Site reúne mais de dois mil imóveis em leilão na sequência de insolvências e outros processos nos tribunais.
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Se, como dita a sabedoria popular, a sorte de uns é o azar de outros, nada o demonstra tanto como a oportunidade de alguém poder comprar o que outros perderam por terem falhado um crédito, entrado em insolvência ou sido condenados por um tribunal a ficar sem determinados bens, incluindo imóveis mais ou menos valiosos.
Só ontem, havia 2193 edifícios e frações em alienação, nesse âmbito, na plataforma e-Leilões... incluindo o prédio que alberga, desde 1952, o externato "O Lar da Criança", onde o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, andou até aos 10 anos, em Lisboa.
Localizado na Lapa, uma das áreas nobres da capital, o imóvel avaliado em mais de 2,5 milhões de euros está em leilão desde 16 de setembro, tendo a oferta mais alta até ao momento rondado os 1,3 milhões de euros.
O montante basta para que o lance seja, atualmente, o mais elevado entre todos os edifícios à venda no site, mas não permite a aquisição do imóvel, que só poderá concretizar-se a partir dos 2 198 700 euros. O executado é um particular.
O leilão dura até ao próximo dia 2 de novembro e, mesmo que para já o negócio aparente não chegar a bom porto, parece, ainda assim, estar a correr melhor do que a alienação do Convento de Alpendurada, no Marco de Canaveses.
O espaço convertido em hotel e avaliado em 15 milhões de euros já tinha, há um ano, sido leiloado. O insucesso da venda ditou, porém, que este mês tenha sido lançado novo procedimento, na modalidade negociação particular, cujos termos são mais flexíveis.
Até ontem, não tinha ainda sido feita qualquer proposta. O prazo termina a 24 do próximo mês e a executada é uma sociedade com fins turísticos que não pagou um empréstimo.
espaços simbólicos
Entre a lista de bens atualmente em alienação, há ainda imóveis que, apesar de serem menos dispendiosos, marcam pontos pelo seu valor simbólico. Desde logo, o armazém industrial em Recardães (Águeda) da fábrica de bicicletas Órbita, declarada insolvente em 2020.
O processo corre no Tribunal do Comércio de Aveiro e o espaço está avaliado em quase um milhão de euros. Quem quiser ficar com o armazém, tem, além de bater a concorrência, de pagar no mínimo 848 400 euros.
O leilão acaba no próximo dia 15 de novembro e, até agora, o lance mais alto é pouco superior a 500 mil euros. Tal como qualquer bem comprado através do e-Leilões, quem ganhar a corrida fica obrigado adquirir o bem nas condições em que este se encontrar na altura.
Mais concorrida está a licitação pelo prédio, que, até há poucos dias, era a sede do Marítimo Lisboa Clube, tradicional organizador da Marcha da Bica. O espaço, em pleno centro histórico lisboeta, terá de ser transformado em habitação e o seu preço vai já em 121 948 euros, mais 43 mil euros do que o valor do imóvel. O leilão termina quarta-feira.
Já na terça-feira, chega ao fim a possibilidade de qualquer pessoa ficar com 44,99% do capital do icónico Hard Club, no Porto. O custo mínimo é de 33 668 euros, mas, até agora, não há qualquer interessado.
Além de imóveis e direitos, estão ainda em alienação no site veículos, máquinas, mobiliário e objetos diversos.
Outros exemplos
Ciclomotor de 1962 - Um processo de execução sobre um cidadão de Amarante deixou à disposição de quem estiver disposto a pagar 595 euros por um ciclomotor a gasolina, da marca Solex, datado de 1962. Para já, a proposta mais alta é de 550 euros.
Vinho do Porto - A falência de um produtor de vinho do Porto ditou a venda, em quatro lotes, de um total de 9785 litros daquela bebida. Por agora, ninguém se mostrou interessado. O vinho mais barato, com 30 anos, custa pelo menos 11 545,67 euros. O mais caro, com 70 anos, tem um preço mínimo de 169 681,16 euros.
Pianos e não só - Todos os instrumentos da Associação Académica de Música de Lagos, em processo de insolvência, estão a ser alienados no e-Leilões. Há, por diversos preços, pianos, contrabaixos, violoncelos, saxofones, flautas transversais e bongós, entre outros.
Livros infantis - Mais de 150 livros infantis editados pela Rodopio de Letras estão à venda em três lotes distintos, depois de a empresa ter sido executada. Os preços mínimos variam entre 125,46 e os 363,83 euros e, até agora, ninguém apresentou uma proposta. O cenário é idêntico no caso da Edi9 que está à beira, por um custo superior, de perder centenas de livros didáticos para crianças.
Marca de construtora - A queda da grande construtora Edifer deixou o uso da marca à mercê de quem pagar 6375 euros. Só que, mais de dois meses após a abertura do leilão, ainda ninguém licitou a compra da marca, registada em julho de 1984 e avaliada em 7500 euros.
Dezenas de vacas - A execução de uma empresa de pecuária em Angra do Heroísmo, Terceira (Açores), deixou 168 bovinos à espera de terem um novo dono. A licitação começou este mês e dura até janeiro, estando os animais avaliados em cerca de 80 mil euros. Já em Lagoa, na ilha de São Miguel, foram penhoradas três vacas a um particular.
Números
32896 leilões e 2744 negociações particulares finalizadas desde maio de 2016, mais do dobro das vendas concluídas com sucesso. No mesmo período, foram realizadas 866 893 licitações. Os imóveis são maioritariamente os bens mais procurados e mais rentáveis.
68977 bens vendidos através do e-Leilões, desde que esta foi criada, em maio de 2016, segundo dados disponibilizados na plataforma online. Só até ao final de 2020, foram, de acordo com o "Dinheiro Vivo", realizadas vendas superiores a dois mil milhões de euros.