Queixa de comprador culminou na apreensão de 35 pinturas abusivamente atribuídas ao artista moçambicano. Homem de 79 anos entre os três detidos.
Corpo do artigo
A Polícia Judiciária (PJ) apreendeu recentemente, em duas casas na região de Lisboa, 35 obras atribuídas falsamente ao artista plástico moçambicano Malangatana Ngweny, falecido em 2011 em Matosinhos. Três pessoas, incluindo um homem de 79 anos, foram detidas e posteriormente libertadas, mas sujeitas a apresentações periódicas às autoridades. A investigação vai prosseguir e poderá levar a mais detenções.
A denúncia partiu de um homem que, "três ou quatro anos" antes adquirira, em leilão, um quadro publicitado como sendo da autoria de Malangatana. Durante algum tempo, não desconfiou de nada. Até que começou a falar com amigos e conhecedores da obra do artista. Foi nessa altura que suspeitou de que tinha sido enganado. Decidiu, então, deslocar-se à PJ, onde apresentou queixa por burla.
A Judiciária entrou em campo. De acordo com Domingos Lucas, chefe da Brigada de Obras de Arte da PJ, o primeiro passo foi contactar a leiloeira, com presença online e física. Em seguida, os inspetores foram à residência do homem que entregara aquele e outros quadros para alienação.
Na habitação, conta ao JN Domingos Lucas, foram apreendidas "mais uma série de pinturas atribuídas a Malangatana". O suspeito alegou, na altura, que as tinha adquirido a outras duas pessoas. Foi na residência destas que a PJ encontrou os restantes quadros, do total de 35 apreendidos.
Os detidos, entretanto libertados pelo tribunal, são os proprietários de todas as obras falsas descobertas naquelas duas habitações. Trata-se de dois homens, de 79 e 43 anos, e de uma mulher, de 51. São todos portugueses e não estavam, até aqui, no radar das autoridades.
Mais quadros "perdidos"
Em comunicado, a PJ precisou ontem que o trio recorreria "de forma concertada", pelo menos desde 2016, a leiloeiras online para escoar pinturas falsas, "vendidas por preços elevados". Durante as buscas domiciliárias, foi ainda apreendido material de pintura, mas, ressalva Domingos Lucas, não há certeza de que os detidos sejam os falsificadores.
A investigação vai, por isso, continuar. Os inspetores pretendem, por um lado, perceber se há mais pessoas envolvidas no esquema e, por outro, retirar do mercado outras pinturas falsamente atribuídas a Malangatana e já anteriormente vendidas pelo grupo.
A quantidade anormal de quadros para negociação do artista moçambicano, a preços inferiores aos habituais, foi, de resto, um dos fatores que levaram o autor da denúncia inicial a suspeitar de que tinha sido enganado. Segundo o chefe da Brigada de Obras de Arte da PJ, uma pintura de Malangatana custa, "por norma", quatro mil euros. E o preço caiu, entretanto, para metade.
Domingos Lucas acredita, ainda assim, que o número de lesados pelo esquema será bastante restrito.
Perfil
Moçambicano deixou vasta obra artística
Nascido em 1936, em Moçambique, manteve a atividade artística ativa durante 50 anos e faleceu em 2011, no Hospital Pedro Hispano, em Matosinhos, Malangatana deixou uma vasta obra de pintura, cerâmica, tapeçaria, gravura e escultura. Foi "artista da paz" da UNESCO, galardoado nos Países Baixos com o prémio Príncipe Claus , pela "grande influência nas artes", e agraciado em Portugal com a medalha da Ordem do Infante D. Henrique.