A Provedora de Justiça lembra que fez vários avisos sobre a situação nos Centros de Instalação Temporários (CIT) e espaços equiparados mas que nada foi feito. Porém, após a morte de um cidadão ucraniano no Aeroporto de Lisboa, as regras mudaram e, afinal, aquilo "que era impossível, já é possível".
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"Escrever textos legais é fácil, difícil é garantir a sua boa execução e foi isso que falhou", apontou, esta terça-feira, Maria Lúcia Amaral na Comissão Constitucional de Direitos, Liberdade e Garantias da Assembleia da República. Para a Provedora da Justiça, mais do que o quadro legal no acolhimento de cidadãos estrangeiros, o problema está na sua aplicação.
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Vários alertas para más condições
A Provedora recordou que por várias vezes alertou para as más condições destes espaços que punham em risco não só os estrangeiros detidos como também as autoridades policiais. "Não há polícia nenhuma que esteja preservada dos piores horrores, mas há circunstâncias que são propícias a que eles aconteçam", apontou."A grande falha e frustração do Estado é não ter tido a sensibilidade e disponibilidade para interiorizar a ideia de que a sobrelotação dos espaços não podia continuar", reiterou.
Atualmente existe apenas um CIT habitacional, no Porto, e três espaços equiparados nos aeroportos de Lisboa, Porto e Faro. O que é manifestamente insuficiente para as necessidades. "As pessoas ficam em espaços absolutamente exíguos nas zonas internacionais do aeroporto", denunciou a Provedora que detém a responsabilidade do mecanismo de prevenção da tortura que passa por fazer visitas periódicas a pessoas detidas ou privadas de liberdade.
Surto de varicela no CIT de Lisboa afetou mais de 100 pessoas
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Numa das suas visitas ao CIT de Lisboa, em 2017, Maria Lúcia Amaral deparou-se com um surto de varicela que afetava mais de 100 pessoas ali detidas. Vinte estavam de quarentena numa zona e as restantes 80 estavam acantonadas noutra área exígua.
Para a Provedora o prazo máximo de detenção de 60 dias não é o problema. O problema é o modo e as circunstâncias em que eles são cumpridos. A lei determina que, durante a permanência na zona internacional do aeroporto ou no CIT., o cidadão estrangeiro a quem tinha sido recusada a entrada pode contactar com representação diplomática, consular ou pessoas da sua escolha e beneficiar de apoio de intérprete ou cuidados de saúde e de todo o material necessário à satisfação das suas necessidades básicas.
Porém, nas várias visitas que efetuou aos locais, a Provedora verificou que nada disto era garantido. "O quadro legal precisa de condições razoáveis e materiais para a sua aplicação concreta e isso nunca existiu. Foi aí que falhámos", criticou.
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Morte ditou alterações
Após a morte de um cidadão ucraniano sob a guarda do SEF, as coisas alteraram-se, sinalizou a Provedora. Se antes, ela própria tinha de esperar 20 minutos para ser acreditada junto da ANA porque "não havia alternativa" a atravessar a zona internacional, agora já foi criada uma passagem direta até à zona de detenção.
Outras coisas que antes não eram possíveis, agora já o são; "aspetos que sempre disseram que não podiam alterar, agora alteraram", como os detidos poderem ter acesso aos seus bens pessoais e aos telemóveis. "Podia ter sido assegurado antes", criticou.