Escutas ao motorista contradizem José Sócrates sobre jantar com Ricardo Salgado
Ex-primeiro-ministro negou ter jantado na mansão do antigo patrão do BES, mas interseções telefónicas a João Perna indicam o contrário.
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Desde o início do julgamento, José Sócrates tentou afastar a ideia, sustentada pelo Ministério Público (MP), de que era próximo de Ricardo Salgado, o ex-patrão do BES, acusado de o ter corrompido com 15 milhões de euros. Negou ter jantado na mansão do banqueiro, mas uma escuta ao seu motorista veio, ontem, contrariar o principal arguido da Operação Marquês.
O procurador, Rui Real, pediu à juíza que instasse Sócrates a esclarecer o conteúdo de uma escuta, reproduzida na véspera, em que se ouvia este e Ricardo Salgado a combinar um jantar, em abril de 2013. “Mas nunca fui jantar a casa de Ricardo Salgado”, afirmou o ex-primeiro-ministro.
O procurador pediu ao tribunal para confrontar Sócrates com uma SMS enviada pela então secretária do antigo governante. Era uma espécie de lembrete com morada e hora do jantar em casa de Salgado, com a menção de que iria estar Henrique Granadeiro. “Pedi à minha secretária a direção da casa. Mas não houve jantar. Fui lá apenas para entregar um livro”, insistiu.
“Mesmo à magnata”
Rui Real pediu a audição de uma escuta visando o motorista de Sócrates, João Perna, e um terceiro. “Acabei de chegar aqui à Boca do Inferno [Cascais], aquele gajo [Sócrates] é mesmo à magnata. Sabes quem é o Ricardo Salgado? Foi ali comer. Vou servir de vela até à meia-noite”, queixava-se. Numa outra escuta, João Perna diz a outra interlocutora ter trabalhado 17 horas e meia na véspera (dia do alegado jantar). “Ontem, foi das 8 até as duas e tal da manhã. Ainda fui levá-lo [Sócrates] a jantar a casa do Ricardo Salgado. Chegar a casa e não sei quê... já eram duas da manhã”. Rui Real quis então saber como Sócrates pôde garantir nunca ter jantado em casa de Salgado.
“Entrei em casa de Ricardo Salgado às 21 horas e saí de lá meia hora depois. Fui a uma outra casa, lá perto, e, desculpe, mas não quero dizer qual casa. Foi também no Estoril, onde o pobre do João Perna teve de esperar. Não vou dizer em que casa fui. É vida privada”, retorquiu Sócrates.
Este também foi confrontado com outra alegada contradição do seu depoimento da véspera, em que garantira ter uma grande estima por Henrique Granadeiro, ex-chairman da PT e coarguido, mas não uma real amizade. Para o efeito, foi ouvida uma escuta entre ele e Granadeiro em que era patente essa amizade. “Eu nunca disse que não era amigo do doutor Henrique Granadeiro. Sou amigo dele. O que referi é que nunca tive nenhum almoço na altura das disputas [OPA da PT e venda da Vivo, OI]", afirmou.