201 crimes de acesso ilegítimo, 23 de violação de correspondência agravada, e 18 de dano informático. Esta é a segunda vez que o hacker autointitulado denunciante vai ser julgado, em Portugal, por atos praticados até 2019.
Em setembro de 2023, o mentor do Football Leaks foi punido com quatro de prisão, suspensos na sua execução, por ataques informáticos à Federação Portuguesa de Futebol, ao Sporting, à Procuradoria-Geral da República, à sociedade de advogados PLMJ e à Doyen Sports, e por ter tentado extorquir este último fundo de investimento.
Agora, está acusado por crimes informáticos contra outras 19 entidades, incluindo várias sociedades de advogados e clubes desportivos. Entre estes, está o Benfica, de cujo sistema informático Rui Pinto terá extraído e-mails que terá depois entregue ao diretor de comunicação do F. C. Porto, Francisco J. Marques. As mensagens acabaram por ser, em 2017, divulgadas por este último no Porto Canal.
Francisco J. Marques foi entretanto condenado, num outro processo alheio aos de Rui Pinto, a pena suspensa por estes atos. Em julgamento, o diretor portista sempre garantiu desconhecer a identidade de quem lhe remetera os e-mails em causa, exibidos parcialmente no Porto Canal.
MP já admitira menos crimes
A 2 de defevereiro de 2024, o Ministério Público já admitira, no debate instrutório do segundo processo contra Rui Pinto, que os 134 crimes de violação de correspondência poderiam cair devido à aministra aprovada a propósito da Jornada Mundial da Juventude.
A lei prevê que o regime excecional se aplique a ilícitos praticados até 19 de junho de 2023, por pessoas até aos 30 anos à data dos factos, e que sejam puníveis com até um ano de prisão ou até 120 dias de multa. No caso do de violação de correspondência simples, a pena máxima é de um ano de prisão, mas 240 dias de multa, o que levara a procuradora Vera Camacho a deixar "a tomada da posição" sobre a questão ao Tribunal Central de Instrução Criminal, em Lisboa.
Esta segunda-feira, a juíza Ana Margarida Correia decidiu que a amnista se aplica mesmo ao crime em causa, declarando "extinto, por efeitos de amnistia, o procedimento criminal" contra Rui Pinto por esses atos.
O entendimento - contestado pelo Benfica, assistente (ofendido) no processo - vai ao encontro do que já tinha tido, em setembro de 2023, o coletivo de juízes que condenarada o mentor do Football Leaks a pena suspensa. Na altura, o hacker autointitulado denunciado foi amnistiado de 79 ilícitos, absolvido de três e punido por nove. O caso está em recurso.
A defesa de Rui Pinto pretendia que o arguido fosse julgado por ainda menos crimes, mas todos os restantes argumentos jurídicos foram rejeitados, esta segunda-feira, pelo Tribunal Central de Instrução Criminal.
À saída, Luísa Teixeira da Mota reiterou a crítica ao Ministério Público por ter dividido em vários processos, incluindo um terceiro ainda sem acusação, os factos imputados ao mentor do Football Leaks, todos contemporâneos e com características similares.
"Do Ministério Público, a defesa do Rui Pinto sabe o que é que espera: uma estratégia, que nós entendemos ser perversa, de perseguição ao arguido nesta eternização de processos judiciais", lamentou, aos jornalistas, a advogada. O Ministério Público tem, em contrapartida, justificado a separação dos processos com o risco de prescrição de crimes.
Esta segunda-feira, a juíza Ana Margarida Correia considerou que os "direitos de defesa do arguido" se mostram "salvaguardados" e lembrou que "não compete ao juiz de instrução criminal sindicar a bondade" da estratégia decidida pelo Ministério Público.
Rui Pinto, que tem colaborado com as autoridades portuguesa e francesa e está em liberdade, inserido num programa de proteção de testemunhas, compareceu esta esta segunda-feira na sala de audiências, de máscara e sem passar pela porta principal do tribunal. Durante a leitura da decisão instrutória, não esboçou praticamente reação.
"Rui Pinto sabe que vai ter de lutar e continuar a lutar pelos seus direitos", frisou Luísa Teixeira da Mota.