Queixas de trabalhadores contratados para obra na Costa do Marfim. Ficaram doentes e sem comida nem dinheiro.
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Uma empresa de construção civil de Barcelos está a ser julgada no Tribunal de Braga por acusações de tráfico de pessoas, associação criminosa e furto. A queixa partiu de três antigos empregados, contratados para uma obra na Costa do Marfim. Dizem ter trabalhado sem receber a totalidade do salário, sem apoio médico e com comida insuficiente. Alguns dormiam num colchão, no chão.
A Cofrepower - Construção Civil, o proprietário, Paulo Fernandes, e mais quatro funcionários (incluindo um encarregado e um engenheiro) negam os crimes, atribuindo as dificuldades à realidade daquele país africano.
Em 2015, a sociedade contratou mais de 30 trabalhadores, dos quais 20 são testemunhas de acusação.
Ao JN, um dos queixosos, que solicitou anonimato, contou ter ficado com paludismo e que, a conselho de um médico africano, voltou sozinho para Portugal, apesar de muito debilitado. Esteve internado numa clínica local, tendo sido ele quem pagou as despesas. A viagem, com escala em Marrocos, durou 24 horas, período em que quase não comeu. "Vinha quase a morrer", disse.
No Aeroporto de Lisboa, ninguém da empresa estava à sua espera. Telefonou e ninguém respondeu. Sem dinheiro, muito fraco e desesperado, teve a sorte de encontrar uma pessoa que o levou a um autocarro e lhe emprestou 30 euros para poder comer. Foi internado no hospital.
Acrescentou que, na Costa do Marfim, a comida limitava-se a uma refeição por dia (o jantar) e que o almoço era meia baguete com uma fatia de fiambre e de queijo. O horário de trabalho começava pelas 7 horas e acabava às 17 horas. Teve de trabalhar, apesar de se afirmar doente, disse, acrescentando que lhe ficaram a dever dinheiro e nunca fizeram contas.
Outro trabalhador, testemunhou em tribunal ter ficado gravemente doente, com infeção num braço e em risco de amputação. Aconteceu-lhe o mesmo: foi para Lisboa, com o patrão e o encarregado a deixarem-no sozinho no aeroporto. Chegado ao Porto, foi internado no Hospital de Gaia. O cenário foi idêntico: pouca comida, habitação com fracas condições e falta de pagamentos.
O julgamento prossegue no Tribunal de Braga.
PORMENORES
Empresa nega
No inquérito e durante o julgamento, a construtora e os arguidos explicaram que, como é normal num país africano, há dificuldades de acesso a produtos e a cuidados médicos. Mas que ninguém doente ficou sem apoio.
Salários de 2 mil euros
A empresa garante que os funcionários recebiam o salário (em média, dois mil euros líquidos) e que os contratos duravam três meses, por limitações de vistos. E tinham garantida a viagem de regresso.