Pedro Arroja denunciou promiscuidade entre política e negócios, dando como exemplo o europedutado Paulo Rangel, e foi condenado por difamação. Tribunal Europeu Dos Direitos Humanos entendeu, nesta terça-feira, que essa pena violou o direito à liberdade de expressão do então presidente da Associação Joãozinho.
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O Estado português vai ter de indemnizar o economista Pedro Arroja em 15 mil euros, montante próximo da quantia a que o ex-presidente da Associação Joãozinho tinha sido condenado, em 2018, a pagar ao deputado europeu Paulo Rangel e ao escritório de advogados para o qual trabalhava, o Quatrecasas.
Arroja havia sido considerado culpado dos crimes de difamação e de ofensa a pessoa coletiva, por ter afirmado que havia promiscuidade entre a política e os negócios e que Paulo Rangel era “um exemplo acabado” disso, mas o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos veio agora dizer que essa condenação violou o direito à liberdade de expressão do economista.
Em maio de 2015, Pedro Arroja usou o seu espaço de comentário no Porto Canal para tecer duras críticas a Paulo Rangel. O então presidente da Associação Humanitária Um Lugar para o Joãozinho, entidade que estava a construir, através de mecenato, a ala pediátrica do Hospital São João, no Porto, referiu que "a política meteu-se no caminho” desta obra, “através de um escritório de advogados, dirigido por Paulo Rangel”, que tinha elaborado “um documento que levou o hospital a parar as obras”.
Disse também que as crianças doentes estavam “enfiadas numa barraca” e que Paulo Rangel queria “contribuir para que elas continuem enfiadas numa barraca, em vez de terem uma instalação adequada de cinco pisos” que “a comunidade portuguesa” estava a “oferecer ao hospital”. "Paulo Rangel é o exemplo perfeito [das ligações estreitas entre políticos e empresários]. Afinal, é um político e, ao mesmo tempo, está à frente de um grande escritório de advogados”, acrescentou Pedro Arroja. “Como político, [Paulo Rangel] está certamente a angariar clientes para o seu escritório de advogados, clientes sobretudo do sector público: Hospital de São João, câmaras municipais, ministérios disto e daquilo... é um documento político para recompensar a mão que o alimenta”, concluiu Pedro Arroja.
Tribunal da Relação agrava sentença
A reação não se fez esperar e quer o eurodeputado do PSD, quer o escritório de advogados para o qual trabalhava, o Quatrecasas, avançaram com queixas que levaram, em junho de 2018, o Tribunal de Matosinhos a condenar Pedro Arroja, por danos que afetaram o prestígio das partes envolvidas.
Na sequência de recursos, o Tribunal da Relação do Porto agravaria, em março de 2019, a pena aplicada ao economista. Além do crime de ofensa a pessoa coletiva, Arroja seria considerado culpado de difamação e obrigado a pagar mais de 20 mil euros entre indemnizações e multas.
O recurso para o Supremo Tribunal de Justiça não surtiu efeitos e só nesta terça-feira Pedro Arroja viu o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos dar-lhe razão. Para os juízes europeus, o debate em torno da construção do “Joãozinho” era de “interesse público” e as declarações de Arroja “constituíam juízos de valor quando analisadas no contexto global da crítica alargada às relações entre política e administração pública”.
Ou seja, a condenação do economista, assim como as indemnizações impostas, “foi manifestamente desproporcionada”. “Tais decisões judiciais são suscetíveis de ter um efeito inibidor sobre a
liberdade de expressão. De um modo geral, os tribunais portugueses não efetuaram uma ponderação dos direitos em jogo, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça Europeu.
A ingerência nos direitos de Pedro Arroja não foi apoiada por razões pertinentes e suficientes e foi dada uma importância desproporcionada à reputação de Paulo Rangel e do escritório de advogados Quatrecasas”, lê-se na sentença que condena Portugal a pagar 15 mil euros ao antigo presidente da Associação Joãozinho.