Intitulava-se diretora do Departamento de Psiquiatria do Hospital de Braga. PJ apanhou-a a atender três pacientes. Embolsou 44 mil euros só com um doente.
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Praticava psiquiatria sem ser médica, intitulando-se mesmo diretora do Departamento de Psiquiatria do Hospital de Braga. Ana Cristina Póvoa Pereira, 38 anos, com consultório na Rua Mário de Almeida, 62, em São Vicente, Braga, foi detida pela Polícia Judiciária. Interrogada na quinta-feira por um juiz, foi libertada mediante caução de 10 mil euros, obrigação de apresentações periódicas na PSP e proibição de se encontrar com os seus "doentes".
Quando a deteve, no "consultório" onde tem também a residência, a PJ deparou-se com três pessoas: uma em plena "consulta" e outras duas à espera, com consulta marcada. No gabinete, além de 3700 euros em dinheiro - que lhe foram apreendidos - tinha medicamentos para doenças do foro psiquiátrico e psicológico - incluindo produtos naturais de ervanárias -, uma estante recheada de livros e enciclopédias médicas e cartazes na parede, também do foro clínico.
Fonte judicial disse ao JN que a PJ de Braga decidiu detê-la fora do chamado "flagrante delito", na medida em que entendeu que a falsa atividade clínica põe em risco a saúde pública. "Imagine que é dada uma medicação errada a uma pessoa que padece de uma determinada doença e que, por isso, ela se torna agressiva. Isto é um risco social", explicou o mesmo interlocutor.
Falso internamento
A Polícia, em coordenação com o Ministério Público, tem já o depoimento de seis pessoas que frequentavam as consultas da falsa psiquiatra. Mas suspeita que haverá muitas mais, dado que praticava no "consultório" há vários anos, embora alegue que começou apenas em 2018.
A investigação começou no verão do ano passado, após queixa na PJ da mãe de um jovem que sofria de surtos psicóticos graves. A mulher, cujo filho estava a ser acompanhado em psiquiatria do Hospital de Braga, procurou a "especialista" e esta convenceu-a a deixar as consultas, passando ela a tratar o paciente. Em regra, dava idêntico conselho aos outros doentes que a buscavam: deixarem o hospital ou os médicos onde se tratavam...
A certa altura, aconselhou uma mãe a mandar, por seu intermédio, o filho para internamento numa clínica da Galiza, Espanha, ao que esta acedeu. A progenitora pagou, antecipadamente e por transferência bancária, várias quantias, totalizando 44 mil euros. Mas o internamento na clínica nunca se concretizou. Veio a constatar-se que a referida clínica nem sequer existe. A falsa psiquiatra embolsou o dinheiro todo.
PORMENORES
Sonho e "vocação"
A falsa médica não tem qualquer habilitação ou antecedente profissional na área da Medicina. Ao que o JN soube, terá confidenciado que "sempre sonhou ser psiquiatra e sempre teve vocação para médica". E que, como estava desempregada, "resolveu tentar".
Confessou ao juiz
Na PJ, a arguida não prestou declarações, mas ao juiz confessou os ilícitos. É suspeita dos crimes de burla qualificada e usurpação de funções.
OUTROS CASOS
Médico sem ambulância
Em fevereiro do ano passado, um homem chegou a um hotel do Porto fazendo-se passar por um "médico do INEM", a quem roubaram a ambulância que deveria transportar um "secretário de Estado" até Vila Real. Com esta mentira conseguiu que a gerente do hotel lhe "emprestasse" dinheiro e que um taxista lhe pagasse dois telemóveis.
Assistência a pilotos de carros
Um indivíduo que se fez passar por médico em corridas de automóveis, em 2009 e 2010, foi condenado a 10 meses de prisão, pena que o tribunal decidiu substituir por uma multa de 1500 euros. Chegou a ser o único médico em funções em provas realizadas em Murça.
Abusava de mulheres
O dono de uma loja de produtos naturais na Trofa fez-se passar por médico para abusar sexualmente de mulheres. Anunciava uma vaga para uma empregada de balcão, que também tinha de fazer massagens aos clientes e, sob pretexto de dar formação à nova funcionária, obrigava-a a despir-se e apalpava-lhe as partes íntimas.