Tribunal culpa concessionária pela entrada de animais na autoestrada, apesar de a vedação não ter sido violada.
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Uma automobilista matou três javalis quando, em 2017, conduzia na autoestrada do Grande Porto A42. E o seu carro ficou com danos cujo conserto ascendeu a 11.663 euros, a verba que a concessionária da autoestrada, Ascendi, foi condenada a restituir à seguradora, por decisão recente do Tribunal Central Administrativo do Norte (TCAN).
A 15 de março, pelas 23.50 horas, a mulher conduzia um Mercedes, a 200 metros do nó de Lousada. Ao sair de uma curva, foi surpreendida por uma "coisa preta", que mais tarde veio a saber serem três javalis. Embateu contra eles e matou-os, ficando com a frente do carro danificada. O veículo ficou imobilizado junto ao separador central, virado no sentido contrário ao que seguia. Já os animais seriam retirados no dia seguinte, com recurso a uma grua. Na ocasião, deslocou-se ao local a GNR, um funcionário da Ascendi e os bombeiros.
No processo, concluiu-se que, no dia do sinistro, o pessoal da Ascendi passou no local pelas 20.12 horas e não avistou javalis. No dia seguinte, a vedação foi verificada, num raio de 500 metros para cada lado, em ambos os sentidos, não sendo detetadas anomalias. Ficou ainda demonstrado que a vedação tem 1,60 metros de altura e arame farpado no topo. Só que os nós de entrada e saída da A42 não têm portagens físicas.
Sobre o dever de vigilância
Inconformada com a condenação em primeira instância, a Ascendi recorreu, alegando que o contrato de concessão só a obriga a efetuar passagens de vigilância, com intervalo máximo de quatro horas, entre as 7 e as 23 horas.
"A conclusão que se pode tirar do argumentário da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel é que, sem que se perceba porquê, a Ascendi foi condenada com base em duas ideias principais, ou seja, numa ideia de omnipresença/ubiquidade a que supostamente estaria "obrigada" e também numa lógica de responsabilidade objetiva que sobre si impenderia. No entanto, nenhuma dessas afirmações tem consagração legal", argumentou, contestando ainda "a circunstância de se persistir de forma completamente infundada na ideia legalmente insustentável de que teria de provar que não teve culpa".
O TCAN rejeitou a argumentação. "Só o "caso de força maior devidamente verificado" exonera a concessionária da sua obrigação de garantir a circulação nas autoestradas em segurança, pelo que, para afastar a presunção de culpa, terá de provar a ocorrência de um acontecimento concreto que integre o conceito de força maior, ou seja, de um "acontecimento imprevisto e irresistível"", defendeu.
O tribunal concluiu assim que, "não conseguindo [a Ascendi] demonstrar a forma como os ditos javalis entraram na autoestrada, por forma a imputar a sua proveniência a terceiros ou a caracterizá-lo como um eventual caso fortuito, não foi ilidida [contestada] a presunção de incumprimento que sobre si impendia relativamente ao dever de vigilância".