
Maria das Mercês Borges, ex-deputada do PSD, começou a ser julgada, em Lisboa
Reinaldo Rodrigues / Global Imagens
Maria das Mercês Borges, do PSD, terá, segundo o Ministério Público, registado a presença de Barreiras Duarte, então ausente, no debate do Orçamento do Estado para 2019
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A ex-deputada social-democrata Maria das Mercês Borges, acusada de falsidade informática agravada e abuso de poderes por ter, alegadamente, votado a proposta do Orçamento do Estado para 2019 por si e por outro parlamentar do PSD, Feliciano Barreiras Duarte, negou esta segunda-feira, na primeira sessão do julgamento, ter registado a presença do colega no plenário para esconder a ausência deste.
"Nunca partilhei a minha password com ninguém, nem nunca ninguém me deu a sua, porque eu sou à moda antiga: trabalho com papéis", afirmou, no Tribunal Local Criminal de Lisboa, a arguida, de 64 anos. O registo de presença é feito informaticamente, usando credenciais consideradas pessoais e intransmissíveis.
O caso remonta a 30 de outubro de 2018, dia em que a Assembleia da República discutiu e votou na generalidade a proposta do Orçamento do Estado para o ano seguinte. Feliciano Barreiras Duarte, que meses antes deixara de ser secretário-geral do PSD, esteve presente no debate durante a manhã, mas, devido a problemas pessoais, abandonou, à hora do almoço, o hemiciclo e já não voltou. Apesar disso, a presença do, à data, deputado foi, à tarde, registada por duas vezes, o que, dada a sua ausência do plenário, só pode ter sido feito por outra pessoa.
O primeiro acesso ao computador ocorreu às 16.22 horas no mesmo lugar onde Feliciano Barreiras Duarte se sentara durante a manhã; o segundo, às 16.50 horas, no posto ao lado do de Maria das Mercês Borges.
Acabou por ter falta
"Alguém o fez, eu não fui. Não sei quem foi, não vi, comigo na sala não foi", assegurou, esta segunda-feira, a ex-parlamentar, sem conseguir explicar por que a quereriam incriminar.
"Se soubesse, não estaria aqui, de certeza absoluta", frisou a antiga deputada, acrescentando que, na altura, pensou que o caso - divulgado pelo site noticioso "Sapo 24" e posteriormente objeto de queixa-crime da Iniciativa Liberal, então fora do Parlamento - "não passasse de mais uma das guerras intestinais" do PSD.
O Ministério Público (MP) acredita que, ao mascarar a ausência do colega, Maria das Mercês Borges quereria "preservar a imagem" do partido e "reforçar a expressão da votação" contra a proposta do Governo, já à data liderado por António Costa (PS). Mas, ontem, a então chefe de divisão de apoio ao plenário, Ana Paula Bernardo, esclareceu que os registos de presença e de votação são distintos. E precisou, ao analisar documentação que consta do processo, que, embora Feliciano Barreiras Duarte tenha estado presente no debate, teve falta na votação.
O julgamento continua na próxima segunda-feira, 21 de março de 2022. O MP não descobriu, na investigação, indícios de que Feliciano Barreiras Duarte tenha pedido para marcarem a sua presença e, por isso, não o acusou de qualquer crime.
CRIMES
Falsidade informática
O crime de falsidade informática, na sua forma agravada, é punido com até cinco anos de prisão.
Abuso de poderes
O crime de abuso de poderes, aplicável a titulares de cargos políticos, é punido com multa ou até três anos de cadeia.
Suspensão possível
A moldura penal dos crimes em causa abre porta a que, em caso de condenação a prisão, a pena da ex-deputada possa ser suspensa.
PSD
Caso não foi único e um já acabou em absolvição
O alegado "voto-fantasma" de Barreiras Duarte ocorreu no mesmo mês em que a presença em dois plenários do seu sucessor no cargo de secretário-geral do PSD, José Silvano, foi marcada por uma outra deputada social-democrata, Emília Cerqueira. Foram ambos julgados por falsidade informática, mas, a 7 de fevereiro de 2022, acabaram absolvidos. O Tribunal Local Criminal de Lisboa considerou "inteiramente plausível" a explicação dos parlamentares de que Cerqueira acedeu à área de trabalho de Silvano, registando automaticamente a presença deste, para consultar documentos. A decisão ainda não é definitiva.
