Ministério Público acusou dois arguidos após ter arquivado o caso. Exigida indemnização de 125 mil euros.
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Dois homens de 27 anos, um residente em Torre de Moncorvo e outro em Macedo de Cavaleiros, vão ser julgados no próximo dia 30 no Tribunal da Guarda, acusados de um crime de dano qualificado cada um. Decidiu o Ministério Público (MP) que, não havendo antecedentes criminais e estando os arguidos inseridos na sociedade, não devem ser punidos com pena superior a cinco anos de prisão, pelo que vão ser julgados em tribunal singular.
O caso chega a tribunal quase três anos e meio depois dos factos ocorridos no feriado de 25 de abril de 2017, na Ribeira de Piscos, onde se localiza um dos mais importantes núcleos de gravuras rupestres do vale do Côa, e onde os arguidos, usando uma pedra, fizeram um desenho de difícil remoção na rocha conhecida como "homem de piscos".
não aceita arquivamento
O julgamento foi agendado depois de ultrapassado um despacho de arquivamento a que o presidente da Fundação Côa Parque, Bruno Navarro, se opôs, por entender que "estava em causa um ato de vandalismo em património mundial classificado em 1998 pela UNESCO" e que " uma eventual condenação terá um efeito dissuasor sobre atos futuros".
Aliás, logo à data da descoberta do ato de vandalismo, a direção da Fundação expressou que tinha sido " um atentado inqualificável". Argumentos que levaram o MP a reabrir o processo e a deduzir acusação com base na ideia de que "a conduta dos arguidos, ao efetuarem os desenhos (...) provocou um prejuízo de valor incomensurável".
Arguidos deixaram pista
Relata a acusação que, no dia 25 de abril de 2017, um grupo de ciclistas amadores fez um passeio de BTT com início em Vila Nova de Foz-Côa e passagem no núcleo de arte rupestre da Ribeira de Piscos/Quinta dos Poios.
Foram aliás dois participantes do concelho, conhecedores da região, que levaram os arguidos e outros elementos ao local onde aqueles haveriam de fazer a inscrição que continha a representação de um homem pré-histórico, uma bicicleta e a palavra "Bik". Era suposto que o substantivo Bike (bicicleta em inglês), fosse escrito na íntegra, mas não chegou a ser completado devido à advertência de um dos participantes no passeio que também vai testemunhar no julgamento.
Contudo, o desenho acabou por ser uma pista decisiva para que a Polícia Judiciária da Guarda soubesse da realização do referido passeio e identificasse os autores do crime.
dinheiro para atenuar danos
Sendo o parque arqueológico do vale do Côa um monumento nacional e Património Imaterial da Humanidade, o Ministério Público subscreveu um pedido de indemnização de 125 mil euros por considerar que as incisões feitas pelos arguidos marcaram a rocha, já identificada, de forma "visível, permanente, grave e irreversível".
A maior fatia (123 mil euros) será usada para que uma equipa multidisciplinar faça uma intervenção na rocha vandalizada e minimize os danos provocados pelos arguidos.
Os restantes dois mil euros destinam-se a compensar a ausência de receitas, porque o núcleo vandalizado esteve encerrado ao público mais de um ano, entre o dia 27 de abril de 2017 e 1 de fevereiro de 2018.
PORMENORES
Dez testemunhas
O Ministério Público arrolou dez testemunhas, entre guias do parque arqueológico, participantes no passeio de BTT, bem como o atual e o anterior presidentes da Fundação Côa Parque.
História do Côa
Para efeitos do pedido de indemnização, o Tribunal da Guarda vai ouvir não só os conhecimentos de história do presidente da Fundação do Côa, mas também uma conservadora/restauradora da Direção-Geral do Património Cultural, sediada no Palácio da Ajuda, em Lisboa.
Património valioso
No troço final do rio Côa localizam-se mais de 80 sítios com arte rupestre e cerca de 1200 rochas gravadas, num território de 200 quilómetros quadrados que abrange os concelhos de Foz Côa, Figueira de Castelo Rodrigo, Pinhel e Meda, no distrito da Guarda.