Construtores escolhidos pela Câmara de Oliveira de Frades subcontratavam empresa do presidente da Autarquia com a conivência de vereador.
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Luís Vasconcelos, ex-autarca de Oliveira de Frades que enfrenta um julgamento por participação económica em negócio, prevaricação e falsificação de documentos, foi acusado pelo Ministério Público (MP) de Coimbra de ter exigido a projetistas, escolhidos pelo líder da Autarquia, o empolamento dos custos de empreitadas municipais para que os concursos públicos fossem ganhos por empresários amigos. Estes empreiteiros compravam depois bens e serviços a uma firma detida a 50% pelo próprio Vasconcelos. O MP reclama uma perda de vantagem de meio milhão de euros aos arguidos.
De acordo com a acusação, os crimes terão sido cometidos com a cumplicidade do então vereador Paulo Arede Antunes, atualmente a exercer as funções de chefe de gabinete do presidente da Câmara de Viseu. Entre 2013 e 2017, cinco empresários, dois técnicos e quatro empresas, todos arguidos, terão beneficiado das adjudicações dos dois autarcas.
Em simultâneo com a função de presidente da Câmara, Luís Vasconcelos era, de facto, gerente da empresa Madeiras AV. Segundo o Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) Regional de Coimbra, queria beneficiar a sua empresa e procurou adjudicar as obras camarárias a empreiteiros que eram clientes da Madeiras AV. Para isso, escolhia pessoalmente os arquitetos que iam desenhar os projetos, mandava empolar os preços em cerca de 20% e procedia ao lançamento do concurso público numa plataforma do Estado. Os empreiteiros amigos, que teriam conhecimento antecipado de todos os aspetos técnicos dos projetos, conseguiam assim submeter propostas antes da concorrência e com preços baixos. Ganhando a obra, subcontratavam a empresa gerida de facto pelo autarca, que, entre 2013 e 2016, realizou entre 68% e 91% do total da sua faturação com os fornecedores da Autarquia.
Começou na Biblioteca
Segundo o DIAP, a obra de reabilitação da biblioteca municipal, em 2014, foi a primeira adjudicação suspeita. Um arquiteto, escolhido pelo presidente, realizou o projeto com um "preço seco" (estimativa inicial) de 635 mil euros, mas também com o mesmo preço acrescido de 20%, denominado "preço de empreiteiro", de 762 mil euros. Garante a acusação que Vasconcelos já tinha escolhido o vencedor do concurso, a Construções Laurindo de Almeida (CLA), que era cliente da Madeiras AV. O concurso foi lançado por um preço ainda mais empolado, de 1,067 milhões de euros. A CLA ganhou a obra por 692 mil euros, pouco mais de que o "preço seco" indicado pelo arquiteto. A Madeiras AV terá faturado 178 mil euros nesta obra.
A construção do Parque Urbano, com um preço projetado de 1,066 milhão, que foi empolado para 1,4 milhões, acabou por ser adjudicado por 1,138 milhão à Irmãos Almeida Cabral (IAC), que também era cliente da firma do presidente da Câmara. A requalificação do Posto da GNR e um sistema de abastecimento de água também terão sido adjudicados com o mesmo esquema, que tentaram aplicar ainda à construção de um edifício de 2,1 milhões no parque urbano e à requalificação do edifício da Câmara. Nestes casos, os projetos foram impugnados e travados.
Funcionária da Câmara faz depósitos em numerário
Luís Vasconcelos é acusado de ter, entre 2013 e 2017, obrigado uma funcionária da Câmara Municipal de Oliveira de Frades a deslocar-se ao banco, durante o horário de trabalho, para fazer depósitos em numerário em contas pessoais do autarca e também de duas das suas filhas. O Ministério Público garante que foram efetuados 38 depósitos, totalizando 133 mil euros, com proveniência não declarada. A investigação suspeitou que esse dinheiro fosse proveniente de atos de corrupção envolvendo as empreitadas públicas do concelho, mas não conseguiu obter elementos de prova que sustentassem a suspeita. O Ministério Público de Coimbra mandou arquivar esta parte.