Relação do Porto diz que brinquedo oferece risco de estrangulamento, mas não responsabiliza a IKEA, por não ter identificado a manobra que originou morte de criança de Gaia com 11 anos.
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A morte de um menino de 11 anos, em março de 2015, num baloiço de pano, em Gaia, não vai dar lugar a qualquer indemnização. Para o Tribunal da Relação do Porto, não se provou qual a manobra que levou Mateus Vieira à asfixia, pelo que não se pode concluir que o baloiço era um produto inseguro ou defeituoso. Um dos três juízes que apreciaram o recurso votou vencido.
A 16 de setembro de 2014, duas semanas após os pais de Mateus terem comprado dois baloiços na loja IKEA em Matosinhos, esta retirou o artigo de circulação, por não cumprir "todos os critérios de qualidade". Em causa estava a fragilidade da fivela dos encaixes de suspensão. Num comunicado e nas redes sociais, a loja pediu a sua devolução para "evitar futuros incidentes".
Embora tenha registado a compra no cartão de fidelidade e de receber regularmente emails e SMS promocionais, a família de Mateus não foi contactada diretamente nem soube daquele aviso sobre o baloiço.
Encontrado pelo irmão
A morte de Mateus não foi provocada pelo defeito da fivela, que poderia causar quedas do baloiço, mas devido a asfixia mecânica por enforcamento. Na noite de 9 de março de 2015, o menino foi encontrado no quarto pelo irmão mais velho com o pano enrolado com uma ou duas voltas no pescoço e o braço esquerdo pendurado. Estava suspenso pelo pescoço, com os pés assentes no chão e os joelhos ligeiramente fletidos.
Os pais pediram uma indemnização de 246 mil euros à IKEA. Esta contestou alegando que era só distribuidora - e não produtora - do baloiço e que o direito indemnizatório prescrevera.
O Tribunal de Gaia deu por provado que seis de nove manobras testadas com o baloiço, se mal executadas, podiam causar fraturas ósseas, ou estrangulamento. Mas já "não se provou qualquer defeito no baloiço, nem, menos ainda, que este óbito tivesse resultado de qualquer imperfeição ou desconformidade".
Em recurso, os pais insistiram que o baloiço "não era seguro e, por isso, ocasionou a morte do seu filho". A IKEA voltou a refutar responsabilidades. Mas se o tribunal assim não entendesse, então a indemnização deveria ter um "montante nunca superior a 50 mil euros", pediu.
A Relação do Porto frisou que era essencial saber se o dano de morte fora causado por uma utilização normal ou previsível do baloiço. Em caso afirmativo, a IKEA deveria ter prevenido esse risco e, não o tendo feito, ser responsabilizada pela comercialização do produto. Mas, como não se identificou a manobra que levou à asfixia, não se pode concluir pela insegurança ou defeito do produto, concluiu o tribunal, em 17 de maio.
Juíza diz que brinquedo é "inseguro" à luz da lei
A decisão do Tribunal da Relação do Porto não foi unânime. A juíza desembargadora Anabela Miranda votou vencida, por entender que o baloiço é "inseguro" à luz da legislação portuguesa e comunitária. Um dos requisitos de segurança exigidos pela lei é o brinquedo não apresentar "qualquer risco de estrangulamento".
Neste caso concreto, tendo em conta o material leve e flexível e todas as manobras que permitia fazer, o baloiço não prevenia o risco específico de estrangulamento, como tal não era seguro. E, sendo considerado "inseguro" à luz da lei, já não é necessário saber qual a manobra em concreto que o menor realizou, pelo que deveria ser dado provimento ao recurso dos pais de Mateus, defendeu.
Brinquedo
Vendas suspensas
A IKEA retirou o baloiço das lojas a setembro de 2014. Após reforçar a fivela de retenção, voltou a ser vendido de abril de 2016 a agosto de 2018.
Só 36 devolvidos
Dos 539 baloiços que vieram para Portugal, incluindo vendidos e retidos nas lojas, só foram devolvidos 36. A nível mundial, a retoma dos 22 907 baloiços vendidos ficou-se pelos 10%.
De pernas para o ar
Uma das imagens de promoção do baloiço, "inspirado no circo", mostrava um menino em posição invertida, com os pés e mãos apoiados nas laterais do tecido. Recomendava-se a supervisão de adultos.