O ex-diretor de Fronteiras em Lisboa António Sérgio Henriques refutou, esta terça-feira, a acusação segundo a qual protegeu os inspetores do SEF que mataram o ucraniano Ihor Homeniuk a 12 de março de 2020. No primeiro processo deste caso, já foram condenados três inspetores do SEF.
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António Sérgio Henriques é arguido no segundo processo-crime sobre a morte do imigrante de 40 anos e depôs na fase de instrução do processo, com o objetivo de evitar o seu julgamento por crimes de denegação de justiça e de prevaricação.
O ex-dirigente afirmou, no Juízo de Instrução de Lisboa, que não sabia do estado de saúde de Ihor Homeniuk no dia em que este morreu. Nesse dia, argumentou, estava preocupado com a preparação de um plano de contingência de combate ao covid-19. A pandemia estava a dar os primeiros sinais em Portugal e havia já um caso suspeito no aeroporto.
António Sérgio Henriques - que seria afastado do cargo pelo Ministério da Administração Interna em março de 2020 - também foi acusado pelo Ministério Público de ter omitido à então diretora do SEF, Cristina Gatões, que Ihor Homeniuk "fora algemado com as mãos atrás das costas e mantido deitado num colchão, em posição de decúbito lateral, por um período de oito horas e sem vigilância".
No mesmo processo também foram acusados os inspetores João Agostinho e Maria Cecília Vieira, por crimes de homicídio negligente por omissão, e os vigilantes Manuel Correia e Paulo Marcelo, por os crimes de sequestro e exercício ilícito de atividade de segurança privada.
O vigilante Manuel Correia negou que tivesse contribuído para a morte de Ihor. "Houve uma altura em que os inspetores o prenderam com lençóis ao colchão e eu fiquei bastante assustado quando o vi aflito e a ficar vermelho. Decidi então tirar os lençóis, libertando-o. Ele depois tirou as fitas adesivas que tinha nas pernas e que foram os enfermeiros da Cruz Vermelha a colocar”, disse à juíza de instrução.
O debate instrutório vai ser realizado na próxima sexta feira. O tribunal anunciou o impedimento da participação no debate instrutório da procuradora do Ministério Público (MP) Alexandra Catatau, por ter sido testemunha no primeiro processo sobre a morte de Ihor Homeniuk, enquanto procuradora de turno no dia da morte de Ihor.
Para o seu lugar foi designado como substituto o procurador Óscar Ferreira, que participou já na inquirição dos dois arguidos que pediram a abertura de instrução.
Três inspestores já presos
O primeiro processo sobre a morte de Ihor Homeniuk levou à condenação a nove anos de prisão dos inspetores do SEF Duarte Laja, Luís Silva e Bruno Sousa por ofensa à integridade física grave qualificada, agravada por ter resultado na morte da vítima.
Os três inspetores apresentaram-se em agosto na prisão de Évora para cumprir os quase seis anos que lhes restam, após terem estado desde 2020 em prisão domiciliária.
Em tribunal, esta terça feira, o ex-dirigente esclareceu que nunca foi informado de quaisquer algemas nem do estado do ucraniano. "Só soube pela comunicação social que foi algemado, e o único relatório que existia antes da morte de Ihor dizia respeito à ida para o hospital por um suposto ataque epilético".
O seu papel, de acordo com o próprio à juíza, foi o de pedir "um relatório detalhado a todos os que estiveram com Ihor antes da sua morte e nesse nada constava sobre algemas".
Arrependido de não ter perguntado
À juíza, o arguido contou ainda que, no dia 12 de manhã, foi informado por vigilantes que tentavam contactar o SEF, porque "havia um cidadão alterado, que teria agredido um segurança, atirado um sofá a uma perna. Chamei através do Rádio Siresp a unidade de apoio que passou mensagem para enviar alguém e tomar as medidas necessárias, o que ocorreu. Não vi ninguém e à saída passou por mim o inspetor João Agostinho a dizer que a situação estava resolvida".
Hoje, o arguido considera que devia ter perguntado o que foi feito ao inspetor que passou por ele nessa manhã dizendo que estava tudo resolvido. "Mas não o fiz", lamentou António Sérgio Henriques.
O arguido explicou que, diariamente, ao longo dos anos, podem existir ocorrências entre as 50 pessoas que estão no Centro de Instalação Temporária do aeroporto de Lisboa (EECIT). "Pressupus que fossem utilizados meios legais e que a atuação do inspetor fosse dentro da lei. Nunca saí do meu gabinete, nunca me foi transmitida urgência para averiguar o que aconteceu", declarou.