Com o fim do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) instalou-se “um vazio” no que concerne à sinalização e prevenção de casos de tráfico de seres humanos. A garantia foi dada, hoje, por um antigo inspetor do organismo extinto em outubro do ano passado e confirmada, pelo JN, junto de várias fontes policiais.
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“Há um vazio, neste momento, ao nível da fiscalização dos cidadãos estrangeiros. E sem prevenção, os processos vão parar à Polícia Judiciária (PJ) quando já temos vítimas [de tráfico de seres humanos]”, lamentou Rui Zilhão, ex-inspetor-chefe do SEF, no seminário “Bastidores do Tráfico de Seres Humanos”, promovido pela Associação para o Planeamento da Família, na Maia.
O polícia, que transitou para a PJ na sequência da reforma implementada pelo anterior Governo, não se alongou em explicações, mas fontes contactadas pelo JN confirmam que não há ações preventivas de fiscalização ao crime de tráfico de seres humanos a decorrer.
Esclarecem as mesmas fontes que, no tempo do SEF, havia uma equipa a analisar a informação recolhida nas fronteiras e nos processos de legalização e as suas conclusões permitiam sinalizar riscos e avançar com ações preventivas, levadas a cabo pelos funcionários com funções policiais desta entidade. Em 2021, foram efetuadas mais de cinco mil deste tipo de fiscalizações, durante as quais foram identificados 44 mil estrangeiros, três mil dos quais em situação irregular. Em 2022, o número de ações preventivas chegou às seis mil, tendo-se sinalizado número semelhante de imigrantes ilegais.
Contudo, com o fim do SEF, a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) assumiu a responsabilidade administrativa, mas ficou sem elementos policiais para analisar as situações de risco e realizar as ações de fiscalização ao crime de tráfico de seres humanos. Já a PJ, que acolheu os inspetores do SEF, tem, sobretudo, uma função repressiva e normalmente atua após a denúncia de um crime. E GNR e PSP, agora responsáveis pelo controlo das fronteiras, não dispõem dos meios necessários para analisar a informação recolhida, identificar riscos e ir ao terreno confirmar as suspeitas.
Perante este “vazio”, as vítimas de tráfico de seres humanos, e as redes criminosas que as exploram, só são identificadas, na maioria das situações, se existir uma denúncia que dê início a uma investigação.
Reações tímidas
Presente no seminário “Bastidores do Tráfico de Seres Humanos”, a chefe do Observatório do Tráfico de Seres Humanos, Rita Penedo, evitou comentar as consequências da extinção do SEF. “Iremos fazer a monitorização e veremos se haverá alguma interferência. Mais do que isso não posso dizer”, respondeu quando confrontada a partir da plateia.
Também presente no evento organizado pela Associação para o Planeamento da Família, o diretor do Departamento de Procedimento Administrativo e de Qualidade da AIMA, Paulo Henriques, manteve-se em silêncio sobre esta matéria.